Cuidado ao ceder seu lugar

Postado em 30 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 9 Comentários

Estou sentado no metrô e aparece um cara na minha frente de cabelos brancos, idade pra ser, sei lá, meu pai, não está caquético, mas também não é mais nenhum garotão. Todo mundo sentado, o trem sacudindo e de vez em quando dando aquelas freadas bruscas que jogam todo mundo pra frente e, durante um dos solavancos, a dúvida me assalta: ofereço meu lugar pro sujeito ou não?

Começo a analisá-lo minunciosamente. Os cabelos brancos não são a totalidade mas já podem ganhar uma eleição no primeiro turno, a pasta de couro denuncia alguém que já trabalhava na época em que ainda se usavam pastas de couro, pinta de quem foi em algum festival da canção e conheceu a "Passeata dos 100 mil" fora dos livros escolares, jornal do dia embaixo do braço (quem ainda lê o jornal da manhã de noite em casa?).

Mas por outro lado o sujeito é daqueles coroas saudáveis, sabe como é? Não tem quase barriga, nota-se que faz alguma atividade física além de colocar o lixo pra fora e levantar copos, o relógio é moderninho, o corte de cabelo é meio arrepiado estilo ditador norte-coreano, talvez até seja ex-militar.

O que fazer numa situação dessas? Se eu ofereço o lugar corro o risco de ofender o homem "tá me chamando de velho?", se não ofereço continuo a ser olhado com ares de reprovação pela gorda que está sentada no banco exatamente à minha frente.


Porque sinceramente, quem gosta de envelhecer? Não falo de se conformar, de chamar isso de "melhor idade", falo de gostar mesmo. Imagina, você tem seus cinquenta e tantos, malha todo dia, pinta algumas partes do cabelo pra continuar pelo menos grisalho, usa umas roupas mais estilosas, paga 100 reais pra bicha do salão fazer um corte mais moderninho, está de olho na mocinha bunduda que te deu umas três olhadas no metrô sem saber se ela olhou dando mole ou achando que você é um "velho tarado" e de repente um garotão levanta e oferece o lugar dele pra você sentar, te fazendo sentir como se tivesse uns 93 anos.

É até gentil, mas ainda assim te ofende. É quase como você não ter a menor noção de como programar o despertador do celular e sua sobrinha de 8 anos tomá-lo da sua mão e ajustar o alarme em exatos 27 segundos, te dizendo em seguida "pô, isso é mole, tio".

Fico sempre na dúvida se vou me levantar pra pessoa sentar e ouvir algo como "Fique sabendo que eu pego onda todo final de semana e tenho uma barriga menor do que a sua" ou então "Acha que não consigo ficar em pé num metrô? Então te desafio pra uma corrida de 10km no dia, hora e local que você escolher".

Por isso desenvolvi um coeficiente: se não parecer que vai cair no chão com um sopro, não ofereço lugar pra pessoa.

Outro perigo dessa coisa de oferecer o lugar é a "mulher grávida". Você levanta, ela senta, você educadamente pergunta pra quando é o bebê e como resposta recebe uma bolsada na cabeça e, entre choro contido e gritinhos abafados, escuta algo como:

- Seu nojento, fique sabendo que já estou de dieta, viu?

Carros velhos

Postado em 29 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 10 Comentários

Não adianta tentar fugir dessa regra: a vida é feita de épocas. Não estou falando do enganador passar dos anos, que transforma décadas em uma piscadela de olho, mas de experiências e rotinas que vivemos sem nos dar conta que um dia podem passar, mudar, terminar.

Quem nunca teve o "seu" bar, a "nossa" boate, o "nosso" dia da semana? Tudo isso nos esperando como se estivessem ali para sempre, parte do nosso direito adquirido de não se espantar com a passagem do tempo.

Amigos são coincidências ainda que momentâneas. São feitos de piadas internas, de troca de olhares, de defesas de território contra forasteiros, de desentendimentos. Amigos são reuniões em casa, é você levando cerveja e fulaninho levando a barriga vazia, e enquanto houver amizade isso provavelmente não será um problema, afinal, amigos são risadas.

E amigos também são dias de sol (ou de chuva, o que você preferir), que mudam assim de repente, num breve abrir de janelas. Um dia estão ali e no outro não estão mais.


Não porque não sejam amigos verdadeiros, entenda, não existe amizade falsa, existe amizade breve. Se por um segundo existiu, já foi verdadeira e isso nos confunde, porque nestes tempos velozes, as amizades são cada vez mais breves, substituídas como um pneu de carro furado, como roupa que saiu de moda.

Nossa estranheza é porque nos ensinaram que amizade verdadeira é que nem carro antigo. É um Fusca com câmara de ar, uma espécie de sandálias Havaianas que não deformam, não soltam as tiras e resistem às modas e aos verões.

Mas nem sempre são assim. Esses seres perenes são os tais "melhores amigos", que parecem mais com aqueles velhos carros cubanos, ultrapassados para o conceito atual, mas fiéis, que seguem trabalhando teimosamente. Melhor amigo para ser de verdade não pode ser mais do que um (pode até mudar esse um com o tempo, mas tem que ser um). E este um não faz os outros serem menos verdadeiros, apenas mais breves.

Nestes tempos modernos os amigos são trocados mais ou menos como fazemos o upgrade de um 3G pra um 3GS e logo em seguida para um 4. Impressionante foi ainda não ter acontecido nenhum keynote do Steve Jobs anunciando um novo sistema operacional para as amizades.

Quando tudo vai bem, quando tudo ainda é feito de descobertas - saído da caixa, com o manual ainda intacto - achamos que nunca mais vai acabar, até quando acordamos e vemos que o tempo passa e que não temos mais aquilo, que não nos temos mais, que alguma coisa ficou obsoleta. Hora de trocar.

Amizades modernas são isso aí. Perecíveis que nem iogurte, mais candidatas à obsolência do que um iPhone.

Somos todos fotografias sendo postas em milhares de álbuns de recordações individuais. Cada um tem o seu, cada um está por aí no de mais um monte de gente. Vivemos ali eternamente, iguais, presos  naquele tempo - breve ou não - em que fomos a rotina dos outros, pra só sair de vez em quando naqueles encontros acidentais em alguma calçada ou corredor de shopping center, quando perguntamos uns aos outros se "temos visto o pessoal" e nos despedimos prometendo tentar "reviver" os velhos tempos, mesmo tendo a certeza de que só outro esbarrão acidental tornaria isso possível.

Estamos mentindo? Não. Apenas nos comprometendo a dar uma breve olhadinha no nosso álbum.

Não dizem que recordar é viver?

Malditas elites!

Postado em 26 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 23 Comentários

Imagine uma cena: alguém está caminhando na rua voltando da praia, está descalço e anda apressadamente porque o chão está quente, de repente o chão fica mais quente ainda e curiosamente mais mole, a pessoa olha pra baixo e constata que atolou o pé num monte de bosta de cachorro.

Muito bem, na cabeça do Brasil "progressista", "humanista" e "gente boa" essa cena tem duas explicações possíveis. Se a pessoa que atolou o pé na m* for um flanelinha que estava tomando conta de carros - leia-se: extorquindo proprietários de veículos - o monte de merda só pode ser de algum cachorro de madame insensível (prepare-se, essa palavra vai aparecer muito neste texto), que mora num prédio chique e acha que as calçadas são banheiros do seu totó que escandalosamente deve ser mais bem tratado do que muita criança pobre e que não liga para o sofrimento do povão, que é obrigado a andar descalço porque não pode comprar um sapato.

Porém, se quem pisou na bosta for uma patricinha moradora de um prédio de "classe média" e ela reclamar, com certeza o cachorro deve ser algum vira-latas de um "menino de rua", que não tem nada na vida além da companhia do doce cachorrinho, e a cena serve pra mostrar como a mocinha é insensível porque acha que o seu "pé da elite" não pode pisar na merda de um cachorro de alguém do "povo" e, claro,  é bem feito que tenha acontecido isso para ela ter noção da realidade.

Pensei nessa historinha no dia em que disse no Twitter que estava acompanhando a passeata de militantes de José Serra durante a campanha eleitoral, e inocentemente me referi a eles como "gente do bem", me aproveitando do slogan da campanha "Serra é do bem". Pra que!? Bastou que eu dissesse isso que logo veio uma "progressista", "humanista" e "gente boa" me repreender: "gente do bem não, gente de bens".

Digamos que só estivessem presentes ali milionários que chegaram de helicóptero - o que obviamente é apenas um exagero meu, mas que fosse - por acaso essas pessoas teriam menos direito de expor suas opiniões e preferências políticas?


Lembro disso também quando ouço qualquer discussão sobre o estado de caos, desordem e violência em que o Rio de Janeiro encontra-se permanentemente afundado. Entre todos os bordões esquerdóides dignos de um vômito como "favela não é problema, é solução", "isso só incomoda quando afeta a elite" ou então "bandidos mesmo são os de gravata", os que mais me enojam são especialmente dois: "quero ver invadir condomínio de rico" e "é bom pra essa classe média insensível ver a realidade".

