Traga 200 toalhas brancas, por favor

Postado em 31 de mai. de 2012 / Por Marcus Vinicius 4 Comentários

Sempre que vai acontecer algum grande show, presto atenção especial às listas de exigências que os artistas fazem. Nunca entendi, por exemplo, porque alguém precisa de 200 toalhas.

A menos que se queira enfiar 200 pessoas para fazer uma sauna no camarim (o que eu acho difícil), esse tipo de coisa parece servir a um único propósito: vou dar uma sacaneada neles, afinal, eu posso.

Claro que deve existir também um certo sentimento de revanche por trás da coisa toda, tipo "passei anos comendo cachorro-quente de 1 dólar e dormindo numa Kombi, agora vou pedir 30 sofás em formato Kombis prateadas no camarim e o produtor que se vire".

Mas ainda que este mundo de excentricidades seja, como diria, excêntrico, não tem como deixar de pensar no que se passa nas excêntricas cabeças de nossas excêntricas celebridades (deu pra entender que eu quis enfatizar a parte do excêntrico, né?).

Já cogitei mensagens cifradas, como por exemplo "30 litros de leite desnatado, 20 litros de leite integral e 10 litros de achocolatado", o que poderia dizer algo como "3 prostitutas suecas sem silicone e duas alemães com bastante silicone e uma aborígene".

Ou então uns pedidos completamente aleatórios, como "10 hamburgers de soja, 10 pães integrais, queijo de cabra light, água mineral Figi e 2 garrafas de Jack Daniel's".


Sério? Qual o objetivo disso? Dizer que é um metrossexual leitor de Crepúsculo que usa batom mas pelo menos enche a cara de whisky? Porque parece um pedido de alguém que compraria uma Harley Davidson preta e...rosa.

Amy Winehouse pedia canecas de porcelana chinesa. Talvez porque seja impossível a China falsificar algo que já é feito na China. O Metallica pede bifes crus e trazem seus chefs de cozinha para prepará-los, é quase como ir num jantar na casa dos amigos e levar a cozinheira junto.

Uma banda adolescente pede "gomas em formato de ursinhos", como se quisesse provar que existe algo ainda mais gay do que uma banda adolescente. Lenny Kravitz exige coleta de lixo reciclável, já que talvez ele resolva ficar ali depois do show para catar as latinhas pessoalmente e complementar o cachê.

Tem uma cantora brasileira que pede almofadas "obrigatoriamente novas". Se eu fosse produtor faria questão de colocar uma usada no meio pra ver se a bunda dela nota a diferença.

Outros preferem fazer pedidos negativos. Li sobre uma banda que pede que não seja servida comida orgânica, que não forneçam água Evian, que não coloquem doces no camarim e, por sorte, não pediram para remover a platéia também.

No fim disso tudo chega dar pena de pessoas que ganham a vida atendendo a este tipo de exigências. Porque pense em ser passar o dia atrás de araras azuis para decorar o camarim de um sujeito que vai passar pela gaiola a caminho do palco totalmente bêbado e não vai notar se são mesmo araras ou urubus pintados de azul?

Mas o pior deve ser arrumar tudo, todos os bifes, vinhos, mesa de frios, tubos de cores diferentes de batata Pringle's, piscinas de M&Ms e no final das contas o pop-star virar e dizer:

- Vou querer só uma azeitona.

Se ainda não deu certo é porque não chegou ao final

Postado em 29 de mai. de 2012 / Por Marcus Vinicius Nenhum comentário

Um esquadrão do Comando Delta está a bordo de um helicóptero para se infiltrar num campo de prisioneiros alienígena que está mantendo metade da população humana ali para roubar semen e próteses de silicone com a intenção de transformar em combustível para suas naves espaciais.

No meio da confusão, bombas, pistolas de raio laser, tiros e explosões, o protagonista nervoso sai pelo lado errado do helicóptero e tem sua cabeça decepada pela hélice. Fim do filme por falta de um mocinho.

