Não ser chato é ser especial

Postado em 31 de jul. de 2012 / Por Marcus Vinicius Nenhum comentário

Li numa revista que um professor nos Estados Unidos causou a maior sensação durante uma formatura no Ensino Médio. E não precisou acender um baseado durante o discurso, nem mostrar que estava nu debaixo da beca ou mostrar uma foto da Scarlett Johansson pelada num projetor gigante, a única coisa que ele precisou fazer foi dizer: vocês não são especiais.

Isso mesmo, "vocês não são especiais". Pode parecer bobagem, mas nesses dias de hoje falar isso para um bando de adolescentes é quase o mesmo que dizer "vocês são especiais", sei lá, para os passageiros enlatados em um ônibus de qualquer cidade grande do Brasil, ou seja, praticamente impossível de acreditar.

Nesses tempos de internet, com suas redes sociais, todo mundo só mostra o que quer (o que não difere muito do vizinho que vive de aparência, só que nesse caso é tudo em escala maior). Todo mundo chama todo mundo de bonito, inteligente, engraçado, interessante, sempre na esperança de ser chamado de tudo isso de volta. É a recíproca da conversa fiada tomando forma de obrigação social, quase como troca de presentes.

Como bem disse o tal professor em seu discurso, os adolescentes de hoje passam a vida ouvindo como são especiais, únicos, os melhores. Os pais (e talvez até o resto da sociedade) compensa a falta de tempo para prestar atenção no que eles dizem com elogios.

- Mãe, estou chateada, discuti com a Soninha...

- Minha filha, estou ocupada agora, mas tenho certeza que foi porque a Soninha morre de inveja da sua beleza, inteligência e charme.

- Mas, mãe, a gente porque eu joguei o gato dela na piscina...

- Ah filha, você teve um bom motivo e aposto que o gato também tem inveja de você.

- Mas o gato morreu.

- Ela compra outro, agora deixa eu ir pra academia.


Vivemos numa ditadura do pensamento positivo, da auto-estima, do bom humor, que termina criando pessoas incapazes de entender onde estão seus limites (a auto-ajuda dirá "não existem limites!", bom, tente imitar o Pica-Pau e descer as Cataratas do Niagara num barril pra conferir como é a vida fora de um desenho animado).

Não existe mais o "não posso", "não quero", "não sei" ou "tô puto pra cacete porque meu dia está uma merda". Atualmente tem gente que não sabe nem mais responder a um simples "tudo bem?" apenas com um "tudo", não, precisam dizer "tudo ÓTIMO!".

Ora, faça-me um favor! Tudo "ótimo" mesmo só pode estar talvez em um ou dois dias no ano. Três se você ganhar na loteria ou descobrir que vai dar uma volta ao mundo de primeira classe de graça, mas sempre? Tudo ótimo? Desculpe, não acredito.

Se você diz que uma festa está ruim, você é que não sabe ver o lado bom. Se você diz que está cansado, é desanimado. Se não gosta de alguma música, é crítico demais. Se está de saco cheio da sua rotina, é porque "não consegue ver a beleza de um metrô lotado, um almoço num restaurante a quilo lotado e uma planilha de Excel pelo resto do dia".

E talvez por isso todo mundo se sinta tão especial e ensine seus filhos a se sentir assim também.

Vamos esclarecer uma coisa: você é especial para um punhado de pessoas no mundo que pode ser contado nos dedos da mão. Para o resto você pode ser útil, comível, aproveitável, divertido ou simplesmente "OK". Essa é a verdade.

E ser "OK" é uma grande coisa, se você pensar que pode ser mala, cretino, canalha, calhorda, imbecil, idiota ou simplesmente chato. Porque na falta de beleza, meu amigo, esqueça seu objetivo de ser inteligente ou especial, tente apenas não ser chato.

Conhecer seus limites e saber que não é especial em tudo e para todos é bom. Você não abandona as coisas pela metade ao primeiro sinal de crítica, não se assusta com a quantidade de fracassos do jogo de perde-perde-perde-empata-perde-ganha-perde-perde-empata que é a vida e não se espanta quando descobrir que não é interessante para 90% das pessoas do mundo, porque, não se engane, você não é.

Por isso mesmo, antes de ser Miss Universo, de tentar ganhar um Nobel ou um Pulitzer, de aparecer no BBB ou num programa sobre gente bizarra no Multishow, antes de estrelar uma peça na Broadway ou de achar que é o novo Camões dos poemas de pé quebrado, lembre-se de uma coisa: tente não ser chato.

Não ser chato. Esse é o target.

