Filhos que são amigos, amigos que são filhos

Postado em 30 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 12 Comentários

Sempre soube de histórias de pessoas que acabam sendo "adotadas" pelos novos companheiros do pai ou da mãe. Na minha família mesmo conheço vários casos. Tios, tias, avós, que um belo dia conheceram alguém que trazia junto o famoso "pacotinho" e no final das contas abriam suas vidas para recebê-los.

Também lembro que achava isso lindo, uma espécie de altruísmo inatingível, algo digno de aplausos e considerações, afinal, nossa mente é e sempre será povoada por histórias de madrastas malvadas e padrastos bêbados que tratam a casa inteira pior do que Judas no Sábado de Aleluia.

Pra mim essas pessoas eram especiais.

Mas a verdade é que conhecer alguém que já tem filhos e receber esta pequena família como parte de um todo não é nada demais, é apenas o que qualquer pessoa normal faria.

Ainda que faltem momentos de intimidade - em tanta quantidade nos outros casais sem filhos - uma mulher que já é mãe nos mostra como valorizar os poucos momentos de intimidade possíveis.

Ela não deixa de ser mulher, de desejar coisas de mulher. Muitas vezes quer casar novamente, ser mãe novamente, só que - diferente daquelas que têm todo o tempo do mundo para a relação, mas pouco tempo restante para realizar estes sonhos de ser esposa e mãe - ela chega com calma e nos convida a construir algo que já tem fundações, alicerces e um projeto que precisa ser terminado.


Chega e nos convida a entrar numa família semi-pronta e terminá-la juntos. Sem pressa, sem angústias, com aquele passo seguro que só quem "já esteve lá" pode ter.

Ela não deixa de ser menina, não deixa de ter o seu "eu", mas como também traz junto de si um outro "euzinho" menor, frágil, dependente, ela geralmente foge com mais delicadeza do egoísmo daquelas que não precisam se preocupar com outro umbigo além do seu.

E como não amar este pequeno "eu" que se aproxima de nós e torna-se também nosso a cada dia? Como não segurar uma criança no colo, levá-la sobre nossos ombros, colocá-la para dormir, dar comida na boca, aturar malcriações, receber sorrisos, beijos e abraços e ainda assim não se apaixonar perdidamente?

Costumo dizer que no início nós buscamos gostar da criança porque ela é "filha da namorada", mas em pouco tempo - e ainda que não deixe de ser o "filho da namorada" ou a "filha do namorado", tanto faz - construímos uma relação nossa, independente da figura materna-paterna que nos apresentou àquele pequeno ser humano.

Nosso amor, nossa amizade, nosso carinho, nossas saudades, nossos segredos, passam a ser particulares e não tem mais nada a ver com o fato de sermos companheiros dos seus pais.

Finalmente, eles viram também nossos filhos. Sim, ainda que sem carga genética, são filhos por escolha, por convivência, são filhos por compartilharem sua infância conosco, seus sonhos.

São, sim, nossos amigos. E como alguém pode ser considerado especial só porque ama amigos que viram filhos, mas que não deixam de ser amigos?

Especiais são eles. Para nós.

Sabe o que é? É que eu estou com uns projetos...

Postado em 27 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 5 Comentários

Não existe algo como o "melhor emprego do mundo". Não é possível que um "emprego" tão bom a ponto de ser "melhor". Se é emprego, potencialmente é uma bosta.

A menos que seja o de fotógrafo da Playboy.
Empregos nada mais são do que você vendendo suas horas de vida, e mesmo não querendo soar tão dramático, afinal não é como vender um rim ou um dos pulmões, devo admitir que dependendo do trabalho que você exerça, será quase isso.

Bom mesmo é ser patrão e, melhor ainda, ser rico. Mas parece que as vagas para essas funções são um pouco mais concorridas do que as de vendedor de enciclopédia, operador de telemarketing e promotor da Herbalife.

Nunca vi emprego bom anunciado em jornal, você já viu algum? Aliás, até vi, mas geralmente tinha mais pré-requisitos do que os necessários para ser escolhido Papa.

Por isso mesmo um monte de gente fica à toa por aí, entregue ao passar dos dias, à contemplação e à Sessão da Tarde.  Não é por nada também que o sonho de muita gente é viver de renda ou, para aqueles mais desconectados da realidade, ganhar na Mega Sena (dizem que milionário da Mega Sena é o emprego com maior proporção candidato-vaga do mundo).

Mas a sociedade exige satisfações de quem não faz rigorosamente nada, afinal de contas, todo mundo raciocina da seguinte maneira: se eu acordo cedo, luto contra a soneca do despertador, pego engarrafamento, enrolo a manhã inteira, vou almoçar num restaurante a quilo, passo a tarde toda carregando 10 vezes o peso do meu corpo na forma de sono e preguiça, pego outro engarrafamento e já sei que no dia seguinte tudo vai começar de novo, preciso pelo menos fazer com que alguém que não passe por isso se sinta culpado.


E assim surgem as desculpas mais engraçadas do mundo, que as pessoas que não estão fazendo nada criam para se justificar perante à sociedade.

Primeiro tem o mais popular de todos atualmente, que é "estudar pra concurso".

- E aí? Quanto tempo, está trabalhando em que?

- Ah, tô parado, só estudando pra concurso...

Ele não menciona que passear com o cachorro, ler os jornais, assistir desenhos na TV, dar uma corridinha na praia de tarde e passar metade da aula do cursinho de "Direito Constitucional I" do lado de fora da sala dando em cima daquela loirinha de mini-saia não é bem "estudar pra concurso".

Existem outras desculpas interessantes, como "tô esperando saírem umas coisas aí", que soa como se algo importante estivesse para acontecer na vida da pessoa, mas que quer dizer somente que ela espera que na semana que vem aquelas 6 dezenas sejam sorteadas, senão vai ficar difícil até pagar os cinquentinha que pegou emprestado com o porteiro na semana passada.

