Feliz 2011!

Postado em 30 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 13 Comentários

Esse blog entra em recesso hoje e só retorna dia 3 de Janeiro do ano que vem.

Não que algo muito grande vá mudar nesse período, sou da opinião de que esta é apenas mais uma mudança do dia 31 para o dia 1º (e neste ano de uma sexta-feira para um sábado), mas um descanso e um dia de folga extra sempre são bem vindos.

Aproveite o feriadão para elaborar aquela lista de coisas que você pretende mas não vai fazer, de projetos que você vai esquecer e de promessas que você não vai cumprir.

Viver é isso. Viver é não poder planejar muita coisa além de depois de amanhã e ainda assim continuar tentando, por mais inútil que possa parecer (e na maior parte do tempo é).

Daí o Reveillon despertar em muita gente aquele cruzamento de Paulo Coelho com mãe Dinah que existe dentro delas.

Por isso o meu desejo é que eu e você tenhamos um ano novo de boas surpresas, e que as inevitáveis surpresas não tão boas sejam pelo menos breves e facilmente superáveis com um porre, um sorvete ou uma sessão de cinema.


Desejo muita paz, dinheiro e saúde para todos nós, porque não existe essa coisa de prefirir "ser pobre com saúde do que rico doente", acreditar nisso por si só já é mania de pobre.

Que chova dinheiro, saúde e que 2011 nos reserve toda a tranquilidade possível, que permita até mesmo o doce exercício de sermos fúteis.

Hedonismo é a melhor terapia que existe e com certeza passear em Paris é melhor para a depressão do que ir pra fila do banco pagar a conta de luz.

Se você gosta de praia, que viaje muito para as praias mais lindas do mundo, se prefere o frio, que vá abraçar pinguins onde quiser, se gosta de metrópoles, que vá para Nova York, Berlim, Londres, Milão e Juiz de Fora, mas se você não gosta nem de praia, nem de frio e nem de metrópoles, bem, você então é um cretino, espero que em 2011 fique bem longe de mim.

Que possamos ser felizes, ainda que com mau humor de vez em quando.

Um grande abraço a todos e obrigado pela companhia durante todo o ano de 2010. Que em 2011 mais pessoas se unam à você, que é um dos meus 17 leitores, neste saudável hábito de me ler.

Um abraço!

Bons companheiros

Li recentemente que a revista médica britânica "The Lancet" publicou um ensaio que classificava a solidão como um problema de saúde pública deste século.

Pra quem nunca pensou no assunto ou se sentiu assim, solidão é aquela coisa bem parecida com a companhia de alguém que usa smartphone. Especialistas inclusive dizem que algo precisará ser feito em um curto espaço de tempo.

Afinal, sabe como é, com os avanços da medicina e da qualidade de vida nós vivemos mais, e com isso temos mais tempo para encher o saco de um monte de gente e, finalmente, terminamos sozinhos.

Tudo bem que nem todos são assim, existem os que se aturam, os que fingem se aturar, as relações por interesse e, pasme, até mesmo aquelas pessoas que ficam juntas umas das outras porque querem.

No ensaio da tal revista, a médica que escreveu o artigo relata que certa vez uma senhorinha a procurou no plantão, em plena época de festas de fim de ano, se queixando de uma série de problemas que nenhum exame conseguia detectar.

Durante a consulta a idosa acabou contando que era viúva há 20 anos, que seus filhos moravam longe e por isso ela passava longos períodos sozinha. Terminou fazendo um pedido singelo e perturbador à doutora: "você pode me dar um remédio para a solidão?".

Com certeza uma das funções das festas de Natal e Ano Novo - além do consumismo, da ingestão exagerada de comida e bebida e do endividamento do cidadão - é aguçar melancolias, medos e sensações de solidão. Como se precisássemos de eventos globais como esse para ter essa noção.


Sempre que você achar que está sozinho no mundo, pare de achar isso, tenha certeza. Tirando alguns membros mais próximos da sua família (que geralmente serão seus pais mesmo) e alguns amigos verdadeiros (que não serão mais do que um ou dois, com sorte) você está mesmo sozinho no mundo. Entenda e aceite isso e, por incrível que pareça, você será mais feliz.

Toda essa conversa me faz lembrar dessas pessoas que se recusam a ir sozinhas ao cinema. Ora, meu amigo, a atração ali é o filme, de todos os problemas que você tem na vida, ir sozinho ao cinema nem pode ser considerado um, concorda?

Jantar sozinho, andar sozinho, morar sozinho. Tudo bem que as coisas boas da vida são melhores ainda quando as compartilhamos com alguém, mas atente sempre para este verbo: compartilhar.

Uma pessoa tolhendo, criticando, reclamando e enchendo o saco não presta para nada. Pode acreditar em mim: se é impossível ser feliz sozinho, é mais impossível ainda ser feliz em certas companhias.

Talvez seja por isso que eu conheça pessoas que passam a nítida impressão de que só casaram para compartilhar a infelicidade individual. É uma espécie de repulsa à solidão infeliz, que acaba por unir infelicidades.

São aquelas uniões onde o divórcio é a coisa mais natural e alto-astral que pode acontecer.

Mas eu entendo o pavor que alguns sentem da solidão, sério. Ainda que prefira estar sozinho do que acompanhado de um cretino, sei que tem muita gente que é tão cretina que tem verdadeiro pavor até mesmo da própria companhia, daí precisa ficar rodeado de gente, não importando muito a qualidade do que o rodeia.

Isso funciona mais ou menos como é em relação à felicidade: você não precisa aprender a ser feliz, isso todo mundo nasce sabendo, você precisa é saber como lidar com a infelicidade.

A solidão funciona do mesmo jeito: viver bem acompanhado é fácil, difícil é viver bem acompanhado só de você mesmo. Amizades são muito, muito boas mesmo, mas o seu melhor companheiro será sempre você, afinal, não existe a possibilidade de "se" dar um pé na bunda.

Qualquer um que seja mais chato do que você, não serve para te acompanhar, por isso seja seu melhor companheiro, se isso for possível é claro.

Descobertas de quem mora sozinho

Postado em 29 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 9 Comentários

Papel higiênico não nasce no banheiro.

Você até pode achar que essa afirmação é estranha, mas para quem nunca morou sozinho e de repente resolve curtir as maravilhas de ter o seu "canto", esta é , entre outras, uma descoberta fenomenal.