Tudo o que você queria ser

Postado em 26 de jul. de 2012 / Por Marcus Vinicius Nenhum comentário

O cinema certamente é uma das maiores diversões do mundo, ajuda a fugir da realidade, relaxa, distrai e, principalmente, é uma excelente solução para sair na companhia de um chato, já que você passa duas horas com ele, mas sem os assuntos dele.

Só que o cinema também traz problemas, como carteirinhas de estudante falsificadas, grupos de adolescentes de férias aos berros e aquela sensação que às vezes dá de que você será capaz de reproduzir na sua vida o que acabou de ver na tela.

Podem me chamar de machista (apesar de que não sou, ainda mais porque quero distância de qualquer coisa que envolva a palavra "macho"), mas as mulheres são mais susceptíveis a achar que poderão viver algum romance ou comédia romântica nas suas vidas do que homens a pensar que realmente um dia se tornarão o Rambo.

Por isso mesmo é tão fácil encontrar uma querendo fazer tipo. Como bancar aquela durona que conserta carro, pinta cerca, troca encanamento, não precisa de homem pra nada, joga bola, arrota, fala palavrão, igual aquelas mocinhas dos filmes do Vin Diesel. O problema é que nos filmes quando tiram o macacão cheio de graxa, elas são geralmente beldades dignas da capa da Vogue, e na vida real, bem, ela é você.

Não troca nem uma lâmpada, vive com saudade daquele ex-namorado que você terminou e depois se arrependeu e tem mais nojinho de graxa e lama do que um dos pôneis malditos.

Outro tipo que faz o maior sucesso é a excêntrica. Aquela nerd de óculos de aro grosso, que sabe tudo de programação ou então uma maluquinha que pinta quadros impressionistas em bisnagas de pão (estilo aqueles filmes de início de carreira do Leonardo DiCaprio ou alguma das personagens de "Garota Interrompida").

É sensível, diferente, meio feinha, cheia de trejeitos e tremiliques e que acredita na possibilidade real de um apocalipse zumbi ou invasão alienígena. Ela e só ela consegue ver alguma beleza naquele esquisito que filma formigas no pátio do colégio ou da faculdade.

Um magrelo estranho com cartola do Mágico de Oz, calça listrada de pijama e aparência de Jack Skellington.


Os dois se conhecem e iniciam um daqueles romances onde sobem em árvores para declarar amor a um grilo, bebem Grapette com dois canudos na mesma garrafa e escrevem poesias com carvão numa estátua de elefante na praça da pequena cidade onde moram.

Quando se revelam (ou sejam, tiram a roupa), ela é linda e gostosa, ele é lindo e gostoso e os dois são felizes para sempre mesmo com suas famílias sabe-se lá porque não aceitando aquele amor, já que não existe outra forma de um daqueles dois esquisitos desencalharem.

Bem, na realidade tanto você quando ele seriam apenas os góticos estranhos do colégio, já teriam caído na friendzone faz tempo e passariam os sábados jogando Playstation e comendo Cheetos.

O último tipo é um híbrido de dois muito parecidos: a malvada que fica boazinha e a boazinha idiota que fica esperta e vira uma destruidora de corações. Tanto um, quanto outro tão impossíveis de acontecer na vida real quanto seu namorado realmente descobrir que é o Rambo.

Uma é má, daquelas más de história infantil. Pisa na cabeça dos colegas de trabalho, trai o marido, ignora sinais vermelhos, sonega impostos, maltrata a secretária e tem um santuário dedicado ao Darth Vader escondido no armário.

De repente, seja por alguma epifania durante a visão de criancinhas brincando no parque, por alguma coisa que alguém diga e toque fundo naquele coração de pedra ou por medo de ir pra cadeia mesmo, a megera vira o Ghandi, promove a secretária e passa até a doar dinheiro para caridade.

O que acontece na vida real é que, se você for a secretária que acredita que conversões cinematográficas acontecem na vida real, é melhor não esquecer de buscar a roupa na lavanderia, senão vai levar 20 chibatadas no final do expediente e nem aquele cartãozinho do Smilingüido que você deixou na mesa dela de manhã vai te salvar.

Agora, se você for uma bobalhona achando que vai entrar para academia, tomar um banho de loja, ter lições de "como enlouquecer um homem só com o olhar e uma mordidinha nos lábios" e assim pisar naquele cara que sempre te ignorou e te tratou como se fosse um boneco do Ronald Mc Donald, esqueça.

É provável que você desista da academia depois de suas semanas, se afunde em dívidas no cartão, só compre roupas que depois não vai usar e que pensem que você está tendo um ataque epilético já que sua idéia de olhar sensual é piscar somente um olho enquanto enrola a língua tentando lamber os lábios e morder ao mesmo tempo.