Um bando de crianças entra numa fábrica de chocolate e é recepcionada por um sujeito esquisito de cartola. No meio do passeio eles encontram anões verdes, doces fabricados em série e ouvem um monte de histórias fantásticas contadas pelo sujeito.

Lá pelas tantas um gordinho invocado vira e diz:

- Ô, Seu Madruga, vai parar de falar e me dar um saco de M&Ms quando hein?

E é acompanhado por uma menininha de óculos:

- Esses anões verdes, trabalham de carteira assinada? Esse rio de chocolate ali, tem alvará do Ibama?

Depois de passar a noite dançando apaixonadamente numa bodeguita charmosa, o casal sai pelas ruas de Paris dançando na chuva. Ele empresta sua capa para proteger a moça do frio, ela tira suas luvas para acariciar o rosto do rapaz.

Uma trilha sonora toca ao fundo, enquanto a manhã se descortina luminosa sobre o Rio Sena. Eles já estão embriagados de paixão e champagne e só falta um beijo para consumar aquela noite perfeita. Só que ela bebeu demais. Bebeu demais mesmo e, antes de desmaiar, dá uma golfada de vômito com cheiro de roquefort na capa, no sapato e no bigode dele, que já estava quase dando um beijo na sua boca.

Um time de basquete se reúne no vestiário no intervalo de uma partida. São todos amigos e estreitaram seus laços mais ainda durante a difícil temporada na qual perderam todos os jogos. Sua equipe está ameaçada de fechar caso continuem perdendo assim e eles dependem disso para provar para si mesmos e para todo mundo que não são um bando de fracassados.


O técnico pede a palavra e fala sobre honra, glória, superação e sobre os fãs que não merecem todo aquele sofrimento. Eles se juntam no centro do vestiário e dão um grito de guerra, saindo dali com determinação e garra, com sangue nos olhos, para virar aquele jogo.

Voltam para a quadra e levam uma surra de 102 a 50, confirmando a posição de último no campeonato e decretando a falência do time.

Um casal vive uma históra digna de Romeu e Julieta. Ela, rica, bem criada, filha de um empresário torcedor do Grêmio. Ele, de classe média, tem um Fusca e é de uma família colorada. Nascerem no Rio Grande do Sul e serem de famílias tão diferentes impede aquele amor.

Num ato de desespero ele faz a proposta:

- Vamos casar! Vamos fugir para Manaus e torcer juntos pro São Raumundo!

E ouve, emocionado, a resposta da amada:

- Tá louco? Primeiro, como vamos chegar no Amazonas de Fusca? Depois, eu vou viver de que, já que você só ganha uma bolsa de pesquisa e aquele seu pai mão de porco não empresta nem pra gasolina? Outra, Manaus é quente pra cacete, você quer que eu vire um saco de brotoejas?

Grupo de adolescentes reunido na praia. Um deles, metido a cientista louco, diz que criou uma máquina de viagem no tempo. Eles entram num guarda-roupas, saem num mundo fantástico, lá pegam uma caravela e vão atrás do tesouro dos piratas do Caribe, voltam milionários e serão felizes para sempre.

Um gaiato coloca o celular de lado um momento, vira pra ele e diz:

- Andou bebendo o que, campeão? Bora filmar umas bundas pra botar no YouTube que a gente ganha muito mais.

Finais felizes, né?

E não, não fiquei maluco contando esse monte de histórias sem nexo, só quis mostrar como o cinema seria caso os roteiristas se baseassem mesmo só em histórias reais.

Se a vida passasse num filme nacional

Postado em 24 de mai. de 2012 / Por Marcus Vinicius 3 Comentários

Desde a época do "Bye Bye Brasil" até o tempo da retomada dos anos 90, sempre achei que se alguma reforma ortográfica eliminasse o "porra" e o "caralho" da língua portuguesa, o cinema brasileiro não conseguiria produzir 15 minutos de filme sequer.

Afinal de contas ficaria meio difícil escrever um roteiro só com "putaqueparius".

Imagine como seria no mínimo estranho se a vida passasse num filme nacional:

- Me dá meia dúzia de pães, porra!

- 2 reais, seu merda!