Morar sozinho é bom, pode ter certeza. Você entra e sai a hora que quer, pode assistir televisão deitado no sofá até de madrugada, pode receber quem bem entender, pode andar pelado pela casa, ouvir música alta, passar 30 dias só se alimentando com barras de chocolate e M&Ms, deixar todos os aparelhos eletrônicos ligados ao mesmo tempo, enfim, tudo o que você sempre quis fazer quando era adolescente e não podia nem quando se trancava no banheiro e muito mais.

Mas é claro que não existe almoço grátis e tudo isso tem seu preço.

Por exemplo, você descobre que além do papel higiênico não nascer no banheiro, as frutas também não aparecem milagrosamente na fruteira como você sempre acreditou enquanto morava com seus pais.

Também vai perceber que pode até comprar uma geladeira frost free e um forno auto-limpante, mas que por mais modernos que sejam esses eletro-domésticos, eles ainda não são dotados da capacidade de fazer brotar queijos, ovos, refrigerantes, iogurtes e nem o seu jantar.

Pode parecer incrível agora que você mora sozinho, mas alguém precisava ir no supermercado e comprar todas aquelas coisas que apareciam na geladeira, e alguém precisava cozinhar aqueles jantares que surgiam como milagre no fogão.

E sabe o mais amedrontador? Além do fato de toda a louça que você suja não correr pro banheiro para tomar banho e ficar limpinha esperando a próxima refeição, ninguém te ouve reclamar porque o pão acabou, o presunto está no final ou tem uma barata no banheiro, como acontecia antes.


Você acreditava que suas reclamações eram palavras mágicas, não é? Que bastava esbravejar durante algum tempo que o pão fresco corria direto da padaria para a sua cozinha, o presunto se fatiava e ficava lá, se oferecendo ao seu paladar, e a barata pegava um chinelo, cometia um suicídio altruísta e ainda por cima tomava o cuidado de já se matar na lixeira, para não deixar aquela gosma no chão.

Viver sozinho é escolher entre matar a barata e limpar toda aquela nojeira ou então conviver harmoniosamente com ela no mesmo apartamento, como se vocês fossem roommates. Gritar pela empregada não é uma opção.

Outras particularidades vão se mostrando com o tempo, como a estranha mania que os botijões de gás têm de acabar no meio de um feriado prolongado, das velas se esconderem durante um apagão e da sua despensa ficar vazia no meio da madrugada, justo naquela hora que bate uma fome tão grande que se uma ONG te descobrisse, criava uma comissão para estudar uma forma de te ajudar.

Depois de algum tempo morando sozinho, você provavelmente já terá desenvolvido a estranha compulsão por estocar papel higiênico, enlatados, fósforos e velas, como se fosse enfrentar algum bombardeio aéreo.

Você também vai nutrir uma estranha paixão por móveis - sério, vai dar o maior valor a ter cadeiras para sentar e a não acordar com a cara no mesmo nível dos seus sapatos naquele colchão jogado no chão - e além disso vai achar o maior barato comer numa mesa e não ter caixas de papelão espalhadas por todos os lados.

Mas tirando as contas que não se pagam sozinhas, a sujeira que insiste em te perseguir e não ir embora antes de ser espantada com vassoura, espanador e pano de chão e o fato de que o número de amigos que você resolve reunir em casa é diretamente proporcional à trabalheira que você vai ter para arrumar tudo no dia seguinte, morar sozinho é uma aventura e tanto.

O ideal mesmo seria unir a liberdade de ter sua própria casa com a comodidade que você tinha na casa dos seus pais, quando sempre existia alguém para resolver cada um dos seus problemas e tudo parecia custar baratinho.

Infelizmente isso não é possível, ou até é, mas você precisa dar um golpe do baú ou ganhar a Mega Sena primeiro.

Marte, Vênus e a Estrela da Morte

Postado em 28 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 5 Comentários

O Léo era tão legal antes de começar a namorar. A Lu era um amor até que conheceu o Beto.

Existem casais que são perfeitos - pelo menos até que algum terceiro elemento que pode ser qualquer coisa entre futebol demais aos domingos, uma secretária turbinada ou um personal trainer saradão se meter entre eles - e outros casais que são o oposto de tudo que convencionou-se chamar uma "relação sadia".

Relacionamentos amorosos são complicados sob quase todos os aspectos, talvez porque seres humanos sejam como hardwares com sistemas obsoletos, tentando fazer uma comunicação entre os PCs (os homens, práticos, compatíveis com um monte de coisas, porém meio difíceis de ligar e cheios de erros no sistema) e os Macs (que seriam as mulheres, de visual lindo, perfeitas, objetos de desejo, mas com vários probleminhas de compatibilidade e uma versão nova lançada quase todo ano).

Quando nos apaixonamos, aquela pessoa passa a ser o centro do nosso mundo. Tudo nela é "bonitinho". O jeito de mexer no cabelo, o gosto pelos filmes do Truffaut, o estranho hábito de misturar goiabada com ketchup, o ronronar que ela faz nas duas horas seguintes depois de dormir, tudo é mágico.

O casal cria códigos, piadas internas, trocas de olhares, enfim, todo o mundo só existe para ser palco para aquela paixão que com certeza é a maior que já existiu desde Marco Antônio e Cleópatra.

Essa fase inicial é tão over, que o ideal seria todo casal ficar mudo durante os primeiros três meses de namoro, que é a fase dos apelidinhos escrotos - xinxinha, ximbinho, moti-moti - e outras coisas que nos fazem pensar que o amor além de cego é meio estúpido também.

Mas tirando isso, também nos livraria de certas promessas e bobagens que dizemos enquanto estamos drogados pelo encantamento inicial.

Coisas como "eu sempre estarei ao seu lado quando você for fazer cosplay do Super Mario" ou então "prometo que jamais vou reclamar do seu hábito de ir no cinema toda sexta-feira, levando um tupperware com brócolis cozido para comer durante o filme", são promessas fáceis de fazer enquanto trocamos os primeiros beijos, mas ficam complicadas de cumprir depois de alguns meses de namoro e da sensação inevitável de ânsia de vômito que você sente ao ver o Bruce Willis cheirando a brócolis no cinema.

Acredite em mim: muita coisa que você faz no início será motivo de arrependimento no futuro, incluindo ter permitido que ela apelidasse seu órgão sexual de "tratorzinho".

Alguns casais passam por essa fase inicial e tornam-se casais quase perfeitos. São gente finíssima entre os amigos, sabem ficar separados durante uma saída em grupo, só voltando a ficar juntos depois de terem feito uma social com todos os presentes.