E ainda que você consiga se tornar linda, gostosa, charmosa e vire pro sujeito e diga:

- Viu? Estou sensacional e você que me desprezou a vida toda? Como está?

Está arriscado ouvir como resposta:

- Eu ganhei na loteria e estou milionário.

É justamente por essas e outras que geralmente os filmes trazem aquele aviso no final: não tente fazer isso em casa.

Você não é

Postado em 24 de jul. de 2012 / Por Marcus Vinicius 1 Comentário


Sabe quando a gente é criança e coloca a fantasia do Homem Aranha e realmente se acha um super-herói? Então, criança fazer isso é legal, mas assim que você fica adulto é grande a chance de ganhar uma temporada no hospício caso continue pensando que pode saltar de um prédio para o outro usando uma luva que solta teias.

E longe de mim ser contra o sonho dos outros, muito pelo contrário, ainda mais porque "sonhar não custa nada" (mas também não funciona muito, senão custaria caro).

Só que existe uma grande diferença entre sonhar, planejar e ser um mala pretensioso. Já explico. 

Com o avanço dos computadores, dos dispositivos móveis, da conexão de internet, etc, tudo ficou mais fácil. Se antes era necessário um calígrafo para escrever letras bonitas e usar fontes diferentes, hoje basta um software qualquer.

Se antes era necessário estudar música, partituras, um monte de coisas que nem sei direito, hoje basta ser DJ. E pior, se antes você precisava pelo menos aprender a mexer nas pickups e fazer mixagens sensacionais, agora surgiu o DJ de YouTube, que passa o dia postando links de vídeos na internet e se acha grande entendedor de música por isso.

Vamos esclarecer uma coisa: não é.

Assim como usar o Instagram (mix de software e rede social para tirar fotos descoladinhas no celular) não te faz ser um fotógrafo. Vamos ser honestos: de um lado câmeras, lentes, filtros, tripés, às vezes até filmes e revelações. Do outros um celular, um programa comprado na App Store e um chato fotografando comida.

Tem ou não tem diferença?


É como achar que jogar Guitar Hero te faz realmente ser um astro do rock. Mas tudo bem, esse seria um caso mais parecido com o do adulto achando que é o Homem Aranha, mas e essas pessoas que copiam frases de páginas de citações e se acham intelectuais?

É foto com livro do Saramago na mão, 30 citações de Clarice Lispector e Caio Fernando Abreu por minuto e um repertório de assuntos pra conversar que não sai da trinca Novela-BBB-Capa-do-Meia-Hora.

Curiosamente são tantos casos que me fazem duvidar até do que anda sendo distribuído na água domiciliar por aí. O cara faz um Twitter, lança duas piadinhas estilo "pavê ou pacomê" e já se acha um verdadeiro gênio das frases curtas, um publicitário ainda que ainda não foi descoberto, um gênio do stand up comedy (como se esse estilo de comédia tivesse algum gênio).

Nesse mundo do "tudo fácil, faça você mesmo", basta uma Wikipédia pro cara se achar especialista em Filosofia e Ciência Política e um Google pra ele diagnosticar doenças e receitar remédios para a família toda. Se a Apple lançar algum aplicativo para neurocirurgiões tenho medo do Apocalipse Zumbi estar mais perto do que imaginamos.

Tudo isso, claro, é fruto do nosso mundo de aparências. No Facebook todo mundo age como se trabalhasse na Lufthansa. Porque, lógico, não basta passar a impressão de viajar o mundo inteiro o tempo todo, ainda precisa parecer uma aeromoça alemã.

É a versão mais nova daquelas velhas fotos na frente do espelho que faziam a festa no velho Orkut. Todo mundo modelo fotográfico, só que não.

Mas o pior é que o sujeito embarca nessas de brincadeira e daqui a pouco está querendo ditar regras, teorizar sobre o nada e dizer que "a foto de comida do outro é pior do que a dele", como se fosse especialista em alguma coisa.

Um verdadeiro chef de cozinha do Miojo.

E para esses caras, só a verdade salva. Tal qual o Homem Aranha doidão, é preciso chegar para os DJs de You Tube, fotógrafos de Instagram, intelectuais de sites de frases, modelos fotográficos de espelho do banheiro, gênios do Twitter e da Wikipédia e doutores do Hospital Google e dizer para cada um deles:

Não, você não é.

Nossa paciência agradece.