Eu sei perfeitamente como todo mundo fala palavrão o dia inteiro (quer dizer, quase todo mundo), mas nosso cinema cria um universo paralelo onde até um padre no meio da Missa pode virar de repente uma Dercy Gonçalves.

Quem mora num país distante - no Nepal, por exemplo - e assiste um filme brasileiro, vai ter algumas idéias estranhas sobre o país. Primeiro, vai pensar que todas as mulheres daqui têm nome de drag queen ou de personagem de núcleo pobre da novela das oito, tipo Britney Carla, Kellyane, Pamela Suellen ou Daiane Carla.

Depois vai achar que, seja rico ou seja pobre, todo brasileiro invariavelmente tem mau gosto e se comporta como um bicheiro de botequim num subúrbio da Leopoldina, com cordões de ouro e palitos de dente na boca enquanto fala. 


Se não for isso, com certeza será um desses novos ricos que bebe licor em xícara de cafezinho levantando o dedo e tem uma esposa perua que vive pra cima e pra baixo com uma poodle rosa chamado "bijú".

Outra coisa que o confuso nepalês vai ter certeza é de que todo o país gira em torno de uma favela. Desde o Eike Batista até o João Borracheiro, todos têm algum assunto para resolver ali. Seja comer o melhor pastel da cidade, consertar o carro, procurar namorada ou jogar uma sinuquinha, a favela é o lugar para se estar.

Se a vida passasse num filme nacional, em torno de 5% da população trabalharia num botequim, 5% passaria o dia em escritórios tomando whisky enquanto o dinheiro flui naturalmente para suas contas bancárias e os outros 90% estariam indo ou voltando da praia.

Se vivesse num filme brasileiro, você também encontraria todas as pessoas que conheceu no curso da sua vida no mesmo vagão de um trem da Central, ainda que estas pessoas fossem seu patrão que mora na Barra, seu primo que mora em Muriaé e sua namorada, que está fazendo intercâmbio nos EUA e passeando de trem da Central nas horas vagas.

A tomar pelos nossos filmes, um nepalês, indiano ou sueco possivelmente também acharia que o Brasil é um gigantesco elevador ou consultório de dentista, tocando chorinho como som ambiente o dia inteiro.

São tantos clichês bananenses, que posso até imaginar um desses gringos chegando no aeroporto pra conhecer o país depois de aprender o comportamento dos nativos através desses filmes:

- Um táxi, Senhor?

- Senhor é o caralho! Meu nome agora é Zé Pequeno!

Ser Portugal

Postado em 22 de mai. de 2012 / Por Marcus Vinicius 4 Comentários

Precisei de uns meses depois de lá estar para, recuperado da experiência, reunir forças para falar sem que nenhuma afetação ou afecção tornasse a escrita (e a leitura) praticamente tão açucaradas quanto um pastel de Santa Clara.

Ao dizer isso, não sei ainda se vou conseguir, mas a tarefa se apresenta quase como uma dívida, então me lanço à ela.

Sempre ouvi Portugal em histórias, em lembranças dos outros - próprias ou alheias - incorporadas a uma espécie de espírito comum que se espalhou na diáspora portuguesa mundo afora.

Logo, já não sei se histórias que hoje conto como se fossem minhas foram mesmo de minha bisavó, da minha tataravó, de alguma tia delas ou simplesmente da vizinha que nos vinha oferecer castanhas nas festas de final de ano.

Portugal assim, antes de tudo, foi uma fábula.

Sempre o ouvi também em sotaques. De feiras, padarias, clubes, fados e ranchos folclóricos com as cantorias de suas tricanas sobre coisas que muitos ali, descendentes nascidos e criados no além-mar, só viveram geneticamente.

Então para os filhos e netos de seus desgarrados, Portugal é um som.

E como este pequeno, valente e resistente país conquistou meio mundo, não foi difícil conquistar minha mente, antes mesmo que eu pisasse em seu solo. Sonhava, noites e noites a fio, em como seria caminhar por suas ladeiras estreitas, por seu calçamento sem o qual Lisboa não seria ela, a sentir seus cheiros, experimentar suas luzes, viver sua vida, ainda que acordasse de manhã sem ter saído de onde estava.