Parecem não sentir ciúmes um do outro, mas no entanto são bonitos e poderiam ficar com quase todo mundo do grupo. Fazem academia juntos, curtem rock'n'roll e viajam na moto que ela comprou, indo para lugares paradisíacos e voltando cheios de fotos que você tem certeza que só tiram para fazer inveja em todo mundo.

Outros casais no entanto estabelecem aquele tipo de relação que você teme acabar aparecendo no Datena ou no Globo Repórter.

São ciumentos a ponto de passar a cumprimentar os amigos com apertos de mão, estão sempre com aquele clima tenso em volta deles e quando saem em grupo - o que é raro, porque gostam mesmo é de ficar trancados em casa vendo DVD - permanecem num canto, só conversando entre si e caso você tente puxar um assunto com um dos dois, te lançam um olhar que o fará ter a sensação de ter pisado no pé do Papa durante a Missa do Galo.

Enquanto o primeiro casal supera os problemas que toda relação possui, esse segundo casal vive algo entre o intenso e o insuportável: brigam o tempo todo e quase ninguém os suporta.

Sozinhos eles nem eram esse pavor todo, mas juntos, bem, foi como se Norman Bates engravidasse Alex Forrest  e nascesse um monstro com duas cabeças, quatro pernas e braços e muitos copos quebrados, bichos de pelúcia esfaqueados e CDs espatifados.

Em tempos de paz - o que no caso deles dura algo em torno de duas horas e meia - um sempre faz questão de mandar no outro, o que rende várias piadas quando eles não estão presentes.

Homens são de Marte, mulheres de Vênus e se você não tomar cuidado nos seus relacionamentos, acaba casando com o Darth Vader e morando na Estrela da Morte.

Todos os outros relacionamentos existentes levitam entre esses dois extremos. Um, é o ideal que perseguimos, o outro, é o circo dos horrores do qual fugimos com todas as nossas forças.

E se um deles te deprime porque você tem a sensação de que talvez jamais consiga algo parecido na vida, o outro te dá até um certo alívio, porque é melhor ficar em casa sozinho num sábado à noite jogando Playstation, do que passar a vida num live-action do Doom.

O aniversário nosso de cada ano

Postado em 27 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 10 Comentários

Depois de uma certa idade, as pessoas não deveriam mais dar "parabéns" quando a gente faz aniversário, mas dizer alguma coisa como "bem feito" ou então "de novo?".

Fazer aniversário seria muito mais legal se a gente não precisasse envelhecer durante o processo.

Tudo bem que a alternativa a fazer aniversário é não fazer nenhum, e como não sabemos o que acontece depois dessa, preferimos não passar pra tal  "melhor" antes da hora, mas ficar mais velho não é definitivamente o maior evento da vida de ninguém, por isso tentamos atrasar o processo física e mentalmente o quanto podemos.

Fazer aniversário pressupõe ficar mais maduro com o tempo, ser menos impulsivo, saber mais das coisas, se afastar da adolescência, das inquietudes, gostar de canja de galinha, começar a ouvir Roberto Carlos,Frank Sinatra e a reclamar dos impostos.

Mas e se a gente não acha isso muito legal? E se a gente quer continuar usando calças curtas, falando bobagem com os amigos, enchendo a cara, vomitando o banheiro todo e consumindo Bis, pizza dormida e Coca-Cola quente no café da manhã?

Você vai me dizer "e daí?" e eu te respondo: você acha mesmo que ninguém vai te chamar de "Peter Pan"?

Vivemos para cumprir um papel na sociedade, essa é a verdade.


Se antes dos 18 cada aniversário é um passo rumo a uma liberdade maior, depois dos 18 essa liberdade vai lhe sendo tomada como se você fosse um presidiário que violou a condicional.

Aos 15 podemos sair de casa e voltar depois da meia-noite, mais ou menos aos 16 começamos a saber o que é o sexo, aos 17 já podemos beber uma cerveja na frente dos nossos pais sem levar um tapa na cabeça, aos 18 vem a carteira de motorista e a liberdade quase total e por aí vai.

Mas logo em seguida começam as cobranças: faculdade, estágio, trabalho. E mais adiante o sucesso profissional, casamento, filhos.

"Casa quando?", "E quando vem o primeiro bebê?", "Os filhos já foram pra faculdade?", "Cadê os netinhos?", a única pergunta que não fazem (mas pensam) é: "Não acha que já tá fazendo hora extra aqui nesse mundo, não?"

E quando você menos espera, acorda um dia e percebe que trabalho, contas, obrigações e outras exigências do seu "papel na sociedade" te fazem ter a mesma liberdade que você tinha aos 15, ou seja, quase nenhuma.

A diferença é que ninguém te sustenta, ou seja, era melhor ter 15 e correr batendo a porta do quarto, colocando um rock a todo volume só para encher o saco dos seus pais. Hoje se você fizer isso provavelmente te acharão meio maluco e, com sorte, você só vai levar uma multa do condomínio por perturbação da ordem.

Você tem mais de 40 anos, resolve aprender a surfar e alguém com certeza vai dizer "não tá meio velho pra isso?". Você tem 60, morre de depente e dirão "nossa, mas era tão novo!".

Resumo: para  "estar vivo" você permanece novo por bastante tempo, mas para "viver", logo fica velho.

O que sobra é que os primeiros aniversários se parecem muito com os últimos: você mesmo pouco liga para a festa que os outros fazem quando completa 1 ou quando faz 90 ano e entende muito pouco do que se passa à sua volta em ambas.

Aquele monte de gente sorrindo, comendo, bebendo, cantando "parabéns pra você" e pensando quietinhas entre um brigadeiro e um cajuzinho:

- Será que esse moleque um dia vai ser médico ou engenheiro?

- Acho que o vovô quer competir com o Niemeyer...

PS: O autor deste blog fez aniversário ontem (26/12), daí a reflexão (estimulada por um amigo) sobre aniversários. Mas não precisa dar parabéns e nem dizer "bem feito", OK?

Não é a entrega do Oscar, é o Natal mesmo

Postado em 23 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 8 Comentários

Depois do Carnaval com a sua "Mangueira entrando", talvez o Natal com o "saco do Papai Noel" seja o feriado com maior estoque de piadas e trocadilhos infames, ganhando até do coelhinho da Páscoa com seus ovos.

É nessa época que a gente encontra aquele primo distante, aquela tia que não via desde o ano passado, o cunhado beberrão que só fala besteira, o namorado cretino da sua prima, enfim, um monte de gente que conseguimos passar o ano inteiro sem nem saber por onde anda (o que não fez a menor falta), mas que por alguma razão especial são escolhidos para passar com a gente essa data familiar.

A verdade entretanto é que a maioria preferia nem estar ali.