Acho isso tudo incrível porque quem diz isso deve morar em outro lugar que não o Rio de Janeiro, onde a "realidade" infesta os morros de barracos, as ruas de flanelinhas, camelôs, pivetes, mendigos, uma cidade que se inunda de "realidade" em cada chuva pesada que cai, em cada transporte coletivo medíocre que oferece aos seus habitantes, em cada quilômetro de engarrafamento infernal, enfim, essas pessoas dizem isso como se a tal "realidade" não batesse diariamente à porta das pessoas, independente delas quererem vê-la ou não.

Quem vive no Brasil convive com pobreza, miséria, feiúra, impotência diante de absurdos variados o tempo todo, mas só quem reclama disso são pessoas de "bens".

Aliás, só quem é rico e não é "insensível" na cabeça dessa gente são os traficantes do morro - cheios de dinheiro por conta da venda do pó - esses são "vítimas" da "insensibilidade" (eu avisei que a palavra apareceria ad nauseam) da "classe média" que os esqueceu.

Incrível também que a "elite insensível" seja aquela que pague os impostos mais altos do mundo, taxas imorais, cobranças em cascata, sem receber nada em troca, e ainda assim seja sacudida de cabeça pra baixo de tempos em tempos para "fazer sua parte" e doar mais, mais, mais em "Crianças Esperanças", "Teletons" e outras campanhas do gênero.

Com tudo isso, esta ainda é a parcela da sociedade a quem é negado até mesmo o direito de se indignar, de se expressar, de exigir algum direito.

Pra ser "bom" no Brasil, pelo menos na visão da turma "progressista", que chama ironicamente os que discordam deles de "elite" e "gente cheirosa", você precisa gostar do fedor, da feiúra, de pisar na merda ou pelo menos aturar tudo isso quieto, não esquecendo de pagar a conta, é claro.

Querer remover favelas é "higienismo", combater a mendicância é "eugenia", não ficar satisfeito com a festa da ilegalidade de camelôs, flanelinhas, vans et caterva é ser "contra pobre", pretender que seus impostos vão para algo além de um imenso buraco negro de ineficiência estatal e assistencialismo barato é ser "insensível".

Uma pessoa que queira uma cidade limpa, bonita e livre de pragas urbanas é ruim. Quem gosta (ou finge que gosta) de viver num lixão a céu aberto que mais parece cenário de um daqueles filmes "Mad Max" é bom.

Tem quem defenda tudo, desde que "traficante também tem família pra sustentar" até maconheiros "do bem", e também faveleiros profissionais, pobristas que lucram com a miséria que dizem combater e, claro, políticos que tem um belíssimo curral eleitoral nessas zonas de desordem e ausência de condições reais de dignidade.

E tome urbanização, teleférico, bolsa isso e bolsa aquilo. Tudo claro financiado pelo bolso dos outros.

Progressista que se preza precisa de pobre pra distribuir cupom, de favela - de preferência bem suja e feia - para poder mostrar como admira a "criatividade" que existe naquilo e que por isso é moralmente superior aos outros, de caos urbano para poder requisitar mais uma verbazinha para criar alguma "comissão" para "ordenar" as "atividades" e de preferência terminar criando algum sindicato, tipo de guardadores de automóveis, de camelôs, de vans e até de vendedores de bala em ônibus.

Essa coisa do governo proporcionar às pessoas maneiras delas melhorarem de vida por conta própria, de cidades limpas e bonitas, calçadas livres, isso tudo é coisa de direita.

Com toda essa onda de leis anti "homofobia", "racismo", "xenofobia" e o escambau, bem que poderiam criar uma lei contra a "classe-médio-fobia".

Sabe como é, essa gente branca (ou quase), hetero, trabalhadora, pagadora de impostos, que não recebe nada de ninguém, que não conta com ninguém além de si próprio e que ainda por cima não tem nenhuma ONG que a defenda.

Jovem, ao completar 18 anos, aliste-se!

Postado em 25 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 8 Comentários

Lembro que conhecer Manaus nos anos 90 foi uma experiência transcedental para mim. Nada a ver com os povos da floresta, a beleza da fauna, o mistério do boto cor-de-rosa ou o santo daime e sim com uma ida à boate do hotel Tropical, que naquela época era a mais frequentada da cidade.

Quando entrei na tal boate após pagar escorchantes R$50,00 de entrada, avistei algo que só poderia ser uma miragem aos olhos de um carioca: a pista de dança estava repleta de mulheres. Mas note, não era coisa de 10, 20 mulheres, eram umas 100, 200, sei lá, a minha visão chegou a ficar turva de tanta emoção ao perceber que existia um lugar no mundo onde boate não significasse um lugar infestado de valetes por todo lado.

Porque sair na noite do Rio de Janeiro é mais ou menos comparável a fazer alistamento num quartel do exército.

Não sei se é algo que colocam na água, se é algum tipo de controle pré-natal, mas a quantidade de homens em qualquer bar, boate ou similar nas terras cariocas é muito acima do aceitável para qualquer pessoa que não curta...homens.

No Rio paga-se preços igualmente escorchantes pelo simples direito de colocar sua carcaça para a parte de dentro da porta. Poucos lugares convertem isso em consumação e, quando o fazem, uma garrafinha de cerveja custa uns R$15,00. Mas essa nem seria a parte mais crítica se não fosse a imensa quantidade de machos povoando qualquer um desses lugares.

O cenário típico de uma boate por aqui é simples: 70% da frequência será masculina. Ali estarão os tipos básicos de qualquer noite carioca. Desde aqueles amigos que passaram a tarde jogando playstation e resolveram sair para tentar a sorte, já sabendo que a probabilidade de comer alguém é tão grande quanto a de zerar um jogo com 970 fases em uma hora até a ex-gostosa que virou meio baranga e terminará a noite bêbada e esquecida numa poltrona.


Outros habitantes da fauna são os sempre presentes lutadores de jiu-jitsu ou brutamontes similares. Estes podem ser namorados de alguma garota linda, coxuda e toda malhada, que vai desfilar na frente dos outros  homens que não são seu namorado torcendo para que eles olhem para ela por mais de 2 segundos, que é o prazo que o brutamontes que ela namora acha aceitável antes de cobrir o cara de porrada.

Os demais - que estão solteiros - passarão a noite puxando as poucas mulheres que sobram pelo braço e tentando beijar cada uma delas na marra, inclusive a namoradinha daquele estudante de arquitetura que tem um blog de quadrinhos e só foi na boate porque a namorada disse pra ele uma das frases mais amedrontadoras que existem depois de "precisamos conversar", que é "quero sair pra dançar".

Ele vai ficar puto porque os caras mexeram com a namorada dele, vai brigar com ela dizendo algo como "eu avisei que sair pra boate sempre dá merda", mas após rápidos cálculos vai concluir que é melhor levar o desaforo pra casa do que deixar sua dignidade estirada junto com ele no chão da boate.

Das (poucas) mulheres presentes, além da namorada do lutador de jiu-jitsu, da ex-gostosa que virou baranga e da namoradinha do estudante de arquitetura, você encontrará a patricinha que namora algum gringo e passa a noite inteira dizendo como a noite londrina é muito melhor do que aqui nessa roça que é o Brasil, as gostosas de academia - que tem como parâmetros de homem ideal características como abdomen, carro e cartão de crédito - e que vão te olhar como se você tivesse alguma espécie de lepra se você falar qualquer coisa com elas desde "Prazer, meu nome é fulano" até "pode me dizer onde fica a saída?", e um grupinho de amigas de faculdade - com grau de beleza que vai do "até que pego" ao "não pego nem de porrada"- que realmente "saiu pra dançar" e que definitivamente não vão dar mole pra você (a menos que você seja um dos brutamontes solteiros, de braço forte e peitoral definido que vão ficar com elas depois de uma resistência-fake inicial ao agarrão deles).

Óbvio que existe aquela mina maneira, que sai pra se divertir e ver no que vai dar a noite, e está aberta a ficar com um cara de papo legal, mas o problema é descobrir em qual lugar ela estará naquela noite específica. Provavelmente você já esbarrou em alguma delas na sua vida, lembra? Foi aquele dia que você saiu num sábado e se deu bem.

Desde a Lapa até as boates mais caras da Zona Sul, o normal no Rio de Janeiro será esse quadro de maioria masculina avassaladora, uma espécie de garimpo (esqueça o ouro, pense apenas naquele monte de homens) e que para qualquer cara comum terminará em uma das três alternativas:

- Você pegando a ex-gostosa que virou baranga e que está esquecida no sofá e só ficará contigo porque está bêbada demais e precisa de uma carona.

- Você comendo um cachorro-quente numa Kombi de esquina.