Portugal então era uma visão distante.


Até que a vida um dia me levou para lá. Já no avião, esperando o inevitável encontro que estava traçado desde que nasci (hoje posso afirmar isso), ouvia músicas suaves naquele sotaque que não diz "ouço", mas "oiço".

E ao chegar, Portugal foi pra mim uma manhã.

Se abrindo lentamente junto com o sol que iluminava seus gramados, seu antigo casario, seus bondes (que aprendi a chamar de elétricos) e sua gente, com compleições faciais parecidas com quase qualquer pessoa da minha família.

Em Portugal, quase todo mundo poderia ser meu tio, minha prima ou mesmo um dos meus avós. E assim mostrou-se também, de certa forma, lar.

Tanto que nem sei se foi mesmo um encontro ou um reencontro, já que as árvores e casas dos meus sonhos estavam todas ali, vertidas em realidade, com cada uma das suas andorinhas reais e de cerâmica.

Como não lembrar para sempre dos seus gostos, seus pastéis de nata e de bacalhau, suas alheiras de Mirandela, suas castanhas assadas na calçada (cheiro que jamais me deixará esquecer Lisboa)?

Como esquecer as tardes de luzes indescritíveis na invicta Cidade do Porto, suas pontes, seus parques, sua gente tão linda, o vinho e a ginja e seus heróis do mar presentes em toda parte?

Schifaizfavoire!

E foi somente quando desisti de ouvir a condutora do elétrico anunciar a parada do "Castiééél de São Jorg" ou a voz do métro (assim mesmo, com acento agudo no "e") dizer "Terrrrréiro d'Paço" sem ficar embasbacado com a sonoridade daquelas palavras, que eu me dei conta de que Portugal não é somente um lugar para conhecer, mas um lugar para se encontrar.

É impossível chegar e sair sem se tornar um pouco português.

A partir daí, Portugal passou a ser eu.

Eu acho que vi um gatinho

Postado em 17 de mai. de 2012 / Por Marcus Vinicius 10 Comentários

Quando digo para as pessoas que não sou muito fã de cachorros, sempre me olham com aquela expressão de quem acabou de se deparar com um carrasco nazista. E a reação geralmente piora quando falo que meu animal predileto é o gato.

Invariavelmente ouço aquela ladainha de que gatos são traiçoeiros, só amam a casa e não o dono, que são interesseiros, não obedecem e mais um monte de outros mitos que contribuem para uma certa fama de mau do felino.

Pois bem. O curioso é que cada "defeito" que apontam nos gatos, para mim, na realidade, é uma qualidade que me faz gostar ainda mais dele. Vamos analisar: por que traiçoeiro, interesseiro e desobediente?

Simples, porque gatos não levam desaforo para casa, não se contentam com pouco e são independentes.

Jamais um gato vai apanhar do dono e sair rastejando atrás dele, cheirando seus pés. Se você o maltrata, ele responde. Se você lhe nega comida, ele vai embora atrás de algum lugar onde o tratem melhor. Se você quer impor a ele suas vontades - aquela coisa do "senta, pula, finge de morto" - ele vai te mandar plantar batatas.

E tudo isso da forma mais elegante do mundo, tal qual é um miado, com certeza mil vezes mais sutil do que um latido.

Gatos não são para principiantes. Primeiro de tudo você precisa ser humilde, tem que saber que nem sempre que você chegar em casa afim de assistir televisão com ele sentado do seu lado no sofá, o bichano vai estar afim. Se ele não quiser, ele não fica e pronto.


Para conviver com um gato, temos entender que eles não precisam do nosso carinho, mas ao contrário, ainda que gostem de carinho, não abrem mão de decidir quando vão recebê-lo.

A amizade e o amor de um gato são tão raros quanto preciosos e você precisa conquistá-los. Eles realmente lidam com os humanos de igual para igual, ainda que tenham a certeza de ser superiores. Gatos não têm donos, eles possuem humanos, quem nunca leu isso?