Mas sabe como é, tem a imprensa com suas reportagens consumistas, os filmes com espírito natalino, a Simone cantando músicas natalinas - o que é um verdadeiro fenômeno de Natal, já que até do Papai Noel você consegue se livrar se quiser, mas dela você não escapa - e, claro, a namorada gostosa daquele seu primo nerd que talvez seja a única pessoa que te cause prazer (literalmente) em rever.

E tudo isso acaba fazendo a gente entrar no clima.


Vai chegando perto o dia e você automaticamente enfeita um pinheiro com neve fake mesmo num calor de 40 graus, vai em lojas de departamentos comprar bugigangas para presentear todos aqueles semi-desconhecidos, prepara um jantar para o triplo das pessoas que irão na sua casa e só esquece mesmo o sal de frutas, que é tão necessário depois do Natal quanto uma visita da sua faxineira Maria das Dores, aquela que vai passar uma tarde inteira removendo os restos de panetone pisoteados do tapete.

Eu tenho quase certeza que se não fossem os presentes, as bebidas e a comilança, as pessoas gostariam tanto do Natal quanto de um exame psicotécnico para carteira de motorista ou uma reunião de condomínio.

O jantar do dia 24 é mais ou menos como uma entrega do Oscar, só que sem aquele monte de gente rica: estranhos que mal se aturam e passam a noite juntas, dando sorrisos amarelos. Trocam gravatas e sabonetes, e depois vão embora de pança cheia, reparando na pão-durice da avó que apesar de ganhar uma pensão gorda, todo ano dá um pote de talco para cada membro da família.

Em Janeiro, quando chega a fatura do cartão, você consulta seu saldo no banco e descobre da pior maneira possível que o espírito de Natal só precisa de alguns dias para virar um espírito de Porco.

No final das contas, cheio de azia, com vários pares de meias que nem pediu e já preocupado com o que vai fazer no Reveillon, surge a dúvida fatal: aquela gorda ali, é tia ou prima?

Sim, eu te acho feio

Postado em 22 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 6 Comentários

Tente responder sinceramente: quanto tempo você acha que o mundo duraria sem a mentira e a hipocrisia? Sem as pessoas enganarem umas às outras até sobre os seus hálitos?

Se você respondeu sinceramente, parabéns, você então sabe que a mentira e a hipocrisia são elementos de equilíbrio social , já que sem elas provavelmente você não se daria bem nem com a sua mãe.

Imagine viver sem dissimulações, sutilezas, disfarces e gentilezas? Sem todos estes códigos sociais que nos impedem de agir como hienas no Serengeti?

Seria como estar rodeado por bêbados e crianças. Sim, porque ninguém será mais cruel do que uma criança quando o assunto for dizer a verdade. Se você estiver fedendo, elas dirão. Se você tiver a cabeça grande, vão te chamar de cabeção.

E um adulto bêbado é praticamente uma criança. Ele sobe em mesas, fala alto, precisa de alguém para levá-lo para casa e possui a desconcertante sinceridade que é necessária para virar pro chefe durante a festa de natal e dizer:

- Sabe a sua amante? A Amandinha da criação? Pois é, ela confirmou o que todo mundo pensava, que esse seu nervosismo todo é por causa de complexo de pau pequeno.

Convenhamos, se nem aquele seu emprego mixuruca resistiu a isso, não seria o mundo, que é muito mais complexo, que resistiria.

Se você não acredita em mim, faça o teste você mesmo.

Escolha um daqueles cretinos que você é doido pra se livrar mas nunca soube como, porque além de chato, ele se faz de gente boa.


Puxe uma conversa com ele, comece falando de alguma namorada que te traiu (se não tiver uma, além de merecer um lugar no livro dos recordes, você poderá inventar uma história), diga como foi horrível mentirem para você, como ficou traumatizado e toda essa bobagem sentimental.

Quando sentir que chegou ao clímax e que ele tem total empatia contigo, pergunte sem rodeios:

- Você concorda comigo? Não é melhor que digam logo a verdade?

Ele, por ser um cretino, terá em mente um verdadeiro arsenal de lugares-comuns e frases feitas, e responderá algo do tipo:

- Claro! Prefiro uma verdade dolorida do que uma mentira que me iluda, prefiro a verdade sempre, doa a quem doer!

Nesse momento a bola estará no alto para você cortar bem no peito dele:

- Que bom você achar isso, porque eu te considero um chato, inconveniente, que dá em cima da minha mãe, vive me pedindo dinheiro emprestado e não paga, tem um nariz de tucano e, apesar do voto ser secreto e morarmos no Acre, tenho quase certeza de que votaria no Maluf se tivesse chance.

Se a "verdade dói", você acabou de dar um chute no saco dele.

E isso vale para tudo.

"Você vai fazer essa mímica escrota de novo?", "Tia, você está tão gorda que a empada é que deveria te comer", "Thayllah Jullyany? Puta nome de favelada, hein...", "O que? Você cortou o cabelo? Não foi uma ratazana faminta que fez isso?", "Sim, eu te acho feio".

Pouca gente encararia isso na boa.

Porque sabe como é, as pessoas adoram a verdade, mas só pra ficar. Na hora de se apaixonar todo mundo gosta mesmo é da mentira.

Os cretinos ainda te transformarão em indie

Postado em 21 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 4 Comentários

Descobrir qualquer coisa é muito bom, que o digam os velhos navegadores.

E o exemplo deles é perfeito para o que quero contar, afinal, eles chegaram em terras paradisíacas, de natureza exuberante, riquezas e nativas de peitos de fora e, passado algum tempo, essas terras paradisíacas viraram isso que hoje é o Brasil, ou seja, um país de natureza exuberantemente degradada, riquezas espoliadas e nativas de peito de fora.

Essa referência também lembra outro conceito que quase todo mundo gosta de repetir, o de que "antigamente tudo era melhor". Veja, não duvido, realmente é possível que antes fosse melhor do que agora (que será melhor do que depois), mas muito disso conta com dois fatores que considero primordiais: a nossa memória falha e o número infinitamente menor de pessoas que viviam no mundo.

Aquela época legal e perfeita que você tanto sente falta provavelmente era a mesma merda de hoje, só que já passou tempo suficiente para você não lembrar dos detalhes.

Outra coisa que nos leva erroneamente a pensar que antigamente era tudo melhor se deve ao fato de que existiam menos pessoas no mundo, logo existiam menos cretinos.

E assim finalmente chego onde queria: que é bom gostar de músicas, autores, filmes, lojas, restaurantes e mais um monte de outras coisas que quase ninguém conhece.