- Você e seus amigos procurando uma boate de strip para no dia seguinte poder dizer sem mentir: ontem vi uma mulher pelada.

Se você quiser um destino melhor, conselho de amigo: viaje para Manaus ou então se aliste no exército, porque agora estão aceitando mulher por lá e logo eles passam as boates do Rio.

Mentir às vezes dá a maior m*

Postado em 24 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 5 Comentários

Mentir algumas vezes é necessário. Não adianta vir me dar lição de moral e dizer que "nunca mentiu na vida" porque ao fazer isso você já corre o sério risco de estar mentindo. Nem sempre a verdade é bem vinda e quem passa a vida só distribuindo verdades, termina colecionando um monte de inimigos, caso contrário, ninguém diria que "a verdade dói" e sim que "a verdade é uma fofa" ou algo do gênero.

Mas algumas vezes a mentira é totalmente desnecessária. E é nessas ocasiões que ela resolve virar um monstro de sete cabeças impossível de controlar. A coisa toma proporções inimagináveis e você se vê compelido a admitir que pelo menos daquela vez era melhor ter dito a verdade para variar.

Por exemplo: você foi conhecer a família da sua nova namorada, é um jantar de aniversário de 80 anos da avó dela, entre diversos ítens do menu eles resolvem servir ostras. Você adora ostras, mas também tem um probleminha com ostras: elas te dão uma baita dor de barriga.

Mas você come, afinal você está empolgado com a recepção calorosa de todos, com o whisky 12 anos que seu novo sogro te ofereceu e com o decote "te pego mais tarde" que sua namorada está usando. Tudo pra ser uma noite perfeita, exceto pelo fato de que você não combinou isso com a sua barriga.

De repente começa a sentir aquelas cólicas horrorosas e a discretamente procurar um banheiro. Encontra um pequeno lavabo. Senta, cuida do seu problema e se não fosse o pequeno detalhe da falta do papel higiênico tudo estaria resolvido.

Mas olhando pro lado você percebe uma revista Caras abandonada. Qual utilidade melhor para aquela revista do que substituir o "Neve"? Usa o oitavo casamento da Deborah Secco, o décimo namorado imberbe da Susana Vieira e mais uns dois ou três personagens da Ilha de Caras pra se limpar e acha que tudo não poderia correr melhor.
 Até que tenta dar descarga e percebe que está quebrada.

Nesse ponto você ouve as pessoas perguntarem por você, já que é hora do "parabéns" da vovó.

Vê uma latinha de lixo e resolve enche-la com água da pia para improvisar a descarga.

De repente sua namorada bate na porta, perguntando se você está lá. Você responde que sim, que está passando um pouco mal, mas que já sai dali.

E ela:

- Passando mal de que?

Aqui o universo da mentira te prega uma peça. Dizer que está indisposto é o código para "caganeira" e você não quer ela visualizando uma cena dessas. Então fala a primeira lorota que vem à cabeça:

- Pressão baixa, de vez em quando eu tenho isso, entrei pra lavar o rosto...

O que você não contava é que o avô dela - o falecido marido da vovózinha - também tinha pressão baixa e morreu justamente ao desmaiar num banheiro e bater com a cabeça. Nessa hora você ouve a voz do pai dela perguntando:

- O aconteceu, minha filha?

- Ele tá com pressão baixa...

- Xiiii, lembra do seu avô?

E de repente a família dela inteira está na porta, esperando ansiosamente você sair. O baldinho não está funcionando, mas você continua tentando desfazer toda aquela merda que literalmente você aprontou.

- Calma aí, já vou sair...

- Sai logo rapaz, é hora do parabéns, vem aqui que a gente coloca um sal debaixo da sua língua e fica tudo bem...

Só que a festa toda parou por sua causa,  a avó começa a ter falta de ar revivendo o dia em que ficou viúva, os tios cogitam arrombar a porta pra te tirar lá de dentro "E se ele não estiver conseguindo sair?", os primos adolescentes se olham rindo, lembrando que também passam horas trancafiados no banheiro e inventam de tudo pra ficar ali e você com as calças arriadas, tentando dar descarga num banheiro quebrado usando uma lixeirinha finalmente entende que nesse caso - e talvez só nesse caso - era melhor ter dito a verdade.

Porque uma mentirinha boba de vez em quando termina na maior cagada.

O super ex

Postado em 22 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 11 Comentários

Qualquer pessoa que já esteve em um relacionamento com outra pessoa que também já esteve em um relacionamento - eliminamos assim os primeiros beijos, primeiras transas, primeiros amores, primeiras separações, primeiras dores-de-corno - sabe que o seu (sua) atual possui pelo menos um desses seres misteriosos, amedrontadores e cheios de super-poderes: o (a) ex.

Uma mistura de bicho-papão com super-herói. Não importa o quanto você seja bom, na sua cabeça ele sempre será melhor. Não é que ele(ela) seja realmente melhor do que você, mas é que o diabo visto de longe sempre parece mais bem apessoado.

Qualquer um que já pegou o celular, bêbado, no meio da magrugada para tentar reatar com aquela ex-namorada neurótica, brigona, geniosa e que transformou seis meses da sua vida num inferno sabe do que eu estou falando: a distância e o tempo tornam tudo menos pior do que era na verdade.

E por saber disso, o medo dos "ex" geralmente ronda nossa cabeça. Afinal, é o nosso ronco que nossos atuais ouvem hoje em dia. São nossos maus-humores que eles aturam. É nossa família que os joga na piscina durante um churrasco. São nossos problemas que rondam suas vidas influenciando o seu dia-a-dia.

Da antiga relação sobram as fotos, as lembranças de viagens, de saídas, de bons momentos. Porque todo mundo tem essa tendência a super-valorizar o passado. Porque vocês acham que a gente pensa que a infância foi a fase mais feliz de nossas vidas? Simples: porque lembramos muito pouco dela.


Não digo que poder vagabundear o dia todo, ter seus pais para te sustentar, ter como maior preocupação ir bem na escola, entre outras delícias de ser criança possa ser tão ruim a ponto de precisar de uma maquiagem do tempo. Mas quem lembra dos castigos, das taboadas, dos colegas chatos tirando meleca durante as aulas de matemática, de comer quiabo debaixo de chinelada na hora do almoço, de não poder ir onde quiser, de ter hora pra chegar em casa? Convenhamos: a gente não gostava de nada disso.

Mas ainda assim o passado sempre parece melhor do que o presente e é exatamente aí, no passado, onde moram os ex. Por isso eles nos metem tanto medo.

Pra mim todo ex-namorado das minhas namoradas parecia mais alto, mais forte, mais bonito, mais interessante, melhor de cama do que eu. Mesmo que a menina me jurasse "sério, Marcus, ele era barrigudo, peludo que nem um macaco, bebia como um gambá e era grosso que nem um português dono de boteco", eu achava que ela só queria me fazer sentir bem e que na verdade até apreciava um Tony Ramos pinguço.

Se bobear até o Brad Pitt deve achar que o Billy Bob Thornton oferece alguma ameaça para ele, e que a Sra Jolie pode achar aquele jeitão de personagem do "Massacre da Serra Elétrica" mais sedutor do que o sex-symbol da América. Pensando bem, em se tratando da Angelina Jolie isso nem seria tão dificíl, mas voltando ao assunto...

Depois de algum tempo aprendi a desencanar sobre isso, afinal, quando você passa dos 20 é impossível arrumar alguém que seja ex-namorado-free e você também terá seus fantasmas particulares para assombrar a vida da sua atual namorada.

E a coisa funciona do mesmo jeito: você pode jurar pra ela que sua ex tinha culotes tão grandes que parecia um dedão com joanete, que era intransigente, barraqueira, fã do Katinguelê e que você só ficou com ela tanto tempo porque sua sogra (que era delegada) te ameaçava de morte, que ainda assim ela vai sentir ciúmes e uma certa insegurança.

Tudo bem que alguns ex contribuem para o desconforto telefonando constantemente, aparecendo de repente, seguindo na rua, espreitando atrás de postes, enviando fotos de sunga por SMS, mas quem está livre de se deparar com um psycho na vida?

Parecem aqueles bonecos João Bobo, que por mais que você tente socar e mandar para longe, acabam aparecendo de novo para pedir um livro emprestado, convidar para o aniversário da irmãzinha fofa de 6 anos ou então um deles liga pra perguntar se sua namorada lembra onde ele guardou aquele CD do Depeche Mode que eles ouviram durante uma viagem à Cabo Frio há 5 anos atrás.

Porque ex-chato é assim: arruma sempre um motivo para aparecer.

Mas a menos que seu par atual esteja contigo porque te deve uma grande quantia em dinheiro, porque está esperando que você doe um dos seus rins para ela ou então porque sua mãe é delegada e a ameaça de morte, a explicação mais plausível para ela estar contigo é bem simples: ela quer e por alguma razão te acha o melhor pra ela.