São o inverso do que os ditos racionais esperam. Se ele abana o rabo, está irritado. Se o rabo fica arrepiado, é porque está com medo. Se roça entre suas pernas, ele quer dizer: confio em você. E quando se irritam, não só arranham, também mordem melhor do que qualquer pastor alemão.

Mas apesar de compexos, nada é mais gratificante do que ser acordado com eles roendo seu pé ou seu nariz delicadamente, do que ver a expressão - sim, eles são muito expressivos - de felicidade quando ganham a comida preferida ou simplesmente o som de um ronronar, que na linguagem deles equivale quase a um "eu te amo".

Como disse muito bem Arthur da Távola, os gatos são "uma lição diária de afeto verdadeiro e fiel", feitos para quem sabe observar e ter paciência de entender os detalhes, as minúncias e sutilezas.

Ele é, no mundo animal, talvez o mais próximo que um humano possa encontrar que não seja outro humano. Cheio de sentimentos, ambições e vontades, capaz de amar, de odiar ou simplesmente desprezar, o que fazem com muito mais charme do que nós.

E ainda que jamais consigamos compreendê-los por completo, estes pequenos felinos que já foram até deuses no Egito, tenha certeza de que eles também não nos entendem muito, afinal, quem é que poderia desprezar um presente tão maravilhoso quanto um pombo morto, que eles colocam cuidadosamente em nossa porta?

Só mesmo os humanos, que se não fornecessem a eles diariamente aqueles deliciosos patês de atum, certamente não mereceriam tanta paciência. 

Lugar de homem é na oficina

Postado em 15 de mai. de 2012 / Por Marcus Vinicius 3 Comentários

Existem homens que não sabem cozinhar, lavar, passar e até aqueles que jamais pegaram numa chave de fenda na vida. Sério mesmo. Tenho uma amiga que contou que o ex dela a chamava para trocar até uma lâmpada, porque ele não sabia fazer nem isso.

Ela terminou rompendo o namoro com ele achando que um dia o rapaz pegaria seu rímel emprestado.

Lembrei disso porque um dia vi o anúncio de um curso de mecânica para mulheres. Lógico que achei muito legal a iniciativa de instruir nossas mães, irmãs e esposas na difícil tarefa de não ser enganada por mecânicos que usam termos como "junta do cebolão", "garfo da cremalheira" ou "ponta do giclê".

Só que esse tipo de curso parte de uma premissa equivocada: a de que todos os homens já nascem conhecendo tudo de mecânica, como se cromossomos X e Y reunidos viessem com toda aquela carga de informação que somente estudo, anos de experiência e um macacão imundo de graxa podem proporcionar.

O fato, porém, é que a maioria dos homens tem tanta intimidade com os três termos que citei quanto com "chã, patinho e lagarto". Nosso conhecimento sobre carnes se resume a picanhas e asas de frango e o conhecimento da maioria de nós sobre mecânica se resume a abrir o capô do carro, olhar para aquilo como se fosse uma Conjectura de Poincaré e torcer para que o simples gesto de balançar fios, dar umas porradinhas nos contatos da bateria ou um chute no pára-choques sirva para fazer o motor voltar a funcionar.

O pior de tudo é que sempre esperam algo de um homem nessas situações.


Se você estiver na estrada com sua namorada ou mesmo passando um final de semana na casa de praia da dela, a primeira coisa que vai acontecer quando o motor engasgar, algo na suspensão quebrar ou um cano estourar é olharem para você com aquela expressão de quem diz "agora é a hora de você provar que nunca fez depilação".

E assim começam seus problemas, já que até hoje sua curiosidade sobre automóveis e reparos caseiros se resumiu a encher o tanque do carro e pedir para o frentista calibrar os pneus e colar um poster do Kiss na parede usando fita adesiva, porque ficou com medo de machucar o dedo colocando um prego.

Por isso, ainda que você pense que jamais vai precisar disso, porque a concessionária é logo na sua esquina e o porteiro do seu prédio faz tudo em meia hora e cobra barato, convém aprender coisas básicas como trocar um pneu, apertar alguns parafusos, colocar um quadro na parede e substituir uma torneira do banheiro.