Pense naquele bistrô escondido que você achou por acaso enquanto estava perdido procurando uma livraria num bairro distante. Te serviu um sanduíche delicioso, café de primeira qualidade e ainda por cima fazia cupcakes que derretiam na sua boca.

Até que algum crítico de gastronomia foi lá, o local saiu num caderno dominical de algum jornal com um daqueles títulos medonhos como "Lugares que farão sua cabeça nesse verão" e pronto!


Você chega lá e tem uma fila. E na fila tem aquelas famílias cheias de sacolas da Casa&Video, batendo boca porque o filho preferia ir no Mc Donald´s. O sanduíche vem frio, o café fraco demais e os cupcakes acabaram, porque alguém acabou de pedir 50 para viagem pelo telefone.

E isso acontece com quase tudo. Como aquela banda que você conheceu por causa de uma ex-namorada e que vocês ouviam em ociosas tardes de sábado, mas que de repente apareceu na MTV, entrou nos Top 10 da Jovem Pan, foi remixada pelo Memê e agora toca até nas aulas de spinning da sua academia.

Ou então aquele autor bukowskiano que você assistiu numa palestra junto com outras 4 pessoas na última bienal e que de uma hora para outra - sem que você saiba ao certo porque - passou a ser citado frequentemente em perfis de Orkut e a ter frases mais repetidas por sabujos do que a Clarice Lispector.

Nada é tão bom que 200 mil fãs enchendo o saco com isso o tempo todo não tire a graça. O U2 que o diga.

É gostoso saber que certas preferências são só suas (ainda que isso não seja muito bom pra conta bancária deles), ou então compartilhadas com alguns poucos.

O que ajuda muito essa tarefa é o fato da maioria das pessoas gostar mesmo é de lixo. Caso contrário, trios elétricos é que seriam indie.

No fundo acho que não enjoo das coisas, eu não gosto mesmo é das pessoas que passam a gostar delas.

Tá bom, tá bom, eu confesso: sou um pouco indie mesmo, mas a culpa não é minha, é deles.

Você ainda precisa comer muito menos quilo pra virar elite...

Postado em 20 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 7 Comentários

Nada é mais classe média pequeno-burguesa do que um restaurante de comida a quilo ou um rodízio.

Mas a repetição acabou convencendo grande parte dessa classe média de que ela é uma elite, uma casta de eleitos que é invejada e combatida pelas esquerdas sensíveis, politicamente corretas, ecológicas e de calcanhar rachado.

Bobagem. Se você compra qualquer coisa parcelada, precisa trocar marchas do carro e come em restaurante a quilo, pare de babaquice, você não faz parte de elite nenhuma.

Num país de miseráveis como o Brasil, você pode até ser privilegiado, mas aqui até quem tem um Fusca de certa forma já é.

A classe média adora levar a família para almoçar, pisar naquelas lajotas engorduradas e encher um prato do tamanho de um sombrero mexicano com os mais variados tipos de comidas.

Essa aliás é outra característica da ostentação kitsch muito característica desses lugares: servem churrasco, feijoada, sushi e paella como se estivesse servindo sopas, saladas, peixes, carnes e sobremesas.

Os que se consideram mais finos evitam misturar feijão com strogonoff (outra iguaria que é a cara da classe média), mas a maioria entope o prato com picanhas e sushis mesmo.

Procurar uma vaga no estacionamento do shopping, dirigindo o carro alienado ao banco, para comprar as almofadas da sala do novo apartamento financiado em 30 anos não é coisa de elite.

Imagina o Eike Batista ou o Antônio Ermírio numa fila da Tok&Stok, comprando uma mesa de fórmica para a casa de praia, parcelando a compra em seis vezes sem juros. Consegue? Nem eu.

A casa de praia é outra dessas coisas que define bem a elite verdadeira dessa elite neurolinguística.

O verdadeiro membro da elite vai para Angra ou para o litoral paulista de helicóptero. Fica em alguma casa numa ilha ou praia deserta, não descasca nem a laranja do suco que toma no café da manhã. Quando sai do iate depois de passar o dia nadando, vai almoçar na filial do mesmo restaurante que frequenta no Leblon ou nos Jardins, ao preço de um aluguel por refeição.


A elite neurolinguística - aquela que repete tanto pra si que é elite, que acaba acreditando - enfrenta quilômetros de engarrafamento, pára no meio do caminho para comer pastel ou polenta, chega por uma rua de terra na casa de praia fechada há uns quatro meses - desde o último feriado - e ainda precisa tirar o pó de tudo, colocar os mosquiteiros nas janelas, limpar a mesinha de fórmica que comprou na Tok&Stok ou no Makro e lavar os pratos Duralex comprados no supermercado depois de almoçar.

Aí pergunto outra vez: você imagina o Nelson Piquet ou o Luciano Huck separando lençóis e fronhas velhos para deixar na casa de praia ou então acordando às sete da manhã para ir pra fila da única padaria do balneário comprar o pão pra tomar café antes de ir pra praia?

Você imagina o Sarney ligando para uma pizzaria ou algum herdeiro do falecido Roberto Marinho chegando atrasado no escritório porque teve que esperar a entrega das Casas Bahia?

A classe média não odeia pobre, tem é medo da pobreza. Rico também não odeia pobre, só esquece que eles existem.

A classe média tem orgulho do seu smartphone com plano de dados, rico tem uma secretária para fazer suas ligações (mesmo se estiver na praia).

A classe média compra viagra, rico coleciona amantes.

A classe média usa pulseirinha VIP, rico é VIP sem pulseirinha.

A classe média tem sonhos de consumo, rico consome.

E caso reste alguma dúvida, responda rapidamente: crédito ou débito?

Respondeu? Então você não é elite.

Te quiero con limón

Postado em 17 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 6 Comentários

"Você es uma gatita, te quiero con limón, da me un bejo en xo?"

Pouca coisa é tão sexy quanto uma mulher falando espanhol. Pouca coisa é tão broxante quanto qualquer um tentando falar espanhol sem saber.

E por mais que quase todo mundo goste de debochar dos que tentam, quase todo mundo também acaba tentando um dia, basta que tenha uma oportunidade.  A CVC faz uma promoção de feriado, a brasileirada invade Buenos Aires ou qualquer outra cidade da América Hispânica e pronto, temos um rodízio de portunhol para todos os gostos.

Eu sou fascinado por idiomas - não que fale tantos ou fale bem os poucos que conheço - e sempre achei que é muito mais difícil aprender uma língua parecida com a nossa do que uma totalmente estranha.