Ode ao dentista (ou não)

Postado em 19 de jul. de 2012 / Por Marcus Vinicius 4 Comentários

Se tem uma lembrança que permeia as memórias da minha infância é a das idas ao dentista. Sério, a menor possibilidade de ter que ir naquele consultório gerava em mim um grau de ansiedade que somente condenados à forca deviam sentir.

 Na minha cabeça de criança, eu chegava ali às 8:00 da manhã e só saía um mês depois. A vingança é que até hoje o pobre do dentista não deve se esquecer de mim também, já que eu começava a ser atendido sentado na cadeira e passava dali para a pia, para a mesa dele, o sofá da recepção e às vezes só conseguiam me capturar no elevador.

 
Eu falava, gritava, chorava, berrava e exibia toda a candura de um javali preso numa rede de caça. 

Um dia minha avó que sempre me levava disse que eu berrava mais do que o normal e, de repente, fiquei quieto. O que aconteceu é que eu cansei de lutar contra o sujeito e resolvi deixar que ele terminasse logo de arrancar meu cérebro através dos molares, mas ela - que só ouvia tudo sem ver - achou sinceramente que o sujeito tinha perdido a paciência e me dado uma paulada na cabeça.

 
 Se fosse eu no lugar dele, não sei não, mas acho que a paulada seria considerada.

 
Talvez seja por isso - para me redimir com os dentistas e para aplicar meus métodos de adestramento de clientes rebeldes - eu tenha resolvido cursar Odontologia. Por incrível que pareça, alguém que sempre teve horror de brocas, anestesias, sondas e até dos espelhinhos, resolveu ser dentista.

 Bem, isso e também porque era um caminho mais fácil para andar de branco e ser chamado de doutor sem ter que fazer medicina. O problema é que o recurso só funcionou até o dia em que, ainda no primeiro período da faculdade, me confundiram com um vendedor de cocada.

 - Quanto você faz duas cocadas e um quebra-queixo?

 Ali toda a fantasia caiu por terra.

 Um dentista é um mecânico, um engenheiro (constrói até pontes), um técnico, um médico, um psicólogo e até conselheiro matrimonial. Juro que já precisei interromper homens e mulheres no meio de uma cantilena sobre seus respectivos pares.

 - Ah, doutor, o Almeida não funciona mais...

 - Almeida seria seu carro?

 - Não, meu marido, ele não quer mais saber de fazer sex...

 Nesse momento eu interrompia já com a anestesia na mão, dizendo calmamente:

 - Agora a Senhora fica quietinha porque posso resvalar e esbarrar com a agulha no seu olho.



Pode parecer cruel, mas o trabalho do dentista implica em manter as pessoas de boca aberta e isso fica meio impossível se o sujeito simplesmente se recusa a parar de falar. Eles confundem o "abre a boca" com "nunca mais cale a sua boca".


Uma pergunta constante: o dentista se diverte causando medo nos outros com aquelas seringas, boticões e curetas? Resposta: pra quê mentir? Tem hora que é divertido mesmo, mas isso é apenas uma pequena vantagem no meio de tantas outras desvantagens.

 A Odontologia pode ser uma profissão ingrata. Você passa o dia olhando céus vermelhos (os da boca) e sentindo cheiros que só se comparam a um banheiro químico de micareta. Isso sem contar o desprazer em descobrir que o sujeito comeu frango no jantar, sem precisar que ele te conte.

 Fora isso, dentistas nunca são retratados com muito glamour no cinema e na TV. Quando não são torturadores tentando arrancar dentes e confissões, geralmente são maridos traídos, vítimas de sequestro, namorados sem graça e, difamação das difamações, ladrões de mulheres de náufragos, como naquele filme em que o Tom Hanks fica com o Wilson (uma bola de volei) e o Dr. Spalding, o dentista, fica com sua noiva.

 Existe o House, a Dra Grey do Grey's Anatomy, Jordan a médica legista, o pessoal do E.R. e nenhum dentista. Nem mesmo no CSI, nenhum. É ou não é uma ingratidão com quem passa a vida tapando buracos de cárie e removendo tártaro dos seus dentes?

 Aqueles sorrisos de Hollywood e do Mundo de Caras seriam dignos de filmes de zumbi sem os dentistas. No entanto, até zumbis têm seus 15 minutos de fama, enquanto dentistas ficam presos nos comerciais da Colgate.


Aliás, sempre tive essa dúvida: como pode 90% dos dentistas dizerem que a Colgate é melhor e 95% que é a Oral B? Matemática não é o forte desse pessoal.

 Talvez seja por isso que dentistas sempre reclamem que ganham pouco enquanto os pacientes sempre acham que pagam muito.