Gosto também dos classicos-intelectuais, como "estou escrevendo um livro" e "vou fazer uma tese de mestrado".

- Pô, cara, legal, escrever um livro é meu sonho também, mas sobre o que será esse seu livro?

- Tipo, eu não comecei ainda, tenho umas idéias que preciso amadurecer primeiro. Estou em dúvida entre um romance sobre dois irmãos apaixonados pela mesma garota ou uma comédia sobre um cachorro falante.

Mas a melhor de todas é aquela que todo ex-BBB, sub-celebridade e ex-namorada de jogador de futebol fala quando perguntam o que andam fazendo da vida: ah, tô com uns projetos aí, sabe?

"Ter projetos" talvez seja o único que ganhe de "estudar pra concurso".

O que seriam estes projetos? Toda vez que vejo um ex-BBB dizendo isso me pergunto: será que um Shakespeare ou uma Fernanda Montenegro estava adormecida debaixo de toda aquela futilidade e silicone nos peitos?

O problema disso tudo é ninguém assumir que não faz nada e que adora não fazer nada, como se fosse um grande pecado não querer passar a vida trabalhando e só poder aproveitar um pouco de tempo livre quando todo esse tempo será gasto basicamente com visitas ao médico e banhos de sol.

Vivemos no tempo dos "workaholics" que nada mais são do que indivíduos que conseguem ser chatos 12, 14, 16 horas por dia, daí fica feio você dizer que prefere mesmo é ser aposentado.

E também tem aquele negócio de ficar meio chato pedir dinheiro emprestado pros amigos ou uma ajudinha dos pais quando o único esforço que você demonstra é o de caminhar lentamente até a praia, carregando aquela cadeira de montar e a última edição da Rolling Stone pra ler.

Pensando bem, taí uma coisa que só mesmo um prêmio da Mega Sena poderia resolver.

Eu rotulo, tu rotulas, ele é o burro

Postado em 25 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 2 Comentários

"Pô, cara, você está rotulando"

O rótulo é uma obsessão dos politicamente corretos e socialmente oprimidos, quase todo mundo tem pavor de ser definido simploriamente em uma única palavra, por conta de alguma característica física ou alguma merda que tenha feito uma vez na vida.

O tempo do colégio é a época apropriada para o surgimento de rótulos e famas que acompanharão o sujeito muitas vezes para sempre.

Experimente vomitar em sala de aula, dar um gritinho estridente no laboratório de biologia denunciando o seu medo irracional de pererecas, ou simplesmente pegar aquela gorda com cabelo no suvaco que todo mundo chama de Abominável Homem das Neves pra ver se você se livra disso um dia.

Tenho amigos que, se eu encontrar na rua hoje em dia, vamos lembrar de todo mundo do passado através dos micos que as pessoas pagavam, jamais dos nomes:

- E aí, quanto tempo, como você está?

- Beleza, quanto tempo mesmo, desde a festa na casa daquela menina, como se chamava mesmo?

- Qual?

- Aquela que foi pega no vestiário cheirando a calcinha da Alessandra.


- Ah! A Claudinha, pô, foda aquela festa, né? Acho que foi a última vez que a turma toda se reuniu, pelo menos antes do Paulão ir morar nos Estados Unidos.

- Paulão? Não tô lembrando desse.

- Irmão do Marcelo Merdinha.

- O que se cagou todo no recreio?

- Esse mesmo! O Cagão!

- Ele não casou?

- Casou sim, com a Marcinha Corrimento, lembra dela?

- Aquela da calça branca, claro.

Não tem jeito, amigo, ainda que você pense que não, alguém por aí só vai se lembrar de você através das cagadas que você aprontou. E não adianta reclamar, porque você com certeza faz igual.

Só mesmo "a gostosa", "o gênio","o herói","o bom de cama","a famosa" é que nunca se importam com rótulos, porque "o burro","o broxa","a gorda","o bêbado", "o fresco", esses sempre vão ligar.

Prazer, esse sou eu

Postado em 23 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 10 Comentários

Na internet a aparência vale mais do que em qualquer outro lugar.

Quem nunca perdeu um tempinho passeando por perfis do Facebook? Ali todo mundo é magnata, aventureiro, playboy internacional, piloto de avião, maratonista, mergulhador. Incrível como você só vê foto na Europa, no alto de montanhas, no fundo de um mar azul digno de Piratas do Caribe, dentro de carrões, taças de champanhe na mão, um verdadeiro tapete vermelho do Oscar.

Facebook não é rede social, é coluna social, é ostentação.

Mas fora dali o cuidado parece não ser o mesmo.

A mesma curiosidade que te leva a parar na estrada para olhar um cachorro atropelado, me faz passear por perfis do Orkut e outras redes sociais olhando as fotos que as pessoas escolhem para representá-las.

Sim, porque na internet você é aquela imagem mostrada num avatar. É uma redução de toda a sua história pessoal mas é assim que funciona.

E justamente por contarmos com tão pouco para nos definir, é que fico espantado com o pouco caso que alguns fazem de si mesmos. Imagine isso: você está andando calmamente numa calçada, um louco de óculos escuros e um celular na mão vira pra você e, num português cheio de sotaque, diz:

- Sou empresário da Angelina Jolie e ela quer jantar com um brasileiro hoje, para conhecer melhor os nativos, tome esse e-mail e envie uma foto sua que se ela gostar você será convidado.


Esqueça a impossibilidade disso acontecer realmente, concentre-se apenas na oportunidade fictícia que apresentei e me responda: você enviaria uma foto com um abadá de micareta, um copinho de cerveja em uma das mãos, o suvaco suado aparecendo, uma cara de babaca e a outra mão fazendo um "hang loose"?

Se você for mulher e a mesma situação acontecesse com o empresário do Brad Pitt, você tentaria colocar um chifre na Jolie enviando uma foto sua num rodízio de pizzas, fazendo um sorriso idiota, levantando o prato e apontando um dedo para uma fatia de pizza como quem diz "Olha! Uma calabresa!"?