Claro que o tempo que leva para alguém conseguir alguma fluência em mandarim é muito maior do que em espanhol ou italiano, mas as armadilhas são bem menores.

Se eu não sei como pronunciar "manteiga", "presunto" ou "queijo" em russo, eu vou perguntar a alguém como se fala. Mas se isso acontece em espanhol, fatalmente tento inventar.


É um tal de "mantiega", "quejo"(com aquela pronúncia do jota como se fosse erre, caprichadíssima, com a garganta arranhando e tudo) e "priesunto" de causar calafrios, quando o correto seria manteca, queso e jamón. É parecido, como se pode notar, pero no mucho.

Coisas simples como nomes de automóveis já causam confusão. Quer um exemplo? No Chile o famoso jipe Pajero se chama "Montero", porque pajero lá quer dizer "punheteiro". Agora, você já pensou chegar numa rent-a-car da vida e pedir em irretocável portunhol: "Quiero alugar un Pajero"?

A troca do verbo correto "alquilar" por "alugar" será o menor dos seus problemas.


Assim como "pegar", que em espanhol pode ter várias formas diferentes de se dizer. Primeiro porque a tradução literal de "pegar" é "colar", depois porque ao tentar dizer que vai pegar algo, pelo menos na América do Sul você vai pisar em terreno minado.

Isso acontece porque a tradução que um dicionário de espanhol daria é "coger". Só que os latino-americanos usam esse verbo para dizer que vão "trepar". Sendo assim, você jamais "coge" um ônibus e sim "toma". E quando vai pegar algo literalmente, diz "agarrar", o que em português é uma atividade preliminar do "coger" deles. Viu a confusão?

Pelado é careca, tarado é louco, chupar é encher a cara e zurdo é esquerdista (o que até soa apropriado em ambos os idiomas). Isso sem falar na já famosa palavra para designar micro-ônibus, que é "buseta".

Quase igual, né? Mas o que mata é esse "quase".

A verdade é que a regra que vale para música, esportes, jogos, artes e praticamente todas as atividades que não envolvam a exposição de dotes físicos, um padrinho rico e famoso ou a indicação de algum político, vale também para os idiomas: se você gosta de verdade, tente aprender primeiro.

O mulherzinha

Postado em 16 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 8 Comentários

Confesso que já fui um cara sensível demais, sei lá porque, talvez influência educacional, talvez excesso de Legião Urbana quando adolescente, mas o fato é que confesso que era meio over.

Tive que encontrar uma mulher que pensa meio como homem - "vem cá, faça seu trabalho e vamos dormir, conchinha eu cato na praia" - para me emendar e tomar jeito. Felizmente tomei. Jeito, que fique bem claro.

Antes disso não me espantaria se alguma menina me dissesse de repente: "grow a dick!".

Sentimentalismo pode ser muito legal para comer menininha, sabe como é? Aquela coisa de citar trechos de livros, músicas dos Los Hermanos, tudo fazendo cara de Chico Buarque depois do Sarau no DCE, mas na boa, quem é assim o tempo todo dá no saco.

É chato e se um dia o cara resolver depilar a perna periga ninguém se assustar.

Homem sensível demais, desses que curtem discutir relação, só por uma questão de justiça merecia passar pelas dores do parto.

Nem estou falando do flagelo dos metrossexuais, porque acredite: um homem que remova os pêlos das orelhas ou cuide para que seus sapatos não cheirem a um vestiário de lutadores de sumô ou a uma jaula é o menor dos problemas para a masculinidade.

Pior mesmo é homem que vive chorando relações passadas, presentes e futuras como se fosse uma Bridget Jones de boteco.

Beleza, cara, ela te largou, que merda, mas se você ficar nessa, a próxima que você pegar com esse chororô sentimental vai te largar por outro sujeito que joga bola religiosamente aos sábados e até hoje ainda conta piadas estilo "Chuck Norris Facts" pros amigos.


Mulher detesta homem ogro e adora homem sensível, pero no mucho.

Você até pode entender a alma feminina - tipo aquele personagem que ouve os pensamentos das mulheres no filme do Mel Gibson - mas não pode é se vestir com ela.

E o melhor para ilustrar isso é um caso que ocorreu com uma ex-namorada minha. Um pneu furou na estrada e estávamos próximos de um posto de gasolina. Eu poderia ter abandonado o carro ali, andado até o posto, chamado um borracheiro para tirar o pneu, consertar e colocar de volta.

Mas ela estava junto, o calor era infernal e eu não iria obrigar a minha mulher a andar numa estrada cheia de mato debaixo daquele sol nem que fosse só por 100 metros. Peguei o macaco, levantei o carro, troquei o pneu, fui dirigindo até o borracheiro.

Chegando lá, eu estava suado, com as mãos sujas de graxa e com aquela aparência de peão de obra defumado, mas ainda assim ela me olhava com uma cara de admiração ou algo parecido. Resolvi perguntar o que ela tinha pra me olhar daquele jeito, e ela respondeu:

- Você ali trocando pneu me deu um tesão...

Note, ela não queria me trocar por um mecânico e nem casar com um borracheiro, mas ver o seu namorado ter uma atitude de homem é que fez com que ela achasse tudo maneiro (um banho depois seria necessário antes de tocá-la, mas isso é só um detalhe).

Homem pode (e deve) ser compreensívo, educado, culto, ter outras conversas além de brigas, carros, mulheres e futebol. Deve entender as dores de cabeça e as TPMs dela, deve demonstrar afeto e preocupação, cuidado, carinho.

Mas também precisa trocar uma lâmpada, consertar uma torneira, pegá-la de jeito na hora certa e ter aquela dose de cafajestagem desejável que se manifesta num aperto bem dado, numa sacanagem dita no ouvido, num "vem cá minha nega" na hora certa, num "fazer seu trabalho e ir dormir, porque conchinha a gente cata na praia".

Caso contrário, melhor depilar a perna de uma vez.

Sou cretina, não estou te dando mole

Postado em 15 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 11 Comentários

De vez em quando surgem algumas lendas urbanas, como a loira do banheiro, o destino das caneas Bic e alguém que ganhou 20 milhões na raspadinha. Outra dessas lendas que acabam tomando conta do imaginário das pessoas é a da garota que é apenas legal, mas "não está te dando mole".

Sei que muitas vezes a diferença entre ser educada ou prestativa e querer dar uns amassos no cara é tênue, e que alguns homens não são muito bons em identificar isso.

- Oi, pode me informar as horas?

- Claro! São oito e quinze.