 Sem contar que o campo de trabalho de um dentista (a boca) é pequeno, úmido, escuro e de difícil acesso, o que o torna uma mistura de mineiro com proctologista e escultor de modelos em escala. No final, o cara fica meio cego, meio surdo (ou você acha que o barulho do "motorzinho" incomoda mais a você ou a quem ouve aquilo o dia todo?) e meio torto.


Por isso, agora que você já sabe como dentista sofre, quando encontrar com seu  por aí num shopping center, numa festa de casamento ou na praia, não tente a todo custo arrancar uma consulta de graça no meio da rua, apenas dê um sorriso para ele em agradecimento.

 De preferência sem alface no dente.

O Professor Pardal na boquinha da garrafa

Postado em 17 de jul. de 2012 / Por Marcus Vinicius Nenhum comentário

O ser humano é um mistério. Ninguém precisa de mim para chegar a esta conclusão, mas achei que ficaria legal começar um texto dizendo isso: o ser humano é um mistério.

Com certeza salpicamos nossa breve existência neste planeta com grandes e boas invenções. Seja a navegação, os aviões, o telefone, a internet - curiosamente todas invenções que tinham por objetivo levar alguém de alguma forma de um lugar a outro - nem tudo o que fizemos foi dispensável, inútil ou ridículo.

O relógio de pulso, a música clássica, o rock'n'roll, o jazz, o blues e tantos outros estilos, a pintura, as máquinas fotográficas, a medicina e até mesmo a internet, tudo isso poderá fazer com que alguma espécie futura e dotada de alguma inteligência que venha a habitar este planeta diga: até que esses caras não eram/são tão ruins.

Mas a começar pelo próprio uso que se deu à internet posteriormente (meio de difusão de pornografia barata e piadas cretinas) já fica demonstrado como nem tudo o que o homem inventou depõe a seu favor.

E o que dizer então das correntes por email? Pegue a foto de uma criança em Bangladesh, invente uma história terrível sobre traficantes de órgãos e sobre como aquela criança da foto vive há 3 anos sem os dois rins, o coração e um pulmão e meio e diga que se a pessoa que recebeu aquele email repassá-lo para mais 387 pessoas, aquela criança vai receber 10 dólares, um sundae e o seus órgãos de volta doados pelo Bill Gates.

Sério, uma invenção dessas (boatos e correntes por email), não orgulharia nem os babuínos, caso eles soubessem ler e escrever.


Outra coisa que jamais vou entender é a dinâmica de uma paquera. Pense se você hoje descobrisse que antes de você existiu uma espécie dotada de certa inteligência que tinha que fingir que não está afim do outro para mostrar que está afim.

Imagina se você descobrisse as regras sobre ligar no dia seguinte, ir no motel no primeiro encontro, decidir quem paga a conta e, mais tarde, resolver quem lava a louça e põe o lixo pra fora.

Agora imagina o que diriam dos hábitos de beleza femininos? Tirar a sobrancelha até não sobrar quase nada só pra depois pintar duas vírgulas da Nike em henna no meio da testa. Usar sapatos que machucam os pés junto com aqueles Band-Aids que deixam uma mistura de cola e poeira preta no calcanhar, ao invés de usar logo algo confortável. Comprar um vestido dois números menores e depois ficar avisando pra todo mundo de meia em meia hora que vai fazer dieta, ao invés de comprar logo um vestido com o seu número ou simplesmente começar logo a dieta sem ficar repetindo isso pra ninguém.

E nós, homens, que somos capazes de usar invenções feitas para a defesa pessoal (como armas e porretes) para, ao invés disso, atirar e bater uns nos outros com elas, tudo por causa de outra invenção que era pra ser uma diversão, como o futebol?


Sério. Olhando pra isso tudo, mesmo lembrando de Einstein, Rui Barbosa ou Cartier-Bresson, dá pra concluir que não somos lá uma espécie muito brilhante.

Senão fosse assim, como explicar buzinar freneticamente num engarrafamento, ainda que saibamos que nenhum carro à nossa frente vai sair dali voando só pra não ouvir aquele barulho? A tal espécie futura imaginária certamente pensaria "porque inventaram a buzina se não sabem usar?".

Agora, de todas as tosquices que inventamos como programas de auditório, ombreiras, pochetes, aquele alarme que berra "este carro está sendo roubado" e, claro, o despertador, li uma pessoa na internet outro dia descrevendo uma invenção que certamente escandalizaria qualquer espécie deste e de outros planetas:

Como alguém realmente pode achar que colocar uma garrafa no chão e inventar uma dança era uma boa idéia?

Sinceramente, nem a penicilina redime isso.