Creio que não, afinal, você não é palerma, mas parece que tem gente que acha isso uma boa idéia para colocar num perfil do Orkut, do Twitter, do Blogger ou mesmo do papogostoso.net, que te garante arrumar um namorado em 5 dias mas provavelmente tem alguma cláusula se eximindo de responsabilidade sobre pessoas com fotos escrotas.

É um arsenal infindável de situações medonhas que, sabe-se lá porque, tem gente que acha super legal colocar na internet.

Tipo mãozinha no joelho e pose de dançarina de funk, um close do rosto com a boca semi-aberta em pose supostamente sexy e uma língua para fora, meio de lado, piscina da tia com água verde estilo enchente no Tietê, foto na frente daquele iate que você viu em Angra e que todo mundo sabe que não é seu, cangas de praia imitando véus árabes e a clássica: aquela com cabelo de chapinha estilo Glamour Photo Studio do dia em que você foi dama de honra da sua prima.

Homens não ficam atrás. Além do já mencionado "micareteiro bozo", tem aquelas poses fazendo muque de Popeye; mostrando latinhas de Red Bull ou fazendo pose de rapper americano.

Você pode estar se perguntando "mas o que ele tem a ver com isso?", bem, não tenho nada a ver com isso. Mas daqui eu também fico me perguntando: se uma única foto vai nos representar na internet e praticamente dizer algo como "prazer, esse sou eu", o que leva alguém a colocar ali uma imagem que inspire nos outros reações semelhantes àquele vídeo "Two Girls One Cup" ?

Porque produzir provas contra si mesmo e fazer os outros pensarem "nossa, mas que merda" ao ver uma foto nossa?

É um caso a se pensar...ou não.

Pô, Flavinha, me deixa ver seus peitos aí, na amizade

Postado em 20 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 4 Comentários

Dawson e Joey, Fox e Scully, Olivia Benson e Elliot Stabler. Sabe o que todos estes personagens tinham em comum com esses famosos que aparecem em pares na revista Caras? Todos são apenas "bons amigos".

O próprio desenrolar de alguns desses programas na TV provou a dificuldade disso, já que em dado momento algumas dessas amizades viraram pegações, namoros, relacionamentos, enfim, toda essa coisa bíblica entre homem e mulher.

Mas o fato é que a sociedade não aceita muito bem isso. A amizade entre homem e mulher é algo que vai de encontro a toda uma estrutura que nos leva sempre a desejar o sexo oposto na nossa cama, jamais numa mesa de bar falando sobre futebol.

Daí aquela reação da sua mãe quando você diz que uma garota é só sua amiga:

- Você e a Viviane, hein...

- Que isso, mãe, ela é minha amiga, é namorada do Edu!

- Sempre achei o Edu com jeitinho de corno mesmo...

- Que absurdo, ela é minha amiga.

- Tá bom...

E dá aquela piscadinha de olho. Quem nunca passou por algo assim? As pessoas duvidam tanto que chega um momento em que até você se pergunta "porra, será que eu tenho tesão nela e não sei?".


Cresci ouvindo que "amigo de mulher é cabeleireiro" e que a principal coisa que eu deveria evitar - mais do que doenças venéreas ou beber após dirigir -  seria virar amigo de uma garota.

- Se ela começar a te tratar como amigo, meu chapa, fudeu!

Por isso mesmo a pior coisa que alguma mulher poderia me dizer não era nada como "te acho mais nojento do que a barba do Marcelo Camelo" ou "meu ex-namorado tem 23cm de QI", mas "você acha que devo cortar meu cabelo?" ou então "acho que fulaninho está afim de mim".

Compartilhar dúvidas estéticas ou paixonites era mau sinal. A partir disso eu deveria optar por dois caminhos: me afastar e rever a estratégia para deixar claro que não queria amizade ou então entrar no curso de hairstylist do Senac.

Confesso que algo que coloca por terra o conceito de amizade desinteressada entre os sexos é que posso dividir estas minhas amizades em duas categorias: as que eu já fiquei e viraram amigas e as que eu não queria ficar nem amarrado.

Porque convenhamos, não existe amor fraternal possível quando algum dos dois quer levar o outro pra cama:

- Pô, Flavinha, deixa eu ver seus peitos aí, na boa, na amizade...

Talvez disso surja o ciúme que namorados tem das amizades um do outro. No fundo a gente sempre teme a possibilidade de toda aquela amizade terminar num quarto de motel, coroada com frases do tipo "sempre quis isso, sabia?".

Acho que a amizade entre homem e mulher só não é mais difícil de aceitar do que o "amigo gay", aquele que toda garota jura que poderia tirar até a roupa na frente dele e ainda assim nada aconteceria, mas que os namorados delas sempre acham que são disfarces para tardes de sexo quente envolvendo roupas de latex e transformistas indianos. Mas talvez esse tal gay fraternal exista mesmo.

E provavelmente seja essa a razão dos seus amigos da rua viverem dizendo que você está virando viado, só porque você anda pra cima e pra baixo com a Marcinha, aquela morena gostosa do seu curso de inglês, mas jura pra todo mundo que vocês são "apenas bons amigos".

Amigo não pede cinquentinha na night e nem o número do cartão na net

Postado em 18 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 7 Comentários

"Fulano é meu amigo"

Não faz muito tempo que uma frase dessas dizia um monte de coisas. Amigo, amigo mesmo, era aquele sujeito que não te abandonava na boate mesmo quando te via totalmente bêbado, caindo pelos cantos e aos beijos com uma sósia do famoso cão que chupa manga.

Além de não se importar com sua bebedeira, com a perspectiva de assistir você vomitando e chamando pela sua ex-namorada com voz de Forrest Gump, ele ainda teria orgulho de você mesmo com o seu pequeno deslize:

- É isso aí, ele é meu amigo sim! É pegador de mocréia mas é meu chapa!