E se ela acha isso, porque logo você vai contestar? Melhor não faze-la pensar duas vezes e descobrir que pode estar fazendo uma besteira.

Aproveite.

Mas eu me mordo de ciúme...

Postado em 19 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 9 Comentários

Lembra dessa música do Ultraje a Rigor? Bom, se não lembra, sorte sua, porque apesar de ser um disco bem legal, "Nós vamos invadir sua praia" tocou tanto, mas tanto, que encheu o saco na época.

Mas este assunto, o ciúme, jamais sai de moda. Arrisco a dizer que o ciúme e a insegurança foram responsáveis até pelas mais terríveis guerras que o mundo já viu. Quem garante que Napoleão, que era meio baixote, não resolveu descontar toda a sua insegurança de jogador de totó fazendo guerras sangrentas e tentando conquistar o mundo?

Ou que Hitler, com aquele bigodinho de escova de pia, não compensava algum tipo de complexo de inferioridade assassinando milhares de judeus, ciganos, homossexuais e torcedores do Bangu?

O ciúme motivou crimes passionais, mortes de reis e rainhas, donzelas trancafiadas em torres e quase todas as novelas da TV. Quem nunca sentiu ciúme? Quem nunca quis provocar ciúme no ser amado?

Esse aliás é um dos joguinhos mais comuns de qualquer relacionamento. Estamos no meio de uma sessão de cinema, o ator-gostosão nos causa certo desconforto quando aparece sem camisa e vemos uma babinha no canto da boca da nossa namorada. Em 30 segundos um clip sobre todos os ex-namorados e possíveis paqueras dela passa pela nossa cabeça e, quase automaticamente, dizemos algo sem nenhum sentido, como:

- Tá vendo o peitoral desse cara? Pois é, o peito da Sabrina Sato é muito mais gostoso, porque parece com o da minha ex-namorada.

Além de parecer bêbado, você vai causar um certo sentimento de pena nela, já que quem conhece a sua ex sabe que ela está mais para um lutador de sumô do que para a japinha gostosa do Pânico.


Mas às vezes a coisa é mais bem preparada, menos impulsiva. Você inventa uma pessoa imaginária (uma amiga que mora em Recife, uma ex-namorada que mudou para a Nova Zelândia e te achou no Facebook - já que Orkut é brega - ou qualquer outra história que venha à sua cabeça), ou então inventa alguma situação imaginária com uma pessoa real (a nova estagiária do seu trabalho que mal te dá bom dia, mas você fala que anda desconfiado por te chamar pra almoçar todo dia, a loira da academia que não pára de te olhar, a vizinha que veio te pedir uma xícara de açucar vestindo babydoll) e com isso tenta provocar ciúmes na sua amada.

Perceba que todas as variantes acima podem ser adaptadas ao outro lado: um amigo que mora em Goiânia, o ex-namorado que foi surfar no Vietnã e te achou no Facebook, o professor da academia que sempre se oferece pra te ajudar no alongamento, o seu ex-peguete dotadão que mudou para o mesmo prédio, o seu vizinho que vai te pedir açúcar de babydoll...

Só que essas situações montadas raramente terminam com o resultado desejado, que é a pessoa demonstrar que te ama, te adora e não pode viver sem você.

Geralmente ela percebe o jogo e começa a fazer igual, levando um relacionamento dentro dos níveis aceitáveis de normalidade a se tornar uma espécie de jogo de xadrez entre o Marquês de Sade e Sacher-Masoch.

Outro resultado provável é o seu par, que já estava pensando em te dispensar mesmo mas só não tinha feito isso porque te achava confiável e leal, ter a certeza que esta é a hora da decisão e cobrar um penalty na sua bunda.

Existe ainda a chance da(o) sua(seu) namorada(o) já estar com a idéia de propor um relacionamento aberto pra você e te dizer, com uma cara de felicidade, algo como:

- Poxa, legal saber isso, façamos assim: você pega a sua vizinha de babydoll que eu continuo dando pro cara do planejamento, beleza?

Ou:

- Muito bom, amor, quando seu namorado voltar do Vietnã podemos sair eu, você, ele e a secretária do meu dentista que eu estou pegando há seis meses.

E assim você que desejava paixão e exclusividade conseguiu uma passagem só de ida para o universo do swing.

Como você pode notar, esse tipo de jogo é difícil de controlar, e se for para apostar em alguma coisa, melhor apostar na Mega Sena do que em qualquer pessoa, porque além de tudo o prêmio é bem maior.

"Estou entediado, acho que vou pra rua encher o saco dos outros"

Postado em 18 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 6 Comentários

Tem gente que deve pensar algo mais ou menos assim: "estou à toa em casa, entediado, sem nada de bom pra fazer, acho que vou pro supermercado comprar uma pêra e arrumar briga na fila, encher o saco da caixa e voltar pra ver a novela".

Outro dia estava comprando umas bobagens (já viu homem ir pro mercado comprar outra coisa que não seja bobagem?) e ao mesmo tempo lendo uns emails no celular. Não esbarrei em ninguém, não bloqueei a passagem de ninguém, não fazia nenhum tipo de atitude abominável típica de cell phone freaks como ouvir funk, Tiririca ou Los Hermanos com o volume no máximo, e mesmo assim passou uma velha do meu lado e disse, aliás, disse não, o melhor termo para a forma como ela falou é cuspiu: "malditos celulares!".

Assim mesmo, do nada. Como se dissesse "malditos políticos!" ou "malditas aranhas!".

Fiquei na dúvida se fingia que não ouvi ou se mandava a anciã tirar a dentatura e ir fazer um boquete a laser no marido, mas preferi deixar pra lá.

Nada a ver com "respeitar os mais velhos", o que eu acho uma grande idiotice se for algo praticado indiscriminadamente, já que canalhas e cretinos também envelhecem e muitas vezes envelhecer só lhes serviu para fazer mais cagadas por mais tempo, deixei pra lá porque ela podia ser mais uma entediada que só foi ali para arrumar confusão e assim eu estaria fazendo justamente o que mais detesto na vida: fazer o que os outros querem que eu faça gratuitamente. Porque de graça até dar esporro é desperdício.


Mas esse tipo de gente é mais comum do que pensamos.

É aquele cara que foi pra fila do banco brigar com os outros por causa do lugar, encher o saco do caixa porque quer receber os R$27,00 de troco somente em moedas de R$0,50 e ainda faz algum discurso em altos brados sobre o filho do banqueiro que mora em Miami enquanto ele está ali naquela agência nos Cafundós do Judas pagando seu carnê das Casas Bahia.

Ou então a coroa enxuta que vai na padaria comprar ricota com seu cachorrinho dentro da bolsa e faz questão de observar para o atendente que não pediu 207 gramas de queijo e sim 200, não entendendo porque essa gente do "populacho" tem tanto problema em entender um simples pedido, e que é por isso que "jamais subirão na vida".

Tem também quem tire o carro da garagem para dar uma voltinha até o shopping e brigue com o porteiro porque demorou a abrir o portão, brigue com o sinal de trânsito porque demorou a abrir, xingue outro motorista porque está devagar demais, arruma uma confusão por causa de uma vaga, entra, discute com o garçon porque demorou a trazer o cafezinho, bate-boca com a caixa do estacionamento porque acha o preço exorbitante, volta pra casa furando todos os sinais vermelhos que vê pela frente, briga com o porteiro outra vez por causa da demora em abrir o portão e vai dormir.

Todos esses e tantos outros parecem ser casos de transfusão de stress. Você está puto com alguma coisa e vai distribuindo esse sentimento por aí, diluindo por quem passa na sua frente e espera que no final do dia se veja livre do peso.

O problema é que existem outros cretinos iguais a você aos montes e eles fazem questão de te devolver tudo aquilo que você passou o dia "perdendo". Mais ou menos quando você joga um papel no chão e alguém pega, te chama e diz: acho que você deixou isso cair.

Na maioria das vezes são pessoas normais, cordatas, mas que por alguma razão se transformam de vez em quando. Mas ninguém tem nada a ver com isso, afinal, mesmo que você seja o maior mal-humorado do mundo, isso não quer dizer que você aprecie mau humor nos outros.

E ainda que você seja que nem eu e não goste de dar nem esporro de graça, não é porque você resolveu abrir exceção que os outros são obrigados a gostar de receber.

Uma polaroid do Planeta Micareta

Postado em 17 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 14 Comentários

Digamos que uma nave espacial chegasse à Terra para dominar tudo. 4 de Julho, Independence Day, enormes discos voadores preparam-se para pulverizar as maiores cidades do mundo, exterminar a raça humana e colonizar o que sobrou dos recursos naturais do planeta.