Vaga lembrança, mas só pro que não presta

Postado em 12 de jul. de 2012 / Por Marcus Vinicius 4 Comentários

O nosso cérebro é o maior sacana que existe.

Creio que não precisaria explicar nunca essa afirmação, já que todo ser humano vivo e que use o seu cérebro achará um bom motivo para concordar com isso. E de todas as sacanagens que ele pode fazer, ninguém está livre de pelo menos uma ou duas.

Seja a mania de gostar da pessoa errada, seja a tendência a torcer por aquele time de futebol que sempre termina o campeonato em segundo, por não saber dizer não, por nunca dizer sim, por aquela mania de dar três pulinhos antes de ligar a luz e quatro pulinhos antes de desligar, por curtir fazer sexo amarrado e bezuntado com manteiga de amendoim, pela preferência por strippers indianas, enfim, todas as suas esquisitices têm um único culpado: ele, seu cérebro, o sacana.

Mas dentre todas (e acredite, tenho muitas), sempre me intrigou a facilidade que o meu cérebro tem em aprender quase sempre o que eu seu portador - no caso eu - não gostaria que aprendesse e a dificuldade em armazenar dados que são essenciais.

Lembra quando sua mãe te dizia "você só aprende o que não presta"? Bom, a minha dizia isso "a lot". Piadas do disco inteiro do Costinha, escalações de times de futebol, fases de um video game, a letra de Faroeste Caboclo, tudo isso entrava na minha cabeça com a maior facilidade, mesmo que eu estivesse distraído vendo desenho na TV.

Já fórmulas de física, equações de matemática e elementos da tabela periódica, nem com aula particular reforçada sete vezes por semana.


Sua senha do banco, o número do seu CPF, telefones importantes, pense no esforço e nas repetições que foram necessários para finalmente ficarem memorizados. Agora pense naquela letra de funk que você odeia, naquele axé que repete coisas como "oi-oi-oi" ou "ai-ai-ai" 300 vezes, ou mesmo na musiquinha dos pôneis malditos e me diga se não concorda que o seu cérebro é um pilantra.
 
Acontece o mesmo com fisionomias e outras lembranças como o nome da primeira professora, aquele lugar que você almoçou em Paris há 10 anos ou se a pintinha no seio da sua namorada de adolescência era do lado esquerdo ou direito.
 
Mas coisas trágicas, nojentas, asquerosas ou desnecessárias, essas ficam gravadas na mente e na sua retina como se fossem esculpidas em granito. Seja onde você estava quando as torres gêmeas caíram, aquele vídeo "2 Girls 1 Cup" (se você não sabe o que é isso tente visualizar em sorvete de cocô) ou mesmo quando vomitaram no seu pé na festa de formatura. Nada disso sai da sua cabeça, já percebeu?

Você esquece de pagar a conta do telefone (só lembra quando cortam sua internet), esquece o celular na casa da namorada (e só lembra que não apagou o histórico dos SMS quando já está em casa, na cama, antes de passar a noite acordado fazendo promessas e simpatias pra "Fada do Celular Queima-Filme Perdido"), mas garanto que você não consegue esquecer aquele bordão ridículo de um programa de humor qualquer, ainda que repetir coisas como "iça negão" constantemente esteja destruindo a sua vida social.

Tudo bem que se todo mundo pudesse decorar o acerto da Galleria degli Uffize ou absorver as conjecturas de Poincaré como quem toma um copo de Coca-Cola, o mundo só teria gênios e seria chato pra cacete, mas bem que o cérebro podia ser um pouco menos sacana.

Em todo caso, fico feliz que o meu problema seja só decorar coisas inúteis e não conseguir lembrar do que eu preciso, porque vai que pra me sacanear o meu cérebro me obrigasse a curtir transar numa piscina de macarrão, assistir "Fala que eu te escuto" ou ser o tio do "pavê ou pacomê".