Conforme vamos ficando mais velhos, o conceito de amizade vai mudando um pouco. Verdadeiras, só as amizades da infância, tão saudosas quanto as da adolescência.

Depois o que aparece são os amigos de copo, de bar, de trabalho, de putaria (não necessariamente nessa ordem). Esses você já sabe que não pode contar para muita coisa além de amassar uns limões para fazer caipirinha e sentar na praia, sob o sol, falando mal de todo mundo que não estiver presente.

Amigo então passa a ser não quem estende a mão para nos ajudar, mas sim aquele que não aparece para pedir cinquentinha numa noite de sábado. Trocamos a solidariedade e as juras de amizade eterna da imaturidade por um conceito que define como amigo aquele que enche menos o nosso saco e não nos dá prejuízo.

Não precisa mais bater no peito e dizer "esse barangueiro aqui é meu amigo!", basta que não tente comer a sua namorada (se ela for bonita) e divida a conta do boteco quando vocês saem para beber.

E a internet - sempre ela - acabou criando um tipo de amizade bem curioso, que é a tal amizade virtual.

As pessoas e os sentimentos são reais, mas o contato quase nunca é.


Sei de gente que tem amigos na Croácia, no Japão, na Austrália, sem nunca ter visto realmente a pessoa. Tudo bem que isso  já existia isso no tempo dos pen pals, que trocavam cartas ao redor do mundo, mas não era algo tão vivo quanto hoje.

Naquele tempo o amigo virtual era um envelope que chegava pelo correio com alguns garranchos e, muito raramente, uma foto. Hoje ele se manifesta em vozes, imagens, vídeos, milhares de fotos e conversas em tempo real.

O que gera outro fato curioso, que é uma intimidade total de não íntimos. Já percebi isso quando encontrei -  sem querer ou não - pessoas com quem conversava pela internet, seja por emails ou pelo messenger. Ali, no computador, falávamos de nossas famílias, desejos de consumo, chateações, bobagens sem sentido.

Mas pessoalmente percebíamos que não havia intimidade real nenhuma entre nós, e a conversa era totalmente estranha. No fundo, fora do computador, aquela amizade ainda precisava de tempo para se expandir.

Pode perceber como grupos de amigos que se conhecem pela internet se comportam quando se encontram pessoalmente. Durante 90% das conversas entre eles tratam de assuntos relacionados ao que fazem online, sobre pessoas com quem convivem online, isso quando não passam o tempo inteiro tirando fotos e postando para os que ficaram em casa, na internet, ou tuitando sobre o que acontece ali.

já notou que atualmente tem gente que você conversa horas pelo msn, mas se encontrar pessoalmente nao tem assunto? O que era pra ser uma via de comunicação acessória, virou principal.

Lembro quando usávamos o telefone para marcar encontros com os amigos. Hoje acho que não demora muito até encontrar algum conhecido na rua e usar este encontro para marcar uma conversa pela internet.

Por mim tudo bem, desde que ele não peça alguma foto da minha namorada sem roupa ou o número do meu cartão de crédito emprestado.

Eu te amo pelo que você odeia

Postado em 16 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 10 Comentários

Dizem que os opostos se atraem. Isso pode ser muito legal caso você seja mais feio que a fome e uma gostosa resolva te dar mole. Nesse caso, é uma maravilha que os opostos se atraiam.

Mas falando um pouco mais sério, não creio que isso funcione na prática. Eu, por exemplo, nunca iria namorar alguém que gostasse de micaretas ou todo domingo batesse ponto num baile funk "rebolando o popozão". Não tanto pelo popozão, mas mais pelo funk, que fique bem claro.

Coisas em comum, portanto, ajudam bastante num início de relacionamento. Curtir praia, viagem, cinema, gostar de churrasquinho de gato, de brincadeiras sexuais usando pasta de amendoim, de rituais envolvendo sacrifício de poodles. Tudo isso serve para unir casais, mas em minha modesta opinião, tem mais.

O amor é muito bonito mas ele precisa de uma certa direção. Você ama algo, alguém, alguma coisa. Não dá pra espalhar amor por aí como se fosse o fumacê do mata-mosquito. Nunca acreditei muito no sujeito que diz que "ama a humanidade". Pra mim quem diz isso não ama ninguém.

Porque pensemos: como amar a "humanidade"? Se por humanidade você quer dizer sua família, amigos, lugares queridos, beleza, mas a humanidade inteira? Todinha? Basta lembrar que aiatolás iranianos e pagodeiros fazem parte da humanidade que já me sinto impedido de amá-la.

Digamos que eu nutra alguma simpatia por ela, mas com ressalvas.


Por isso eu acredito que um fator importantíssimo e muitas vezes esquecido quando alguém resolve dizer o que une casais é a antipatia que eles têm em comum por uma variedade de coisas.

Afinidade também é isso: detestar coisas em comum.

É ser aquele casal que os amigos já sabem que nem precisam se preocupar em chamar para acampar, porque desde quando vocês se conheceram concordaram que dormir numa tenda e cagar no mato não era seu ideal de diversão.

É sorrir de maneira cúmplice quando vê algum outro casal imitando voz de criança e se chamando por apelidinhos escrotos como "tchuco", "leãozinho" ou "chimbinha", porque vocês nutrem ódio solidário por este tipo de comportamento idiotizante que muitos seres humanos adotam quando formam casais.

É não se preocupar se na sexta-feira você vai ter que inventar alguma desculpa para não sentar num botequim com a turma do trabalho dele, porque igual a você, seu namorado também abomina frequentar pés sujos fedegosos e ficar falando de futebol e novelas na TV (além de fofocas da firma) enquanto vendedores de amendoim circulam entre as mesas.

Casais assim sabem a hora exata de sair à francesa daquela festa na casa da prima, bem no momento em que todo mundo já está meio bêbado e resolve fazer uma famigerada rodinha de violão.

Não precisam esconder um do outro que acham "Eduardo e Mônica" e "Faroeste Caboclo" um porre e que pensam que alguém que decore essas letras quilométricas só pode querer mesmo é encher o saco dos outros.