Mas de repente os alienígenas percebem uma vibração que acreditam ser uma espécie de arma avançada desenvolvida pelos terráqueos. Estranharam isso, já que quando sondaram a Terra séculos antes, ainda usávamos espadas, cavalos e a pólvora era a grande novidade. Anos mais tarde viram que alguma coisa evoluiu, mas nada que pudesse ser páreo para suas armas laser e seus escudos de proteção magnéticos.

Concluíram que era seguro invadir.

Mas aquelas vibrações eram novidade. Não sabiam ao certo de onde vinham, apenas que tinham sua origem em algum lugar ao sul do planeta. Resolveram investigar e apontaram seus lemes naquela direção.

Chegaram num país de extensa faixa litorânea e conforme se aproximavam mais da origem das estranhas vibrações, começaram a identificar sons mais nítidos como "ôôôs", "êêês", "lerêrê" e "ajayô ajayô" e "Micareta!". Os afiadíssimos ouvidos alienígenas sentiram dores incomensuráveis, aquilo só podia ser uma arma secreta dos terráqueos para destruí-los sem dó nem piedade.

Mas o pior ainda estava por vir.

Chegando mais perto, perceberam o que imaginaram ser moderníssimos tanques de guerra, uns caminhões equipados com as armas que emitiam os sons infernais, luzes piscantes que irritavam seus olhos e sobre esses veículos os generais da resistência terráquea.


Eles observaram que do alto de seus postos de comando os generais faziam movimentos frenéticos que eram acompanhados por soldados vestidos com roupas fluorescentes que quase cegavam os ETs. Eles levantavam e abaixavam os braços, exalando um cheiro tão forte que só podia ser alguma arma química desconhecida.

Os aliens estavam perplexos. Aquele tipo de guerra era algo para o qual eles não estavam preparados.

Alguns deles tinham uma espécie de capacete em formado de tranças que balançavam, outros usavam um capacete que em tudo se assemelhava ao pêlo dos animais da terra, porém tingido de um loiro-esbranquiçado que só era possível obter a partir de produtos químicos pesadíssimos. Outros portavam nas mãos um cilindro plástico contendo um líquido amarelado e quente que seus scanners concluíram ser produto da fermentação da cevada.

Como ninguém em sã consciência jamais beberia aquilo, os alienígenas tiveram certeza que seria arremessado sobre eles na hora da luta, causando lesões irreparáveis.

O calor era infernal lá embaixo e uma chuva artificial só serviria para espalhar o lixo que ficava pelo caminho - talvez deixado ali para servir como barricada - e também para ativar o que pareciam ser minas que os terráqueos espalhavam pelo trajeto de sua parada militar, já que de metro em metro algum deles parava, abaixava as calças e despejava um líquido impregnado de amônia em árvores e postes, que certamente explodiriam após alguma reação química.

Com seus cinco olhos, duas bocas, oito patas e um rabo, os ETs sabiam que não eram as criaturas mais bonitas do universo, mas ali embaixo viram espécimes que elevaram seu conceito de feiúra em muitos graus.

Concluíram que aquele exército era bem treinado demais, bem equipado demais e mortífero demais para que tentassem uma guerra sem qualquer tipo de preparação muito bem estudada.

Decidiram voltar ao seu planeta e refletir melhor sobre tudo o que viram. Será que valia a pena brigar com aquele tipo de máquina de guerra? Será que as inevitáveis perdas compensariam a colonização? Será que eles conseguiriam algum dia tirar da sua cabeça aqueles "ôôôs" e "êêês" que pareciam ter sido implantados com algum chip em seus cérebros?

Tiraram uma foto de tudo e levaram a Polaroid para casa.

Com certos planetas, é melhor não se meter.

O flash mob do Activia

Postado em 16 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 8 Comentários

"Ão, ão, ão, vem chupar meu p*rocão".

Responda rápido: esse grito de guerra seria do que? De uma torcida organizada de futebol para a outra, uma propaganda de um novo concorrente do Chikabon ou da turma animada que estava no metrô voltando da tal "passeata gay" (ou qualquer coisa que teoricamente sirva para defender os "direitos" dos homossexuais)?

Acertou quem apostou na turma do arco-íris.

Atualmente é moda falar em homofobia, o que termina por banalizar e generalizar o termo. Concordo que gays não são cidadãos com nenhum tipo de diferença jurídica frente a qualquer outro. Na minha opinião devem trabalhar, namorar, viajar, candidatar-se a cargos públicos, unir-se civilmente e até adotar crianças.

Concordo também que espancar, ofender ou qualquer outro tipo de supressão dos direitos constitucionais de alguém só pelo fato da pessoa ser gay é coisa de quem poderia muito bem estar de quatro, pastando e votando no Tiririca.

Mas não acho que alguém que se incomoda com um casal de gays dando beijos de língua, apalpando as partes pudendas um do outro e praticamente transformando uma calçada, um corredor de shopping ou uma praia numa sauna seja homofóbico. Não é.

Porque uma coisa é o cara gostar de outro cara e a mulher gostar de outra mulher, e outra coisa bem diferente é o cara que gosta de caras e a mulher que gosta de mulheres fazer questão de esfregar agressivamente na cara dos outros essa sua preferência, falando palavrões, fazendo gestos, mexendo com os outros e comportando-se histericamente.

E muita gente que vai nessa passeata gay só está ali pra isso. É como se dissesse "me sinto discriminado mas eles vão me engolir hoje". E esse tipo de comportamento, na minha opinião, só contribui para dar razão aos seus detratores.


Sou contra esse negócio de criminalizar a dita "homofobia". Pra quem espanca gays, está aí o Código Penal que pune agressões. Para quem ofende, estão aí as leis que coíbem e punem as injúrias, calúnias e difamações. Para tudo existe o código penal e qualquer outra coisa de priorize grupos específicos (gays, negros, índios, torcedores do América) é discriminatória para com o resto da população, já que cria classes de cidadãos que são mais protegidos pela lei do que outros.

É como se a lei quisesse dizer que "maltratar os outros é errado, mas maltratar negros é muito errado" ou que "espancar pessoas é ruim, mas espancar gays é um pouco mais ruim". Não cola.

Se um grupo de ativistas gays tem o direito de ir incomodar católicos fazendo um "beijaço" no trajeto da passagem do Papa, têm de estar preparados para que os chamem de "bichas", "viados" e mais o que for. Ação e reação, é assim que funciona.

Do jeito que vai, um pai com seus filhos num Mc Donald´s qualquer não vai poder se dizer incomodado com alguém fazendo uma "pegação" na frente dele, porque será criminalizado por isso, como se o mundo tivesse necessariamente que se transformar num banheirão.

Acho que tudo o que um casal hetero normal evita fazer em público, vale para um casal homossexual. E conheço pouca gente que tire as calcinhas da esposa numa casa de chá ou morda as nádegas do marido num rodízio de pizzas.

Indo pela mentalidade dessa gente, o fabricante do Activia poderia organizar um flash mob chamado "cagaço". Quinhentos manifestantes usariam o produto e fariam uma reunião numa praça, para defecar em público. Tudo em nome do direito de cada cidadão a ter um intestino regulado.

A idéia é uma m*, mas serviria para o que parece ser o único propósito de alguns "ativistas gays": chocar.

Chocar e não resolver nada.

Uma má idéia nunca vira um bom plano

Postado em 15 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 3 Comentários

Em 1986, no meio da euforia causada pelo Plano Cruzado, o PMDB elegeu 22 governadores dos 23 possíveis na época, ganhou maioria no Senado, elegeu nada menos do que 260 deputados federais e mais uma enxurrada de deputados estaduais, todos, quase sem exceção, "candidatos do Sarney".

Logo adiante o Plano Cruzado revelou-se um embuste. O congelamento de preços - que espalhou pelas ruas os folclóricos "Fiscais do Sarney" - e a gastança desenfreada do governo levaram o país a um caos financeiro, político e administrativo.

Bombas de retardo ficaram esperando a eleição de 1986 se decidir para estourar logo depois do pleito e já no ano seguinte a inflação era ainda pior do que antes da alquimia econômica do governo Sarney. Foi criado assim o tão conhecido termo "estelionato eleitoral".
Houve revolta, quebra-quebra, e José Sarney - o presidente popular durante o breve sucesso do Cruzado - e que elegeu aquela montanha de políticos a reboque de sua popularidade - chegou ter uma picareta atirada em cima dele durante um tumulto no Rio de Janeiro (versão jamais confirmada). Mas de toda forma foi um evento emblemático sob todos os aspectos, já que o ônibus de Sarney foi apedrejado por militantes do PT, chegando inclusive a ter uma janela quebrada.

Lula não é Sarney e Dilma não é propriamente um "plano", ainda que seja uma idéia ruim, mas a gastança eleitoral de seu governo e as bombas de retardo que já começaram a estourar logo após as eleições - vide o caso Caixa-Banco Panamericano, o ENEM, a tentativa de retorno da CPMF e o deficit das contas públicas - estão aí para deixar pelo menos uma pulga atrás da orelha de cada brasileiro que pensa e presta: será Dilma o seu Plano Cruzado?