Romantismo: teoria e prática

Postado em 10 de jul. de 2012 / Por Marcus Vinicius 5 Comentários

Quase todo mundo já se emocionou com alguma cena romântica. Seja numa dessas comédias água com açúcar, num filme épico de batalhas e amores sofridos, em novelas, romances, sempre aparece um gesto grandioso, uma atitude fofa, uma declaração efusiva que faz a pessoa pensar "porque não acontece comigo?" (se você nunca passou por isso convém fazer um exame de DNA para ver se não é parente da Miranda Priestly ou do Darth Vader).
E a resposta para a sua pergunta é: porque você não iria querer. Simples assim. Você não iria querer de verdade aquilo.
Afinal, pense bem: você no seu emprego, atolado entre planilhas de Excel e ligações pro fornecedor que atrasou a entrega do papel ofício e, de repente, entram no seu escritório um palhaço, um duende, um burro, um pipoqueiro, um vendedor de algodão doce e 20 mulatas do Sargentelli cantando ao som da bateria do Salgueiro "êêêê, a Luciana ama muito você!".
Numa comédia com o Adam Sandler isso termina em sorrisos, beijos e aplausos dos seus amigos do trabalho. Na vida real isso termina com você se explicando no RH, terminando o namoro por SMS e ostentando para sempre o apelido de "Mc Dia Feliz".
Você pode ter achado o maior barato um cara parando tudo durante uma perseguição de zumbis para declarar o amor pela namorada, tendo o cuidado de procurar uma rosa num canteiro para dar para ela de presente enquanto estoura um cérebro de um morto-vivo e declama Shakespeare, mas tenho certeza de que na eventualidade de um apocalipse zumbi, você iria querer mesmo é estar ao lado do Rambo e não do Romeu. 
Conheci uma menina que arrumou um admirador. O cara sempre a cumprimentava no elevador até que se apresentaram, disseram onde trabalham, essas coisas. Tentando impressionar a garota, ele teve a brilhante idéia (possivelmente retirada de algum filme) de mandar flores de hora em hora com um convite para o cinema mais tarde. 
Na primeira hora ela achou lindo, na segunda hora ela achou legal, na terceira hora ela pensou que ele tinha TOC porque o cartão vinha sempre com a mesma coisa escrita "cinema mais tarde?" e depois da sétima hora ela já estava ligando para a delegacia anti-sequestro, com medo de terminar em algum episódio do CSI. 
O fato é que não sabemos lidar com essa coisa de romantismo dramático. Romeu e Julieta nos tempos de hoje e na vida real seriam considerados uns chatos. Imagina você no motel com a menina, querendo arrancar a calcinha dela com os dentes (ou você com seu namorado no motel, querendo que ele arranque a sua calcinha com os dentes) e tendo que parar para recitar que "rosas são vermelhas, violetas são azuis...". Não rola.
Parece que fomos programados para não exagerar na dose do romantismo. Uma dúzia de rosas, o cara é romântico. Duas dúzias de rosas, ele quer impressionar. Três dúzias, tudo bem, ele é meio esquisito. Dez dúzias, por favor, alguém me empreste uma escopeta.
Se quer te ver todo dia, é grudento. Se só quer te ver no final de semana, é distante. Se quer dormir depois do sexo, é um animal que só quer te usar. Se fica conversando horas depois do sexo, é um pentelho que não te deixa dormir depois de te comer. Se você se abre demais, curte uma discussão de relação e quer usar o outro como analista. Se não se abre é uma geladeira insensível que deixa o outro tateando no escuro. 
Como podem perceber, a linha é tênue, mas ela nunca favorece alguém que manda uma trupe de palhaços para apresentar uma mensagem ao vivo no escritório do outro.
Fica a dica.

O torcedor compulsivo

Postado em 5 de jul. de 2012 / Por Marcus Vinicius Nenhum comentário

Se existe uma coisa que eu nunca entendi bem é porque tem gente que acha que é obrigatório torcer para algum dos lados em qualquer esporte que assista. Se for pelo Brasil então, eu acho digno de entrar em livro de psicologia.

Porque é normal (em parte) pintar a rua numa Copa do Mundo, ir para a frente da TV, acordar de madrugada se o jogo for na Ásia ou matar o trabalho se for na Europa, mas o futebol é nada mais, nada menos que o esporte mais popular do mundo. Seria degeneração moral não escolher um lado pra torcer num elenco desses.

Sempre me pergunto quem em sã consciência (tirando a pessoa que pratica o mesmo esporte), acorda de madrugada para acompanhar uma partida de tênis de mesa, uma regata de remo, um torneio de totó. E por mais estranho que seja, tem gente que acha que é obrigação torcer pelo Brasil em tudo, até em disputa de par ou ímpar.

E se o patriotismo é o último refúgio do canalha, o patriotismo esportivo geralmente é o último esconderijo do cretino.

Mas deixando isso de lado, tem um cretino torcedor ainda pior: aquele que torce por qualquer coisa em qualquer competição. Esse sujeito vai torcer por alguma escola de samba em cada cidade do Brasil, por um dos dois bois de Parintins, por banda de colégio em concurso de fanfarra, por candidata a miss, faz fã-clube de Big Brother, enfia spam de candidato em ano de eleição e, lógico, possui um time em cada esporte de cada canto do mundo.


E antes que alguém pense que isso é fruto da minha imaginação, conheço alguns assim.