Vão fugir juntos de lugares lotados, de ambientes barulhentos e, se por alguma força do bom convívio social, tiverem que ir em algum evento que ambos detestam (tipo pagodinho de fundo de quintal), vão se divertir num canto fazendo comentários ácidos sobre todos no local, enquanto sorriem em tal sintonia, que todo mundo vai achar que eles realmente se divertiram com a festa e não às custas de quem estava na festa.

Casais que odeiam unidos, permanecem unidos.

Pelo menos até que um resolva, por alguma razão, antipatizar do outro. Aí é hora de levar tudo o que não gostam para antipatizar em outro lugar.

Ser rico é uma coisa, vencer na vida é outra

Postado em 13 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 6 Comentários

Outro dia estava assistindo um programa de TV aberta (pode jogar os tomates) que mostrava uma dessas festas estilo "Programa do Amaury". Mais ou menos na terceira entrevista com algum ex-BBB ou ex-Fazenda falando sobre seus "projetos", resolvi mudar o canal para algo mais interessante, um leilão de bovinos no Canal Rural.

Mas a imagem daqueles animais - não falo dos do Canal Rural - me fez pensar como algumas vezes o dinheiro pode ser usado para comprar toda a falta de classe que um ser humano pode conseguir.

Não vou falar mal de dinheiro aqui, mesmo porque eu acho que ainda que ele não compre felicidade, ele compra quase todo o resto, até uma vaga para você estacionar sua Mercedes bem do lado dela.

Mas com a mesma facilidade que te deixa perto da felicidade, ele também te senta no colo do mau gosto.

Por isso, se você ficou surpreendentemente rico, provavelmente terá dinheiro para comprar qualquer automóvel e tuná-lo com "tudo que tem direito": luzes, piscina, lago com jacaré, rodas de magnésio, televisão de plasma, som stéreo estilo trio elétrico e claro, adesivo com os nomes dos filhos ou "eu amo minha esposa" no vidro de trás, não é?

Você vai poder andar por aí com um iPhone, um Blackberry e um Nextel, tirar todos da sua bolsa Luiz Vitão ao mesmo tempo e falar alto pra todo mundo em volta escutar, afinal, "você não deve nada a ninguém".

Também vai poder comprar muitas jóias, cordões, anéis, pulseiras, medalhas de ouro, brincões de diamante, relógios cravejados, virando uma espécie de Medalhão Persa ambulante, coisa de fazer inveja ao Ronaldinho Gaúcho ou o Zeca Pagodinho.


Pode também se permitir ter um cachorro que frequenta manicure, salão de beleza, massagista e que te acompanhará em todo lugar, com uma coleira bem vistosa ou então dentro de uma bolsinha de couro que custa o preço de um carro popular, afinal, você tem grana pra isso.

Você pode contratar um personal trainer que vai andar atrás de você na academia montando e desmontando seus pesos, te passando a garrafinha com energético e secando seu suor com uma toalhinha Tommy Hilfiger.

Se quiser, vai ter uma mansão com piscina em formato de cavaquinho com suas iniciais desenhadas no fundo, uma televisão de 900 polegadas, uma coleção de quadros do Romero Britto e edições de luxo (com fio de ouro e tudo) da obra completa do Paulo Coelho.

Todo mundo vai invejar aqueles armários cheios de CDs e DVDs de pagode, axé, funk e aquele poster autografado pelo Latino no seu studio de som.

Pra mostrar que é chique, você pode até se matricular num curso de vinhos - mandando a empregada assisitir no seu lugar e gravar tudo numa câmera - e andar por aí com uma maletinha de vinhos, fazendo todo mundo pensar que seu sobrenome é Concha y Toro.

Camarotes em micaretas e churrascadas com o Exaltasamba tocando no seu quintal podem se tornar coisa corriqueira, afinal, você pode, é ou não é?

E se alguém te chamar de brega, novo rico, emergente ou qualquer coisa do tipo, você ainda vai poder tirar um pacote de notas de 100 do bolso, abanar na cara da pessoa e dizer:

- Você tá é com inveja, ó, porque eu pago tudo à vista e em dinheiro!

Tudo isso você vai poder, se quiser, é claro.

Mas se você tem grana para tudo isso aí e ainda assim resolveu não fazer, parabéns, meu chapa, além de ficar rico você também venceu na vida.

Coé? Belezinha, bróder?

Postado em 11 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 7 Comentários

Lembro quando fiquei adolescente e comecei a sair - com o dinheiro dos meus pais, é claro - para comprar minhas roupas, como estranhava o comportamento dos vendedores das lojas que eu frequentava.

Naquele tempo, mais ou menos como funciona hoje com os smartfones, se você não tivesse pelo menos alguma peça de roupa da Redley, da Company ou da Cristal Graffiti, você não era ninguém.

E a moda faz a gente se sujeitar a coisas que depois vão depor contra nós mesmos no futuro, como usar pochetes, ombreiras e ter aturado vendedores de lojas "pra jovem". Sempre achei estranho o formato de certos programas de TV direcionados a este público, porque mesmo na época em que eu fazia parte dele, nunca vi nenhum amigo meu se comportando como os personagens e apresentadores daqueles programas.

Tudo muito frenético, alto, cheio de gírias forçadas e aquele ar de "coé, bróder" me deixavam meio nauseado. Assistia aquilo e pensava: "me dêem um tiro caso eu me comporte desse jeito sem notar".

Mas nada superava (e ainda supera) certas lojas de roupas e acessórios.

Não é porque entrou ali querendo comprar um tênis "da moda", que o vendedor precisa tratar o cliente como se ele fizesse parte desta tribo que não consegue pronunciar uma frase que não contenha "massa", "sacoé?", "véio", "doideira", "show de bola", "loucura", "neurótico" ou "bombando".

Não sei se isso consta em algum manual de instruções ou se eles encarnam um personagem quando estão ali, mas o fato é que, dependendo da loja, todos agem como um doidão de rave que acabou de ingerir 1kg de ecstasy.