Em final de mandato, Lula não terá nem tempo de ganhar o Troféu Picareta que Sarney mereceu. Logo ele, que falava tanto dos "300 picaretas no Congresso" e elegeu uma renca de igual tamanho agora em 2010 graças a políticas voltadas mais para as urnas do que para o futuro, virando o presidente "mais popular da história destepaiz".

Vai acabar deixando a possível honraria de um picaretaço para a sua sucessora, o Plano Cruzado que ele tirou da cabeça e impôs ao Brasil.

Ser brega...quem não é?

Postado em 11 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 11 Comentários

Ninguém escapa da situação: você tenta ser cool, seleciona bem as músicas que escuta, procura fugir dos livros do Paulo Coelho, não lê a Caras até mesmo quando vai cortar cabelo, jamais doura pêlos com água oxigenada no verão, evita usar cordões de prata grossos e nunca passa Kolene no cabelo, mas alguma breguice te pega pelo pé contra sua vontade.

É uma questão complexa entender como alguém que curte várias coisas consideradas "legais", pode de repente soltar uma frase como "Pô, adoro aquela música do Latino".

E existe!

Quem nunca se pegou quase cometendo auto-flagelação porque não conseguia tirar a música do garçon do Reginaldo Rossi da cabeça? Um algum funk melody da Trinere ou pagodinho-trash do Belo? "Lerê, lerê, lelelelerê"? Quem nunca usou alguma roupa de bali? No desespero, vale recorrer até à Igreja Universal.

Sei que tudo é um conceito, que o que é "in" numa sociedade/época/contexto será totalmente "out" em outra  - as ombreiras e as pochetes estão aí para provar isso - mas existem coisas que são ruins hoje, seriam ontem e serão até o ano em que os humanos colonizarem Marte, como a "Dança da Tartaruga" e as sandálias Croc, que já nasceram fora de moda ou, pelo menos, dignas de um vale-vômito.

Eu, por exemplo, já enfrentei críticas severíssimas pelo simples fato achar que Nirvana é uma bosta, porque afinal isso é bem menos socialmente aceitável do que dizer "Katinguelê é um lixo". 

Assim como é meio auto-depreciante andar por aí cantarolando "eu e o namorado dela, ela e minha namorada".



Mas uma hora, acontece até com a gente.

Tenho uma amiga que é inteligentíssima, descolada, gente boa, mas se tranca no quarto de empregada pra ver a novela das oito todo dia e só sai aos sábados depois que as "cenas dos próximos capítulos" aparecem. Se alguém ligar pra ela chamando pra sair naquele horário, ela vai dizer que está terminando de digitar a monografia, que está no meio de um capítulo de "Laços de Família", que está dando banho no gato, mas jamais dirá "tô vendo novela".

Até admiro quem tem coragem de confessar isso, porque quando ouço alguém nervoso dizendo que vai pra casa "ver novela" já imagino a pessoa sendo rebatizada de Valdirene ou Maicosuelanderson.

Pode ser alguma herança genética, dos tempos em que só existia TV aberta, pode ser alguma espécie de defeito de fabricação que nos lembre que jamais devemos jogar pedra no telhado de vidro alheio, mas ninguém escapa de curtir um Luis Miguel, um velho disco do Roberto Carlos.

É por isso que tem gente por aí vendo Luan Santana, ouvindo sertanejo universitário e votando no Tiririca.

E não fale mal de ninguém que faz isso, porque aí no fundo, você sabe que também tem um telhado de vidro com insulfilm fumê pros outros jogarem pedra.

Aceito o seu dinheiro, agradeça-me!

Postado em 10 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 31 Comentários

"Aceito seu dinheiro, agradeça-me!", dessa forma pode ser definida a prestação de serviços no Rio de Janeiro. Certa vez contei que estava em Niterói e tentei pedir uma pizza pelo telefone, num sábado à tarde, e levei uma bronca do rapazinho que me atendeu, que entre espanto e incredulidade me "ensinou" que não se come pizza antes das 15:00.

Mas acabei sendo injusto com Niterói, afinal, só porque a prestação de serviços lá tem um padrão haitiano, isso não quer dizer que sua irmã maior situada do outro ladro da grande poça de água parada - que um dia foi uma baía - seja muito melhor.

Três cenas ilustram bem o grau-lixo que os serviços no Rio de Janeiro mereceriam de um Guia Quatro Rodas da vida. Isso caso suas equipes conseguissem fazer uma avaliação correta da cidade, sem ter duas rodas quebradas nas suas ruas esburacadas e as outras duas roubadas num arrastão.

A primeira cena é de uma loja que batizarei - para não usar o nome da original - de "Conserto Rápido", especializada em fazer bainhas, ajustes e demais serviços em roupas. Uma senhorita - advogada residente em São Paulo - chega no balcão dessa loja para fazer uma bainha numa calça. A mocinha que a atende toma nota das medidas, do telefone da cliente e avisa que a calça estará pronta no pequeno prazo de dois, isso mesmo, você leu certo, dois dias.

A cliente, acostumada com o prazo de uma a duas horas em São Paulo, ficou em dúvida se aquele era mesmo o serviço "rápido", porque se fosse, nem queria saber o prazo do "lento".

A segunda cena é durante um espetáculo no recém reformado Theatro Municipal do Rio de Janeiro, lugar ainda mais luxuoso depois da obra (ainda que alguns sofás já estejam rasgados, talvez vítimas da "expansividade" do carioca). Chego numa das lanchonetes instaladas num amplo salão bregamente decorado como motivos egípcios para tentar comer alguma coisa.

O lugar oferece o variado e sofisticado cardápio de pastéis de forno e pães de queijo, e a  atendente já vem logo avisando, com aquele sotaque e educação muito própria da Cidade Maravilhosa:

- Ó, se for comer paixtel fica sabenu que só tem de carne e o refrigerante tá quenti.

- Tudo bem, acho que vou de pão de queijo mesmo, tá fresquinho?

- Foi feito mais cedo, né? Dexa vê... (aqui ela mete o dedo no pão de queijo pra ver se está macio)...ó, tá bom ainda...aproveita que só tem esse saco.

- Tudo bem, quanto é?

- Sete reais.

Isso mesmo. Primeiro, um lugar que chega a cobrar duzentos reais por um ingresso não tem uma lanchonete que sirva um cardápio diferente de uma Kombi de esquina, depois nem mesmo esse cardápio variadíssimo é preparado em quantidade que atenda a todos que forem ali e por último, sete reais por meia-dúzia de pãezinhos de queijo coquetel.


Ruim e caro. Esse parece ser o padrão dos serviços no Rio de Janeiro.

Por último, a cena do aeroporto. Sim. O Aeroporto Tom Jobim, aquele que já passou por umas 287 reformas só no governo Lula mas continua com a aparência e o conforto da Rodoviária de Campos dos Goytacazes. Estava chegando da Argentina e pelo celular solicitei um taxi.

Os transportes públicos no Rio de Janeiro são um caso à parte. Um ônibus quente, barulhento e que dá solavancos dignos de um Gordini com problemas no carburador custa a bagatela de R$2,40. O Metrô não leva ninguém a lugar algum - para se ter uma noção não passa pela rodiviária e nem pelo aeroporto, mas passa por lugares como Triagem e Rubens Paiva (que até pouco tempo atrás eu pensava que fosse apenas uma vítima do DOI-Codi) - e ainda por cima vive lotado, atrasa e os trens fazem 900 paradas bruscas por viagem, talvez para prestar concorrência à altura aos solavancos dos ônibus.

Mas divaguei muito, vamos voltar ao taxi no Aeroporto. Pois bem, pedi o taxi - que aqui custa quase R$50,00 por um trajeto que em Buenos Aires custa o equivalente a R$ 20,00 e em Santiago do Chile uns R$30,00 - mas fiquei retido na fila da alfândega por uns 10 minutos.

Quando cheguei ao ponto de taxi, onde o motorista que ia me extorquir cinquentinha esperava, nada de saudações, de se oferecer para pegar minhas malas ou qualquer coisa parecida. Ele me recebeu com um:

- Tô aqui há 10 minutos esperando, nem sei se vou mais te levar.

E eu, já entrando no clima amistoso da cidade:

- Então resolve essa porra logo porque eu estou com pressa.

Ele me levou, num mau humor digno de mordomo inglês de filme de terror, como se fizesse um favor. Confesso que só não mandei ele enfiar o taxi na orelha porque já estava atrasado.

Mas um carioca médio jamais cogitaria mandar o taxista pra onde merecia. Aqui as pessoas se habituaram a ser mal servidas, ao ponto de considerar um privilégio jantar num lugar caro e que tem a fama de possuir os garçons mais grosseiros da cidade, como o Bar Lagoa, que não só ficou conhecido por isso como o carioca, na sua inesgotável esquizofrenia, passou a considerar o estabelecimento "atração" da cidade.