Outro dia abri meu Facebook e estava lá uma mensagem dele: "Chupa New York Yankees!". Tudo bem que, sei lá onde houver um rival dos Yankees isso seja compreensível, mas num Facebook cheio de amigos brasileiros que confundem basebol com queimada seria mesmo necessário?

Gente assim não consegue simplesmente gostar de algo, precisa torcer.

A cerveja predileta é a melhor, quem não bebe é trouxa. A comida predileta é a número um do mundo, quem não gosta é pela saco. O video-game que ele joga é simplesmente o mais foda de todos, quem joga outro é um loser. No final tudo vira uma decisão. "Mc Donald's ou Burger King?", "Fla ou Flu?", "Dallas Cowboys ou New England Patriots?".

Desconfio que esses caras torcem por alguém até no Campeonato Turco de Luta no Óleo (acredite, isso existe).

Esse pessoal tem uma paixão especial pela Fórmula 1, já que o "papa" dos torcedores de tudo narra suas corridas. Já perceberam como o Galvão Bueno entende de tudo? Ele sabe a hora de frear o carro, como se parece o mundo do alto de uma enterrada na cesta, com quantos dedos se faz um bloqueio, quantas braçadas são necessárias para o recorde dos 50 metros.

Mas o Galvão pelo menos ganha (bem) para ser chato. O torcedor compulsivo faz isso tudo de graça, ainda que você provavelmente até pagasse pra se ver livre dele, se pudesse.

Desconfio que todos eles foram vuvuzelas em outra encarnação.

Para todas as outras coisas, existe Hitler Card

Postado em 3 de jul. de 2012 / Por Marcus Vinicius Nenhum comentário

Sacar Adolf Hitler como se fosse um coelho da cartola para tentar vencer uma discussão é conhecido por aí como "Reductio ad Hitlerum", merecendo até um verbete na Wikipédia.

Não é nem algo muito raro, pelo contrário, basta algum debate sobre cotas raciais, liberação da maconha, Fla x Flu ou mesmo a melhor marca de camisinha disponível no mercado que logo aparece um esperto dizendo:

- Você só acha isso porque é nazista.

A partir daí são esquecidos os prós e contras, os testes do Inmetro que comprovam que a Olla é tão boa quanto a Jontex e tudo se resume a alguém repetindo que não é nazista enquanto a outra pessoa continua martelando sem parar "aposto que você até já leu Mein Kampf".

E como todo hábito chato, todas as pessoas terminam repetindo e passando adiante, portanto se você ainda não se deparou com isso, não se desespere, não demora muito e alguém vai te chamar de Goebbels ou Adolf.

Já imaginei situações como alguém tentando renegociar uma dívida do cartão de crédito e dizendo pra atendente do outro lado da linha:

- Vocês só me cobram 25% de taxa no rotativo porque são uns nazistas, aposto que ao invés de apostilas de telemarketing vocês lêem Mein Kampf aí...

- Mein o que?

- A bíblia nazista...

- Tá bom, 1,5% de juros e você não me chama mais de nazista, tudo bem?


Se você chega numa garota na boate e ela te dá um fora, solte logo: "nazi!", não importa nem se ela é filha de judia com ciganos. Se você não consegue um aumento de salário, diga para o seu chefe "agora só falta me mandarem para uma câmara de gás" ou se você levar uma multa no trânsito, escreva no recurso "se pelo menos aquele guarda não fosse fã de Göring...".

Com flanelinhas não adianta muito apelar pra isso, senão periga você terminar com um sujeito te perguntando "Hitru? Que isso?".

Um bom uso disso é na aplicação de regras para seus filhos, basta dizer algo como "Sabia que Hitler também não comia o espinafre?" na mesa do jantar. E também no seu escritório, colando uma placa no banheiro com os dizeres: "nos campos de concentração eles também eram obrigados a desentupir vasos depois que jogavam absorventes ali".

Você pode se aproveitar disso até para se ver livre de tarefas chatas, como por exemplo em "sou contra planilhas de Excel porque me lembram da Lista de Schindler";

O recurso funciona tão bem que tem até uma tirinha do Dilbert onde um personagem diz que vence qualquer debate na internet apenas perguntando "como você se sentiria se Hitler tivesse matado você?", o que, se pensarmos bem, é realmente um ippon argumentativo, um desses golpes perfeitos onde um judoca desmonta o outro (ou não):

- Se for a vista eu tenho desconto?

- Não, meu chapa, esse preço aí já está tão baixo que eu praticamente não vou ganhar nada.

- Você só diz isso porque Hitler não te matou.

- Tudo bem, te dou desconto , mas só se você aceitar troco em Stalins.
 
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