Porque assim como - para horror das feminazis - espera-se que uma garota saiba pelo menos fritar um ovo e fazer um Miojo (já que nem todas podem namorar o Jamie Oliver), todo mundo vai esperar que nessas horas você bote a mão na massa e dê um jeito na situação.

Mesmo porque dizer que nunca quis saber muito de mecânica por não gostar de ficar sujo de graxa e porque aqueles posters de mulher pelada nas oficinas são uma coisificação da mulher que te incomoda  só vai te fazer parecer ainda mais esquisito no fim.

A gostosa nossa de cada dia

Postado em 10 de mai. de 2012 / Por Marcus Vinicius 1 Comentário

Certa vez li que "a gostosa" não deixa dúvidas sobre o que ela é. Você pode estar num lugar cheio de sósias da Alícia Silverstone e da Dami Moore nos seus melhores dias, que se "a gostosa" aparecer, vai se destacar naquela multidão de outras gostosas.

Isso porque "a" gostosa é diferente de uma gostosa comum.

Ela pode ter qualquer cor de pele, pode ser loira ou morena, japonesa ou índia, nerd ou piriguete, descolada ou perua, pode ser gordinha, magra ou sarada, não importa, antes de tudo ela tem o charme, o andar, o perfume, a voz, o cabelo e todo o conjunto que a faz ser "a gostosa", uma dentre tantas.

Quando você se depara com ela, não há dúvidas, não existe espaço para "será?". Se você pensar algo como "eu acho que essa é a gostosa", esqueça, não é ela. O que faz um ditado popular surgir como um foguete na minha cabeça: em terra de cego quem tem um olho é a gostosa.

Porque, convenhamos, ainda que não seja um unicórnio ou um rapper com bom gosto para se vestir, a gostosa também é algo raro (se não impossível) de se encontrar. Nesse caso o que fazemos? Simples: fazemos o que todo ser humano mais gosta de fazer, que é enganar a si mesmo.

Nenhuma escola, sala de aula, rua, condomínio, clube, bar, fila de banco, barraca de feira ou caixa de comércio no mundo deixa de ter aquela que todos desejam, que pode ou não (mais não do que pode) ser também a gostosa.


Lembro bem quando fiz o primeiro grau e tinha uma menina que todos, literalmente todos, eram afim. Era um tal de bilhete anônimo e espiada na escada pra ver se conseguia olhar um centímetro de calcinha sequer, que tudo levava a crer que ela era sensacional.

Só que não era. Na verdade ela não acertou na Mega Sena (não que eu saiba) mas tirou outro tipo de sorte grande: era a mais bonitinha de um lugar onde não havia "a gostosa".

Talvez seja isso que explique porque você passou tanto tempo apaixonado por alguém que, anos depois, não conseguia sequer pensar em algo que realmente chamasse sua atenção. Você simplesmente estava nadando num mar de tubaína e te ofereceram uma Coca-Cola.

Nada de champagne, nada de whisly, mas uma simples Coca-Cola, que de repente virou a bebida mais gostosa do mundo, só porque não tem gosto de bala derretida.

Assim são aquelas que substituem sem substituir realmente a gostosa.

E novamente isso me faz pensar em outra coisa: que é o fato de ter muita gente considerada inteligente por aí que só tem como mérito andar cercada de imbecis.

Sem contar incompetentes cercados por gente mais incompetente ainda, malas sem alça que só são legais porque andam com cretinos piores do que eles e gênios que só são gênios porque vivem numa espécie de jaula de gorilas.

O que me leva à concluir que o vizinho fracassado é um dos maiores fatores de estabilidade social depois da televisão: é ele que faz com que o resto da rua inteira pense que é "a gostosa" do pedaço.