Eu até acredito que seja só personagem mesmo, que eles saiam dali e desencarnem o Paulinho Cintura, e fico imaginando um cliente identificado com o "estilo" de venda ao encontrá-los na rua, numa situação normal:

- Coé, Riquinho, beleza, véio? Show te encontrar aqui, hein, mano? Vô lá na loja essa semana, valeu meu camaradinha?

- Tudo bem, cara? Sabe o que é? Eu saí lá da loja, meu nome é Ricardo e não Riquinho, isso era só um apelido escroto que me obrigavam a usar...

O resto desse diálogo você já pode imaginar.


Eu sei é que aquele tipo de tratamento "playsson" me incomodava bastante, primeiro porque eu achava exagerado e caricato, depois porque eu nunca tinha certeza se a pessoa estava fazendo aquilo pra me zuar ou não.

- Hahaha, viu que otário? Fiquei tratando ele que nem um apresentador da MTV e ele achou que estava abafando...

Já pensou se outros profissionais se comportassem assim?

O cirurgião:

- Beleza pura, Dona Odete? Tranquilex? Saca só, vou colocar uma ponte de safena neurótica na senhora, a senhora vai ficar show de bola, valew?

O diretor de criação:

- , Aninha, que isso, gata! Chapuletou nessa logomarca, hein? Mandou muito! Toca aqui...

O arquiteto:

- Tiagão, mano! Firmeza aí, jão? Seguinte, aquele projeto da obra da sua casa que você pediu já tá quase pronto, segura as pontas que você vai ver como tua cachanga vai ficar doideira total!

O garçon:

- Dois espaguetes com molho de camarão pro rango e pra beber? Aí, vou dar uma idéia pra vocês que são meus chegados curtirem total, serinho, o vinho francês que chegou tá muito show, vocês vão ficar fissurados...

Tenho certeza que essa combinação meio Sérgio Mallandro, meio Evandro Mesquita é meio over em cada das profissões acima, assim como também é em qualquer outra profissão, se pensarmos bem, até mesmo na de vendedor de "loja pra jovem".

Né não, bróder?

O ataque dos dobermans

Postado em 9 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 21 Comentários

Esse filme sobre cães assassinos assombrou minha infância. É meio chocante que passassem isso em qualquer horário na TV aberta, mas sabe como é, naquela época não tratavam crianças como se fossem de cristal. Só que o assunto aqui, embora ainda canino, é outro.

Certas coisas são inaceitáveis socialmente. Você não deve, por exemplo, sair por aí dizendo que acha a namorada do seu melhor amigo uma gostosa e que vai dar em cima dela na primeira oportunidade em que ela te der mole.

Não é de bom tom também negar o holocausto, dizer que não gosta de pizza e nem pega muito bem se declarar fã do Ronnie Von, mas nada, nada supera a comoção e o estado de pavor que você cria ao dizer que não gosta de cachorros.

Sério. Experimente testar numa conversa qualquer.

- Cara, posso te confessar uma coisa?

- O que?

- Eu ainda acredito no Papai Noel.

- Ah, tranquilo, é algo lúdico, da sua infância e tal...

- Eu também acho que o Sarney foi o melhor presidente do Brasil.

- Pô, mano, eu discordo totalmente, mas vivemos numa democracia, nada a ver te julgar.

- Mas tem outra: eu não gosto de cachorros.

- O que? Tomara que você e toda a sua família sejam devorados por dobermans!

Não tem jeito, se você não gosta de cachorros sofrerá uma repressão comparável a que sofre um sujeito que não goste de usar barba na Arábia Saudita, ou um jovem casal de namorados na Arábia Saudita, ou um Testemunha de Jeová na Arábia Saudita.

Você só não sofrerá pressão pior do que alguém que não goste de cachorros na Arábia Saudita.

Encontrei um casal de amigos outro dia na rua e eles traziam consigo o seu cãozinho de estimação, um desses yorkshires que todo mundo (menos eu) fica com vontade de colocar no colo e fazer festinha.

E aí está um dos grandes problemas do cachorro: a interação social forçada. As pessoas acham que podem se aproximar de você só para demonstrar como "são ótimas no trato com animais".


Como sempre digo a este casal, pra mim ter um cachorro dentro de casa faz tanto sentido quanto ter um tamanduá, uma paca ou uma cabra. Imagine um pastor alemão num apartamento (e tem louco que faça isso), porra, uma cabra ali ocuparia o mesmo espaço, daria mais ou menos o mesmo trabalho, te impediria de viajar quando quisesse porque você precisaria tomar conta dela, mas pelo menos daria leite pra você tomar no café da manhã.

Confesso que demorei um bocado para sair desse armário canino e assumir que não gosto de cachorros. Mas assim, não é que eu seja um tipo de Josef Mengele da carrocinha ou ache que a indústria de casacos de pele precisa olhar com mais carinho para os poodles, nada disso.

O "não gostar" não significa "odiar". Eu só não vejo a menor necessidade e nem o menor sentido em ter um cachorro a menos que você more numa casa isolada, cercada por terrenos baldios e com uma vizinhança nada confiável.

Mas ainda assim, nesse caso, acho que preferiria ter uma onça.

O meu não gostar é algo como "quero que todos os cachorros sejam saudáveis, felizes, cheios de filé para comer, mas longe de mim".

Creio que isso seja fruto de um trauma de infância e isso não é uma figura de linguagem, é literal mesmo. Meu pai adora cachorros - agora que mora num sítio tem sempre em torno de dez  - mas mesmo na nossa casa, ele sempre teve dois, três, quatro...

E todo final de semana pela manhã eu era militarmente acordado para ajudá-lo a "lavar o quintal". Só que "lavar o quintal" não consistia numa divertida brincadeira com água e sim em recolher quilos de bosta de cachorro, enrolar num jornal e depois lavar tudo.