Ele pensando: "Hummm, acho que ela tá afim de me dar, viu o jeito que sorriu com o canto da boca quando falou quinze, que também quer dizer um quarto de hora? Sacou a maldade dela? 'Quarto'?".

O problema é que sujeitos assim, ao contrário do que você possa pensar, não são a maioria. Um bom número deles inclusive já se encontra cumprindo algum tipo de pena relacionada a isto num presídio federal.

O normal são caras que curtem mulheres, que querem conhecer alguém legal, que só estão afim de uma transadinha rápida mas que preferem que a mulher fique afim deles primeiro, e que não esteja sedada e nem amarrada durante a experiência.

E nessa hora começa a complicar, porque o que será um "mole"? O que será "ser legal"?

A sociedade convencionou que mulheres não podem dizer abertamente pra um cara quando querem alguma coisa com ele, só podem enviar sinais e raras são as que rompem essa barreira. Lógico que homens também contribuem, porque se o sonho deles é um dia encontrar quem diga "Oi, tô afim de te dar", na mesma hora que conseguem isso e a menina toma a atitude, eles pensam "é piranha, deve estar querendo me passar alguma doença ou me dar um boa noite Cinderela".

Só que algumas exageram nesse lance de ser "legal" ou de ser íntima no limite entre a amizade e o amor livre, e por isso eu digo que tem mulher que é cretina mesmo e se aproveita de mais essa lenda urbana (tal qual fazem quando roubam uma Bic no escritório e dizem pro dono que "canetas Bic somem para um mundo paralelo") para provocar, se sentir gostosa e mexer com a cabeça dos outros.


- Não sei se a minha operação para colocar prótese de silicone ficou boa, acho que está meio assimétrico, me diz o que você acha?

- Claro, porque não, se quiser me mostrar...ah, você está tirando a blusa, nossa, é, o médico fez direitinho sim, quer dizer, mas que peito gostoso!

- Pô, cara, você tá sendo inconveniente! Eu só te pedi uma opinião isenta, de amigo e você já confundiu as coisas.

Exagero meu? Nem tanto. Isso acontece, acredite em mim.

- Meu namorado me traiu, você acredita? Eu passo oito horas por dia na academia e no salão para manter essa minha barriga de tanquinho, essas minhas coxas grossas, a minha bunda empinada, meus cabelos bonitos, para estar sempre cheirosa assim e ele me trai.

- Não fica assim não, ele devia estar numa má fase ou então não te merece mesmo, fica bem que você vai ficar legal, sabe como é, às vezes nem foi com outra, pode ter sido outro, em todo caso evite andar em lugares do teto rebaixado por enquanto e depois parta pra outra.

- Sério, você trairia uma mulher como eu? Que fala francês, inglês, espanhol, que pratica pompoarismo, faz yoga, curte sexo todos os dias e ainda por cima tem essa panturrilha aqui?

- Não, eu não faria isso, mas o seu namorado é outra pessoa, vai ver ele estav...

- Tô com tanta raiva que seria capaz de me vingar dele agora mesmo. Quer ir até lá em casa e me comer só pra eu dar o troco?

- Pô, claro que quero, sempre te achei um tesão...

E ela chorando:

- Tá vendo? Sabia! Você não é meu amigo nada, você quer é se aproveitar de mim!

Fica difícil entender, mais ainda saber como agir. Todo mundo já deve ter passado por situações parecidas.

Tipo quando você conhece uma garota no curso de webdesign, gatinha, estilosa, gente boa e que ainda se chama Charlote. Curte as mesmas músicas que você, gosta dos mesmos tipos de lugares, vocês conversam horas sobre cinema e ela também acha que "Vicky, Cristina, Barcelona" é uma obra-prima.

Vocês começam a sair para tomar um café de vez em quando - ela pede mocha frappuccino e você toma vanilla latte - e começaram até a ir beber juntos nas sextas-feiras.

Ela está solteira, você está solteiro e tudo leva a crer que ela está afim de você, inclusive o fato de vocês rirem juntos, passarem cada vez mais tempo um com o outro e até dela elogiar seu topete, suas costeletas, te chamar de bonito e ligar às 2:00 da manhã só pra ouvir sua voz.

Até que um dia você resolve que chegou a hora de dar uns amassos na Charlote. Coloca perfume, a chama pra ir num show de alguma banda indie mais chata do que Los Hermanos (mas que provavelmente vai impressioná-la), chegando lá vocês entram de mãos dadas para passar pela confusão e no meio de uma música em que o vocalista barbudo diz algo como "então eu quero esquecer de tudo e te beijar como se fosse um Carnaval em junho" - esqueça o fato dele ter romantizado uma micareta - você a segura forte, olha nos olhos e diz:

- Eu quero muito te beijar...

Ela sorri, olha de volta nos seus olhos e diz:

- Pô cara, eu sou legal, não tava de dando mole.

Pacote "Pobreza Inesquecível" - 8 dias e 7 noites - Café da Manhã e cachaça incluídos

Postado em 14 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 6 Comentários

Ah, o Rio de Janeiro! O Rio-de-Ja-ne-iii-ro!

Temos aqui o turismo favela. Além do brasileiríssimo turismo sexual, sabe como é, aqueles gringos que vem para cá arrumar namoradas de 30 reais, no Rio tem o turismo favela.

O cara compra um pacote com direito a ver pobreza na Rocinha, palafitas na Maré e lixões a céu aberto em Caxias. Rico acha pobreza exótica, nobre, romântica. Só pobre é que acha pobreza uma merda mesmo.

Sobe num jipe, sacoleja durante duas horas, sobe vielas, tira fotos, finge que acha o batuque dali diferente do batuque do ensaio de escola de samba da noite anterior e depois, claro, volta pro seu ar-condicionado antes de pegar o avião de volta pra civilização. É quase como um safari, só que nesse caso ele não atira em leões (mas espera ver alguém abatido no caminho).

O pacote básico provavelmente envolva só mesmo a visita, mas por alguns reais a mais você deve poder optar por um passeio de blindado até uma zona de conflito, ratazanas em tamanho real, acesso à rede wi-fi no morro Dona Marta e como brinde, chaveiros feitos com capsulas de fuzil deflagradas.

Não sei da existência de viagens semelhantes para a Faixa de Gaza, mas se ainda não tem, deveriam criar, porque o filão tem bastante saída.

Esse pessoal vem pro Brasil em busca do que não tem na terra deles, ou seja, desenvolvimento, uma temperatura mais amena, cultura de melhor qualidade. Logo, não adianta levar um gringo pra ver uma ópera no Municipal, porque isso tem aos montes na terra dele e muito melhor.