Seu garçom faça o favor de me trazer depressa: 2 hamburguers, alface, queijo, molho especial, cebola e picles, num pão com gergelim

Postado em 8 de mai. de 2012 / Por Marcus Vinicius 2 Comentários

Houve um tempo em que sentávamos à mesa de um restaurante e, após escolher atentamente no menu,  os pratos desfilavam calmamente na nossa frente, como se o almoço tivesse mais ou menos umas 12 horas de duração.

Tudo bem que não poderia continuar sempre assim, afinal, se ficaram para trás o colete, as polainas, às idas regulares ao barbeiro e as anáguas, dentre tantas outras coisas, por que haveria de permanecer a digestão saudável entre nossos hábitos?

E surgiu o fast-food.

Claro que não foi assim de uma hora para outra. Primeiro vieram as minutas, depois os pratos feitos, em seguida os galetos comidos em pé em algum balcão e finalmente o Mc Donald's e seus similares.

Era tudo muito fácil e rápido: hamburguer com ou sem queijo, batata-frita grande ou pequena, Guaraná ou Coca-Cola, com ou sem gelo e pronto. A maior estravagância era a receira do Big Mac, com seu molho especial e o pão com gergelim.

De qualquer forma, estava ali um almoço entregue em 2 minutos, comido em 5 e que levaria uns 3 meses de academia para abandonar seu corpo.

Mas pelo menos era simples.

Só que foram aparecendo coisas como o cheese-salada, o cheese-bacon, o cheese-egg, o cheese-purê, o cheese-pega-qualquer-coisa-que-você-tiver-aí-e-bota-nesse-pão, e assim em uma simples (e avessa à vigilância sanitária) Kombi de esquina você podia se deparar com delícias da alta culinária moderna.

Até que os cardápios de fast-food foram sendo ampliados e surgiram locais como o Subway, onde a variedade de opções te obriga quase a fazer um exame psicotécnico e tirar uma carteira de habilitação para frequentá-lo.


Sério, já pensou em alguém saindo de uma máquina do tempo direto dos anos 30 e chegando aos dias de hoje?

Entre o espanto por ver que as pessoas vivem com pressa apesar de estarem indo para onde não querem chegar - no trabalho - e porque usam um telefone para enviar textos ao invés de simplesmente falar, fatalmente ele sentiria fome e seria obrigado a decidir em segundos entre opções como:

- Italiano, parmesão e orégano, três queijos, integral, aveia e mel, 15cm ou 30cm, almôndegas, atum, B.M.T.,  carne, frango pizzaiolo, frango teriyaki, italiano, peito de frango, peito de peru, frango com cream cheese, sabor em dobro(?), alface, rúcula, tomate, azeitona, picles, pimentão, pepino, cebola, molho de maionese, parmesão, mostarda, chipotle, barbecue, mostarda e mel, cebola agridoce, sal, vinagre, azeite, orégano e, claro, pimenta (calabreza ou do reino).

Tudo com o atendente perguntando isso freneticamente e clientes nervosos atrás, dizendo coisas como "porra, já estou aqui há 1 minuto e meio" ou então "não adianta ficar namorando o peito de frango que ele não vai virar a Carolina Dieckman".

Nada mais de "boa tarde, o que o Senhor deseja?", "traga o de sempre, meu bom rapaz" ou "não conta para ninguém que eu trouxe aquela prostituta polaca aqui ontem, viu?".

Explicaríamos isso ao hipotético viajante dizendo que gastamos melhor o nosso tempo, não desperdiçando preciosas horas, e que foi por conta disso tudo que nosso dia  ficou assim, rápido e indigesto.

E por mais que ele não entendesse bem porque poupamos tantas horas para no final não gastarmos nenhuma delas com nós mesmos ou porque a comida servida parece tão diferente daquela comida fotogênica que mostram no cardápio, pior mesmo seria explicar porque alguém chega num drive-thru, faz o pedido e depois estaciona para comer dentro do carro.

Um bife vale tudo isso?