No Rio se você quiser tirar um tomate da pizza, é um criminoso. Se pedir para a coca-cola vir sem limão, é solenemente ignorado. Se reclamar do bife tostado (afinal, nem todo mundo gosta de carne-carvão), corre o risco de cuspirem no seu prato.

Eficiência mesmo só na hora dos 10% de gorjeta.

Aplaudo as raras exceções, que resistem bravamente oferecendo serviços decentes nesse oásis do vilipêndio ao consumidor, mas infelizmente são casos raros.

O padrão no Rio de Janeiro é não ter padrão. O cliente é um bolso, mas não tão desejável a ponto de ser seduzido com bons serviços. A tática aqui parece ser a seguinte: o cara precisa comer, precisa se vestir, precisa se locomover e vai acabar gastando seu dinheiro em algum lugar, dessa forma, se todos servirem mal, ele não terá por onde fugir.

Pelo visto, tem dado certo até aqui.

Brasileiro é apaixonado por carro (e todo apaixonado é idiota)

Postado em 9 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 6 Comentários

Uma coisa que nunca mais esqueci foi quando conheci os EUA e observei a relação dos americanos com seus automóveis. Não é que eles não gostem, pelo contrário, eles adoram motores potentes (e que gastam muito) e todo o conforto que o dinheiro puder comprar, mas não tratam seus carros como se fossem um símbolo de status ou um membro da família.

Lembro de uma Pajero que vi com uma das lanternas quebradas. Como não é permitido andar sem aquela parte de acrílico vermelha, o sujeito dono do carro colou ali um plástico vermelho, que fazia as vezes da parte quebrada. Esteticamente não era a coisa mais linda do mundo, mas como era o que bastava para que ele andasse legalmente, foi o que ele fez.

Aí imaginei um brasileiro dono de uma Pajero com a lanterna quebrada. Provavelmente ele não dormiria, não comeria e só respiraria por obrigação até que pudesse ir numa oficina consertar aquilo. Pagaria o preço de meio carro numa lanterna e como já estava lá mesmo colocaria um enfeite no para-choque, faria o sexto polimento em seis meses e arranjaria alguém para trocar as fraldas do seu carro.

O brasileiro enxerga o automóvel - qualquer automóvel - como uma forma de dizer para os outros "cheguei lá", ainda que um Chevette, um Fusca ou uma Kombi denunciem que esse "lá" pode ser, no máximo, o Piscinão de Ramos.

Não quero bancar o blasé aqui, mesmo porque eu cuido do meu carro com carinho porque sei o quanto ele me custou, mas não tenho ilusões de "tirar onda" com ninguém por causa dele. Uma das melhores coisas do sucesso é poder esfregá-lo na cara dos outros, e causar inveja alheia é bom, ainda que digam o contrário, mas só consigo imaginar alguém fazendo uma projeção de sucesso em um automóvel que custe, pelo menos, o preço de um bom apartamento.

Tirando isso, são todos meios de transporte. Ou melhor, quase todos.


Porque eu já tive carro velho e posso garantir: melhor ir de ônibus, metrô ou charrete, pois a chance de ficar a pé no meio da rua por conta de uma bobina que esquentou, um platinado que deu defeito ou qualquer coisa que caiu no meio do caminho é bem menor.

Mas o que dizer desses carros velhos totalmente equipados com faróis de milha, capas de banco com bolinhas de madeira, câmbio com um siri acrilizado, vidros filmados, tapetes de alumínio, canos de desgarga barulhentos e a cara de pau de trazer no vidro um adesivo escrito "Não me inveje, trabalhe!"?

Ou então aquele sujeito que divide o aluguel de um quarto e sala com meia dúzia, come pão com mariola no jantar, pede dinheiro emprestado até para o porteiro do prédio, mas anda num reluzente Honda que está sendo pago com um rim e mais 98 suaves prestações?

Nos EUA - no resto do mundo não sei, mas provavelmente deva ser parecido - um automóvel usado é tão barato que até um caixa do Mc Donald´s pode andar de BMW. As pessoas compram seus veículos pensando em suas necessidades, no uso que farão dele e em como estes poderão servi-los melhor.

Se for um cara que trabalha com jardinagem, vai ser uma pick-up, se for uma esposa cheia de filhos, uma mini-van, se for um moleque solteiro, qualquer coisa serve.

No Brasil não, aqui é possível conhecer um sujeito que mora nos Jardins em São Paulo e considera qualquer coisa além de Taboão da Serra como roça possuindo um Jipe 4x4, com pneus off road, guincho e o escambau, talvez para o dia que ele resolver fazer um rally no Ibirapuera, entre outras maluquices que os ditos "apaixonados por carro" são capazes de fazer.

Falando em maluquice, o que dizer de um sujeito que mora no Rio de Janeiro - temperatura média anual de uns 90º com sensação térmica da ante-sala do inferno - mas prefere comprar um zero sem ar-condicionado do que um usado com ar, só para dizer pra todo mundo "meu carro é zero!"? Aliás, o que dizer de um país quente como uma cloaca e que vende ar-condicionado como opcional?

O fato é que nossa relação com automóveis não é nada sadia. Talvez por sermos um país pobre - que os marqueteiros do governo não leiam isso, pois podem desmaiar de susto - e tudo ser conquistado na base da dificuldade e dos impostos leoninos - pense que nos EUA um bom usado custa no máximo 3 mil dólares enquanto aqui custa o equivalente a uns 7 ou 8 mil dólares - alguns brasileiros acabam tratando seu carro melhor do que cachorro de madame.

Mas no final das contas sabe de quem é a culpa? Das Marias-Gasolina. Nada me tira isso da cabeça desde que vi um Escort XR3 equipado com rodas de liga leve, capô cromado, aerofólio traseiro, spoilers laterais, muita ferrugem e um adesivo: a pé você não come ninguém.

Democracia das bananas

Postado em 8 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 9 Comentários

Duas passagens do noticiário recente chamaram muito a minha atenção, tanto pelo surrealismo histérico da coisa, quanto pela forma como escancara o que o Brasil está se tornando em nome de uma "igualdade" que é desejável, porém que não deve servir para produzir distorções comportamentais em uma sociedade.

O Brasil é hoje cada vez mais uma democracia das bananas.

Antes de começar, deixe-me esclarecer que não acho que nenhuma raça, etnia ou grupo regional é naturalmente superior ou inferior ao outro. Não existe branco superior, judeu inferior, negro sub-desenvolvido, amarelo super-dotado só pelo fato destas pessoas serem brancas, judias, negras ou amarelas. O que diferencia um indivíduo do outro é sua formação, as oportunidades que teve, seu caráter, a sociedade em que se desenvolveu.

Dito isto - e certamente qualquer pessoa que tenha um mínimo de razoabilidade entende e concorda com isso - vou seguir para a parte que realmente pode ser polêmica, mas que precisa ser dita.

Uma estudante paulista disse no Twitter que "não gosta de nordestinos". Junto a isso também disse que estes mereciam ser "mortos". Na segunda parte, sim, existe um crime (ou talvez um comportamento moralmente reprovável) porque é impossível incitar agressões a quem quer que seja - judeus, nordestinos, pretos, brancos e até mesmo adversários do PT - e ser civilizado ao mesmo tempo.

Mas na primeira parte, onde ela diz - não exatamente com essas palavras - "não gostar de nordestinos", não existe crime. Ninguém é obrigado a gostar de ninguém e nenhuma democracia que não seja neurótica e incoerente pode obrigar um cidadão a engolir esse tipo de opinião em nome de uma suposta "igualdade" ou mesmo "pluralidade".

Não existe pluralidade onde existe supressão da liberdade, ainda que seja apenas a de opinião.

Ninguém pode proibir um preto, um branco, um verde de entrar pela porta social de um prédio baseado na cor da sua pele. Ninguém pode achar normal que se mate, prenda ou persiga pessoas por estas serem judias, católicas, protestantes ou muçulmanas.

Não entro no mérito disso ser agradável, "bonito" ou não, mas todos, repito, todos tem o direito de dizer que não gostam de pretos, brancos, verdes, judeus, católicos, protestantes e muçulmanos sem por isso serem alvo de perseguição pelo estado, pelas entidades sociais, pela imprensa e por qualquer outra pessoa.

Qualquer um deve ter o direito de dizer que não gosta de paulistas, que acha nordestinos feios, cariocas vagabundos, gaúchos arrogantes e o que mais bem entender sem que nada aconteça. Isso é uma opinião, isso é um sentimento pessoal - errado ou não - e não cabe à sociedade, ainda mais na forma de leis equivocadas, agir sobre esse direito.

Temos essa obsessão pela "unanimidade", obrigando o indivíduo a pensar - ou pelo menos fingir que pensa - igual à manada.