Veja bem, eu amo meu pai, isso não alterou em nada todo o carinho que sinto por ele, mas convenhamos que o cheiro de merda de cachorros no nariz todo sábado e domingo durante anos contribuiu bastante para o meu pavor por esse bicho.

Cachorro baba em excesso, urina em excesso, late em excesso e solicita o dono em excesso. Sem contar os donos de cachorro que muitas vezes precisam mais de adestramento do que os seus animais de estimação.

Durante muito tempo eu lutei contra isso, sempre dizia pra mim mesmo "ah, tem a baba, o mijo, os sofás roídos, os pulos com as patas imundas de terra na minha roupa, mas eu gosto de cachorro, eu gosto de cachorro, eu gosto de cachorro...", mas não adiantou muito.

Por isso, tal qual um sujeito que, contra tudo e contra todos, ainda usa calça boca de sino e batas indianas, resolvi assumir minha opção e declarar: eu não gosto muito de cachorros.

E para você que fica ofendidíssimo porque eu digo isso, uma dica: desejar que eu e toda a minha família sejamos devorados por dobermans não vai contribuir em nada para que eu passe a gostar do seu au-au.

O amante traído

Postado em 6 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 3 Comentários

Dizem por aí é que não tem nada melhor do que ser amante, porque você só fica com a parte boa da brincadeira. Bom, essa é afirmação que carece de testes comprobatórios, mas que acabou virando verdade por difusão.

Dizem que o (a) amante é tudo o que seu marido (esposa) era antes de casar. OK, contas do mês, futebolzinho do Domingo, reuniões da Amway na sala de estar, calcinhas bege e toalhas molhadas em cima da cama tiram um pouco do glamour do relacionamento e botam tudo na mesmice.

Aí vem o ciúme, aquele sentimento de insegurança, aquele medo ser trocado. É nessa hora que você começa a achar que o seu parceiro (não adianta, eu detesto essa expressão) pode se interessar muito mais por qualquer outra pessoa do que por você e, dependendo do seu comportamento (e do tempo que você passa no sofá) isso pode mesmo ser verdade.

Existe quem diga que ter um caso ajuda a aliviar o peso da rotina, tenho minhas dúvidas, mas e o outro lado? E o "ser amante"? Será que é bom?

Comecemos pelo que pode ser mesmo "divertido": amante não tem compromisso, só encontra o outro perfumado, bem disposto, aplicado. Nada daquele negócio de gozar e ir dormir ou de aparecer nua sem depilar a virilha. Rola calcinha comestível, dormir de conchinha, surpresas, torpedos sacanas pelo celular, unha francesinha.

Por isso que é comum todo mundo achar que está rolando Ricardão (ou Ricardona) quando, de repente, o outro começa a se arrumar demais. Sabe como é, a hipótese da pessoa querer reestabelecer velhas conexões e reconquistar a paixão perdida parece "boa demais pra ser verdade", tipo aqueles emails dizendo que você ganhou uma fortuna de um milionário nigeriano.


E justamente por ser tudo tão fora da realidade (e obviamente muito mais legal) durante um caso, é que o envolvimento é difícil de ser evitado. Quem trai começa a achar que está andando de Fusca enquanto poderia continuar passeando naquela Maserati, mas em contrapartida o amante começa a pensar que está dando mole, como se tivesse ganhado um pacote de 7 dias na Disneylandia e só usasse 1 ou 2 desses dias.

Durante caso extra-conjugal ninguém paga conta de luz ou tem uma diarréia. Essas bondades ficam em casa.

Mas curiosamente não é raro que, quando a paixão aparece e a pessoa passa a querer tudo, o amante começe a sentir ciúmes até mesmo dessa rotina chata da qual não participa. E é aí que termina a parte "divertida" de ser amante:

- Pera aí, você discutiu com ele por causa da por causa do por causa das compras do supermercado? Porra, esse cara é um sortudo, ele é corno mas tem uma intimidade que eu nunca vou ter contigo.

- Ah, então eu não sirvo para segurar o balde enquanto você bota os bofes para fora por causa desse rotavírus? Só aquela puta da sua esposa é que pode aturar seu vômito e lavar suas cuecas sujas?

E convenhamos, tirando por aquele lance meio chato de ser o "último a saber", qual é a pior parte de ser traído? É justamente saber que o outro faz coisas que não faz contigo, que tem determinados momentos que você não tem.

Nessa hora, brota aquele pensamento que só pode ser algum castigo vindo diretamente das masmorras do rei Xerxes, que é o amante pensar "porra, eu quero é ser o marido!".

E o final dessa história nunca é divertido, porque o que geralmente acontece é alguém terminar ouvindo algo como:

- Pô, entre a gente está tudo tão bom, sexo, diversão, rotina eu já tenho em casa, tô fora.

Ou então a pessoa larga cônjuge, filhos, cachorro, periquito, jogo de buraco na Sexta-Feira e muda de mala e cuia para uma nova casa.

Nessa hora, a maldição se completa, no exato momento em que a pessoa pára de repente e pensa:

- Pera aí, eu virei o Orkut, quem vai impedir que ela vá cutucar outro no Facebook?

Como o "ser corno" vai muito de como a pessoa se vê (tem muita gente que é sem ser), nessa hora a maldição se completa: real ou não, o amante virou corno.

A transferência do seu beijo de língua foi concluída com sucesso

Postado em 4 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 4 Comentários

Li que os japoneses criaram uma máquina capaz de transmitir beijos na boca à distância. Juro que não sei porque depois do Tamagochi e dos otakus eu ainda me espanto com qualquer coisa que venha do Japão, mas me espantei com essa.

Parece que toda aquela sabedoria milenar, aquela coisa de honra, disciplina, controle, força, quimonos, rabos de cavalo e, claro, gueixas, degringolou e deu origem a essa sociedade japonesa atual, que cria coisas como liquidações onde você compra sacolas fechadas sem saber o que tem dentro, a tal "sacola da sorte" (sorte do vendedor, talvez), e máquinas de beijo.