Postado em 3 de mai. de 2012 / Por Marcus Vinicius 2 Comentários

Caro Vegan,

Você sabe que todo dia sou acordado por um barulho estridente que me faz levantar da cama pelo menos umas 4 horas antes do que eu realmente gostaria, que logo em seguida descubro que não estava em Paris, mas na minha casa mesmo e tudo não passou de um sonho e que depois disso ainda sou obrigado a lavar o rosto com água fria, tomar um café morno e comer pão duro porque a preguiça de ir na padaria só não é maior do que a de ir para o trabalho?

Depois disso ainda coloco uma roupa que não é um calção de banho com chinelos, mas algo que certamente me fará passar calor durante o dia e saio de casa rumo a um transporte coletivo onde sou tratado pior do que uma daquelas galinhas que andam em caixotes de aviário (o cheiro de um vagão de metrô se o ar-condicionado estiver no seu estado normal - quebrado - principalmente, é quase igual).

Para seu conhecimento, chegando no escritório dou bom dia para um monte de gente que preferiria nem ter que ver, sento na minha mesa num cubículo de fazer inveja àqueles currais de matadouro, coloco fones de ouvido para fingir que estou escutando música e assim ser incomodado o menos possível, ligo o computador e o pior é que depois de fazer tudo isso ainda esperam que eu trabalhe.

Respondo emails com cobranças que geralmente não se relacionam a nada que esteja ao meu alcance, já que não posso vender, entregar, cobrar e ainda fazer trocas ao mesmo tempo, mas ninguém está interessado nisso, afinal, é mais fácil darem esporros em mim do que na Renatinha, aquela loira gostosa do faturamento que está de caso com o chefe.

No auge do meu desespero rotineiro, recebo alguns Power Points de amigos que provavelmente foram expostos à algum tipo radiação que ativa a demência e estão tão sem o que fazer que pensam que ainda vou rir de montagens com o Seu Madruga e me emocionar com textos que o Jabor nunca escreveu, ainda que sejam creditados a ele.


Nesse meio tempo ouço bate-bocas sobre futebol, mulheres reclamando que Sonho de Valsa não emagrece e, claro, mais esporros por conta dos erros da Renatinha, aquela gostosa, que ainda por cima não aceitou meus fones de ouvido emprestados e por isso obriga todo mundo a ouvir Banda Calypso e Luan Santana o dia inteiro, já que ela adora porcarias e ninguém pode reclamar, afinal, ela e o chefe, você sabe...

Quando o relógio parece estar parado há mais ou menos 90 minutos em 11:30, começo a me preparar para enfrentar uma fila de banco, já que a conta de luz está vencida, o cartão de crédito precisa ser pago urgentemente e ainda tem o carnê do IPTU.

Sei que vou passar mais ou menos meia hora esperando e quando chegar a minha vez um dos caixas vai sair para o almoço e uma velhinha fará uso da sua preferência para pular na minha frente e pagar seu carnê do Baú com moedas de 5 centavos.

No fim terei que sair correndo pelo meio da rua, pedindo licença para camelôs e entregadores de papel de lugares que compram ouro ou alugam putas, para chegar nessa que é a meca da hora do almoço: um restaurante a quilo.

Leitões a pururuca, sushis e queijos suiços estarão enfileirados lado a lado com ovos de codorna, rabanetes e acarajés. Uma senhora de meia idade vai passar um bom tempo recolhendo, um a um, os camarões do bobó, enquanto aquele grupo animado que resolveu almoçar junto faz uma algazarra insuportável em alguma mesa, gritando coisas como "o Vasco é vice!" e "Iça!".


E enquanto admiro tão relaxante cenário, lembro que tenho apenas 15 minutos para comer, pagar e voltar ao trabalho, de onde só sairei às 17:00, o que vai demorar mais ou menos umas 700 horas para chegar. Tudo isso só para voltar para casa no final do dia, naquele mesmo metrô lotado que de manhã já cheirava a jaula.

Por isso não venha me falar de vaquinhas, de matadouros que tratam porcos pior do que pacientes do SUS e nem que animais são amigos e não comida, porque sim, eu acho que esse bife que eu vou pedir pro cara da grelha fazer ao ponto vale tudo isso.

E pra seu governo, o boi provavelmente também acharia se tivesse que passar por um dia assim.
 
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