Opiniões patéticas são desprezadas, são alvo de escárnio, são desconsideradas, mas jamais devem ser tratadas como crime. Veja o caso ridículo de "nazistas americanos". Um país que lutou - e foi um dos maiores responsáveis pela derrota da Hitler - admite que seus cidadãos se digam "nazistas", sem que por isso parem na cadeia.

Vão para cadeia sim, se destruírem a propriedade alheia, se agredirem alguém, enfim, se cometerem crimes. De resto, recebem apenas o tratamento que um louco que se diga Napoleão recebe: a irrelevância. Para o resto, existe o código penal.

Qualquer coisa diferente disso pode ser tudo, menos democracia.

O outro evento, este ainda mais chocante, foi o caso envolvendo o livro de Monteiro Lobato "Caçadas de Pedrinho", denunciado por diversos órgãos governamentais - inclusive o MEC que para fazer censura de conteúdo é competente, mas para organizar o ENEM não é - sendo acusado de "racista", "perverso", entre outras imbecilidades por conta de trechos onde diz que "Tia Anastácia sobe numa árvore que nem uma macaca de carvão" e também “Não vai escapar ninguém – nem Tia Anastácia, que tem carne preta”.

O ministro da "Secretaria de Igualdade Racial" - coloco assim entre aspas porque esse ministério é uma aberração que não promove "igualdade racial" e sim "onguismo afro-brasileiro" - disse que o livro "fere a auto-estima dos negros".

Nem sei por onde começar dado o enorme festival de idiotices contido na história toda, mas penso que o melhor a dizer é que o negro brasileiro - esse cidadão de pele preta que descende de escravos - não é um "coitadinho" e nem um cidadão tutelável para ser tão protegido pelo estado assim.

Penso que um profissional negro, casado, com sua família e sua vida independente não tem mais ou menos problemas de auto-estima do que um branco que seja gordo, um asiático que seja careca ou um branco e um asiático que não sejam nem gordos e nem carecas. Todos são pessoas, com problemas de auto-estima mais ou menos parecidos.

O que se faz no Brasil com essas políticas equivocadas que ganharam força no governo do PT é criar no país uma tensão racial que não existia. É fato que o racismo era velado por estas bandas, mas também é fato que não existia esse ressentimento racial que vemos hoje, com estudantes brancos sentindo-se injustiçados por cotas, com estudantes negros precisando provar seu valor duas vezes, com a sociedade sendo alvo deste tipo de censura boçal que ataca até mesmo Monteiro Lobato.

Comparar um negro a um macaco é ridículo se a pessoa quiser dizer que a etnia é inferior. Mas comparar um negro subindo rapidamente numa árvore a um macaco não é. Afinal, parece mais com o que? Com um urso polar? E a parte visível da "carne da Tia Anastácia" era o que? Magenta?

Por esta lógica Machado de Assis mencionando "crioulos" em seus livros também pode ser considerado despiciendo para a formação de nossos jovens. Desse jeito, só restarão livros de auto-ajuda e o jornal da CUT para ler na escola.

Não sejamos hipócritas, não sejamos histéricos e resistamos, sim, a esta ditadura cultural e de opinião em que o Brasil está se tornando.

Porque a cada dia que passa, o ar fica mais irrespirável.

O que você faria por...

Postado em 5 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 5 Comentários

Outro dia um cara fez uma pergunta bizarra no Twitter, era mais ou menos o seguinte: se uma zumbi gostosa como a Carla Perez te desse mole, você pegaria mesmo sabendo que é uma zumbi?  Esqueça a bizarrice de alguém pensar que a Carla Perez é gostosa e também em fazer sexo com zumbis (nessa ordem), mas esse tipo de pergunta é mais comum do que seria aceitável.

Coisas como "você comeria um prato de merda em troca de uma Ferrari?" ou "você aceitaria ser abusado pelo Mike Tyson se pudesse pegar a Jennifer Lopez depois?".

Nunca entendi direito esse tipo de relação, de associação de uma coisa boa com outra detestável - partindo do princípio de que você não gostaria de ser abusado pelo Mike Tyson, é claro, e que não aprecie "comidas" exóticas.

Isso me lembra sempre aquela famosa frase cretina que diz que "é melhor ser pobre e ter saúde do que ser rico e ser doente", como se - contrariando a realidade - só existissem pobres saudáveis e ricos doentes.

Eu prefiro ser rico - podre de rico se possível - e saudável - mais do que o Paulinho Cintura. Me recuso a entrar nesse foguetinho do Sílvio Santos.

Não troco uma câmara de ar por um Atari e nem uma meia usada por uma caixa de Playmobils.

Mas o fato é que temos verdadeira obsessão pelas pegadinhas da vida, como se a velha maldição cigana - "que você consiga tudo aquilo que desejar" - vivesse sempre à espreita.


"Quero conhecer uma loira peituda", cuidado, poderá vir um travesti.

"Quero ganhar muito dinheiro", Bú! Servirá para pagar um divórcio.

"Quero viajar pra uma praia", certeza de que vai chover o tempo todo ou então estará infestada de tubarões.

"Quero um emprego numa multinacional", vão te contratar como faxineiro.

E por aí vai.

Note bem que não defendo o tal "pensamento positivo". Na vida a maior chance é de dar merda em tudo mesmo, assim é a realidade, mas às vezes - quando você está se dando bem - é melhor aproveitar porque talvez não dure muito.

E de preferência sem fazer muitas perguntas.

Pense numa festa de ricaços, você está passando pela porta, o segurança te saúda chamando de "senhor", abre a cordinha para você passar, assim que entra te dão uma taça de prosecco, uma morena de olhos verdes aparece te chamando de "querido", senta no seu colo, te faz carinho e o Eike Batista aparece te oferecendo um cartão e dizendo pra você ligar no dia seguinte porque tem planos para você. O que você faz?

Pensa que vai levar um "Boa Noite Cinderela" da morena e que o Eike vai te pedir um boquete embaixo da mesa, grita para todos "estão me confundindo com outra pessoa!" ou aproveita a situação?

Tudo bem que o surrealismo disso tudo fatalmente terminará com o despertador tocando e você caindo da cama atrasado pro trabalho no seu empreguinho de bosta, mas e daí? Sonhar, além de não adiantar nada, também não custa nada (se adiantasse seria cobrado em dólar e por minuto).

E convenhamos: a vida não te oferece esse tipo de escolha. A realidade normalmente é o Mike Tyson, o "Boa Noite Cinderela", o prato de bosta e você no foguetinho do Sílvio Santos trocando uma coleção de gibis da Turma da Mônica por uma bóia de braço furada.

Bons Aires

Postado em 4 de nov. de 2010 / Por Marcus Vinicius 4 Comentários

Sei que puristas e ufanistas não gostarão nada disso, mas se eu fosse Tom Jobim, o "samba do avião" não seria samba, seria tango e diria que minha alma canta quando vejo o Rio de La Plata

Mas a verdade é que Buenos Aires me faz passar muita raiva.

Das suas ruas largas, suas avenidas imponentes, seus prédios de extremo bom gosto, sua gente amistosa, seus parques gramados cheios de pessoas nos finais de tarde, suas estátuas cheias de significado, a bandeira alvi-celeste tremulando, suas praças.

Detesto.

A sorveteria Freddo (que faz o melhor sorvete de limão do mundo), seus quiosques vendendo meu alfajor preferido, o Jorgito, em cada esquina, a facilidade de tomar refrigerante de pomelo sem ter que recorrer à suco de toranja ou a algum "citrus" da vida, seus bifes de chorizo de 200 quilos, suas milanesas com papas fritas, seus choripans, seus antigos restaurantes que parecem estar parados no tempo.

Não gosto.

O Clube Eros e suas sodas servidas em sifões, a Plazoleta Cortazar nos sábados à tarde, as ruas de Almagro, os diferentes e lindos Palermos: o Viejo, o Soho, o Hollywood, o Chico, sua imensa flor de metal perto do Malba e da faculdade de direito, suas moças bonitas.

A Bombonera, a Praça de Mayo, os fileteos.


O microcentro e sua Calle Florida, as Galerias Pacífico, o obelisco, Puerto Madero com a ponte em formato de mulher (ainda que eu nunca tenha conseguido enxergar um corpo de mulher ali), seus ônibus decorados, seu metrô caótico que leva a toda parte, os finais de tarde ensolarados, as feiras dos finais de semana, o prazer de sentar num café e ouvir ao meu redor aquele idioma maravilhoso, falado com o melhor sotaque de todos.

Me irritam.

Simplesmente saltar do avião num aeroporto e ser recepcionado pelo frio que me faz esquecer o calor infernal do trópico, entrar num taxi preto e amarelo e sentir uma felicidade inigualável simplesmente pelo fato dos meus pés estarem sobre solo argentino.

Aí você vai me perguntar, com toda razão, qual é a parte irritante disso tudo que foi descrito hiperbólicamente como se fosse um livreto promocional de turismo.

Fácil: ir embora.
 
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