Mas se a gente pensar bem, essa bizarra invenção tem tudo a ver não somente com o Japão, mas com toda a sociedade moderna, globalizada, conectada, plugada e qualquer outro desses termos clichês que as reportagens adoram repetir.

Já conhecemos parceiros - esquece o termo "parceiro" que parece coisa de pagodeiro ou viado - conhecemos namorados e namoradas em sites de relacionamento, todos expostos como num sacolão.

Fora isso compramos quase tudo pela internet, desde manuais caseiros sobre armas de destruição em massa até as compras do mês. Do natureba viciado em brócolis ao aspirante à Unabomber, todo mundo pode conseguir quase tudo na rede.


Vivemos em algo bem próximo dos desenhos dos Jetsons, que apertavam botões e recebiam comida automaticamente de uma máquina. Na versão moderna (e real) dos Jetsons, recebemos livros, CDs, comida e até pessoas. Porque então não receber beijos?

Você beija uma geringonça, ela registra seus movimentos, envia esses dados pela internet para outro aparelho igual instalado na casa da pessoa que você quer beijar e ela recebe o seu beijo por transferência online.

Se der certo podem inventar máquina de abraço, máquina de soco na cara, máquina de pé na bunda. Máquina de encheção de saco não precisa inventar porque já existe e se chama operador de telemarketing.

É bizarro, mas pode facilitar muitos casamentos por interesse que têm por ai e, com algumas adaptações relativas à parte da anatomia humana em foco, pode até mesmo dar uma nova dimensão para as atividades da mais antiga das profissões. Já pensou?

Você fornece o número do cartão de crédito, coloca a parte que melhor achar conveniente no tal aparelho e dá um beijo de língua sem se preocupar com a cebola que comeu no almoço, transa sem trocar fluídos e sem precisar dormir de conchinha depois e, para os mais ousados, pode até receber um boquete a laser da melhor qualidade.

Não sei se vírus de computador oferece algum risco, mas se estivermos imunes a isso, dispensa até a camisinha.

O problema mesmo seria a preservação da espécie, já que para enviar o "material" necessário para perpetuá-la teríamos que confiar nos Correios, pelo menos até que os japoneses apresentem alguma novidade nesse sentido.

Pescado nas redes sociais

Postado em 1 de mai. de 2011 / Por Marcus Vinicius 3 Comentários

Lembro bem quando conheci o Orkut: um belo dia, uma amiga vira pra mim e diz "olha só esse link". Minha primeira dúvida foi: pra que serve isso? Mais ou menos como no dia em que me apresentaram o Twitter.

Mas não demorou muito pra que eu fosse engolfado por aquele tsunami de amigos de infância, ex-namoradas, primos que mudaram do país, todas as turmas de todos os colégios que eu já frequentei. Era o paraíso de qualquer stalker, os álbuns ainda não tinham opção de privacidade e todo mundo lia os recados de todo mundo, ou seja, em coisa de 12 horas você sabia até os horários em que a pessoa ia ao banheiro.

Pude ver ainda como as meninas da minha turma viraram mães de família iguais às que as iam buscar na porta do colégio e como só quem não ficou igual a mãe foi a filha da professora de Educação Física, que era gostosíssima. Um monte de namoros começaram ali. Alguns pares de cornos também podem ser creditados ao Orkut.

Mas confesso que até hoje não ficou bem clara a sua função, já que todo mundo que você "perdeu contato" talvez não fosse tão útil ou importante assim no sentido da sua vida, do contrário você não teria perdido contato. Como não creio que participar de comunidades como "Olho o cocô antes de dar descarga" ou "Vou, vomito e volto" possa ser considerado como utilidade, concluo que o Orkut era (é) inútil mesmo.

O Facebook e o Twitter vieram para confirmar isso, ainda que com um pouco mais de glamour, já que também não entendo muito onde o destino da humanidade será afetado porque a mãe da @JujuBieber desistiu de fazer brigadeiro ou porque o @MarcioAdv finalmente terminou de digitar sua petição.


Correndo por fora tem o Badoo (que manda 20 mensagens de Spam por dia, ficando bem claro porque seu nome rima com "vai tomar no..."), o My Space(que anda meio esquecido) o LinkedIn, que é uma espécie de entrevista de emprego misturada com site de encontros (ou vice-versa) e outras menos concorridas e com nomes esquisitos.

Seja qual for a sua rede social, a verdade é que isso vicia mais do que álcool e cocaína juntos. Em "Admirável Mundo Novo", Aldous Huxley criou uma droga chamada "soma", que mantinha todo mundo meio em transe, meio doidão. As redes sociais parecem ser o nosso "soma".

Basta olhar em volta e entender isso. Muita gente não as usa mais para documentar a vida e sim usa a vida para criar assunto para documentar nelas.

Todo mundo precisa ser meio chique, meio engraçadinho, meio despojado. O tempo todo.

Seja no supermercado, indo comprar margarina mas tirando foto na sessão de vinhos importados pra colocar no álbum do Facebook, ou diante de uma colisão entre uma betoneira e um caminhão pipa, tentando inventar correndo uma piada sobre o acidente para postar no Twitter - "Acidente na Rio-Santos, betoneira e caminhão pipa: concreto de graça pra todo mundo! - chega uma hora que o sujeito necessita uma desintoxicação.

Não digo algo radical demais, como viajar para uma ilha deserta e ficar ali isolado igual o Tom Hanks no "Náufrago", mas talvez tentar encontrar com os amigos sem falar em computador ou incluir na conversa qualquer uma das seguintes palavras: "You Tube", "baixar", "internet", "comunidade", "link", "tuitada", "msn" e "email".

O problema é não te sobrar muito assunto ou muitos amigos depois disso, ou então você terminar a experiência sofrendo de delirium tremens, correndo pelado por aí e parando num desses sites de vídeos caseiros, estilo "Caiu na Net".
 
Template Contra a Correnteza ® - Design por Vitor Leite Camilo