Eles vem pra cá ouvir batuque, ver favela, pobreza, beber cachaça, andar debaixo de sol num calor de 40 graus e depois voltar pras suas terras, porque afinal de contas ninguém muda pro parque de diversões só porque foi na Disney.

É por isso que quase ninguém - existem exceções, é claro - propõe que se ensine violino para garotos pobres de favela. Eles os ensinam a bater lata, fazer funk, rebolar até o chão, como se isso eles já não fossem aprender por osmose.


Para quem não precisa conviver com essas coisas diariamente, é muito mais peculiar mostrar um barraco com 300 crianças descalças dentro do que um bairro com gramados na frente das casas. É como olhar por cima do muro para espiar a mulher do vizinho e dar de cara com uma sósia da sua esposa ali.

Alguns gostam tanto que até ficam, mas e daí? Não existem americanos que se unem ao Talibã? O comum é que voltem para casa, no conforto de suas cidades bem servidas, contando suas experiências transcendentais que o contato direto com a miséria causou, mostrando as fotos dos garotos com o nariz escorrendo e colocando 10 euros por mês para alguma ONG no débito automático do banco. Estão fazendo sua parte.

Gringos são quase como moradores da Barra da Tijuca. Complexo do Alemão? Vila Cruzeiro? Que nada, na Barra da Tijuca você sempre está em Miami (com o pequeno detalhe de que Miami não deve ter aquele trânsito de Marginal Tietê que a Barra exibe).

Na Barra as pessoas compram pão na "bakery", remédios na "drug store", carnes no "butcher" e para completar, têm sua própria réplica em tamanho gigante da Estátua da Liberdade, num shopping chamado "New York".

O problema é que passam pelo resto da cidade para ir e voltar do Centro ou da Zona Sul e, diferente dos gringos, quando voltam pra casa, continuam no Brasil.

Eu te amo, mas aproveita porque semana que vem já passou

Postado em 10 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 11 Comentários

- Sabe por quem a Fulaninha está apaixonada essa semana?

- Acho que é por você de novo, ou será a vez daquele seu amigo do trabalho?

Conhece alguém assim? Eu já conheci algumas pessoas que são mais ou menos desse jeito. Não passa uma semana sem que arrumem um novo amor, geralmente "o grande amor da sua vida".

Quem sou eu pra julgar? Realmente existem muitas pessoas lindas no mundo, é até covardia seguir os parâmetros rodrigueanos de que "amor é pra sempre" e coisas do tipo. Acho que a realidade está mais para o que ele dizia da adúltera, que "é mais pura, porque não tem um desejo apodrecendo nela".

Nesse caso, existem adúlteras que nem casadas são. Traem suas paixonites com a maior desfaçatez. O adultério é uma vocação, tal como a facilidade para a música, para o desenho, para as letras, existem aqueles que já nasceram preparados para trair.

E traem seus amores dessa semana com os da semana que vem.


Algumas mulheres necessitam disso para viver, elas precisam estar apaixonadas. É um imperativo. Respirar, comer, dormir, ter faniquitos por alguém. E se esse alguém for muito difícil, indisponível ou apenas se aproveitar da carência dela para arrumar um sexo fácil, dali a algum tempo já será substituído pelo próximo objeto.

Eu não sou muito velho, mas sou do tempo em que nada funcionava depois das 22:00, só latido de cachorro e padre para dar extrema-unção. Sendo assim ainda vivi o resto do tempo dos amores platônicos, da época em que ainda se gostava de alguém durante o segundo grau inteiro, mesmo que ela não nos desse a menor pelota.

Agora a coisa está mais rápida. Internet de banda larga, lojas de conveniência que vendem Bis, cerveja e Red Bull a madrugada inteira, postos de gasolina que ainda abastacem carros mas que também viraram verdadeiros "Baixos Gávea", cheios de adolescentes a noite inteira bebendo Smirnoff Ice enquanto calibram os pneus da Scooter.

E eles amam rapido. Um amor pra toda vida hoje em dia dura mais ou menos 72 horas, se tanto. Hoje em dia o amor tem a longevidade de uma daquelas mariposas que nascem, se reproduzem e morrem logo em seguida.

Dessa forma, essa verdadeira casa do swing sentimental produz o fenômeno dos amores consumidos como iogurte, trocados como um par de Havaianas que é jogado fora assim que surge um modelo mais na moda.

Quem  não consegue um objeto animado para tal, se vira com os inanimados ou até virtuais, como coleções, personagens de filme e seriados de TV. A única verdade é que a vida parece impossível sem aquela afetação catacterística do ser apaixonado, ainda que isso não melhore sua vida em nada efetivamente.

E nem adianta vir com aquela história que os livros de auto-ajuda espalham por aí, que "você precisa se amar", porque "se você não se amar, quem mais vai te amar?", afinal, se você não sabe essa resposta, ninguém mais vai saber.

Relacionamentos não são roupas de marca e nem uma carreira profissional para que sirvam de símbolo de status ou de definidores do que nós somos. São consequências, são complementos. Não ter noção disso é o que leva alguém a viver sempre atrás do "maior amor da minha vida dessa quinzena".

O grande medo que vejo é o de ficar sozinho, de terminar sem ninguém, o que me faz crer que essas pessoas sejam muito malas, já que nem elas se aturam.

O "antes só do que mal acompanhado" nesse caso vira "antes acompanhado de qualquer coisa do que de mim mesmo".

Acho que se comprarem um gato, o bichano pula da janela.

Você discou o número errado, aqui não tem nenhum Cotonete

Postado em 9 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 5 Comentários

- Tia, o Cotonete tá aí?

- Espera um pouco que eu vou chamar o ANTÔNIO CARLOS.

Não conheço mãe alguma que goste de passar meses discutindo com o marido sobre o nome de um filho - para finalmente decidirem que vão batizá-lo com o nome dos dois avôs - e depois descubra que a rua inteira só chama o moleque de "Cotonete".

Por isso eu costumo dizer: nem perca muito tempo escolhendo um nome para o seu filho, porque um dia ele vai pra escola e vão chamá-lo de "Boca","Cabeça","Piu" ou "Merdinha" mesmo.

"Merdinha" aliás era um sujeito que morava no mesmo bairro que eu. Para se ter idéia, como ele era um pouco mais velho e nunca foi do meu círculo de amigos, jamais descobri qual era seu nome verdadeiro, apenas que, mesmo depois de casado e com um filho, as pessoas continuavam batendo à sua porta e procurando pelo Merdinha.

Pior do que esse só o meu vizinho que - para desespero dos pais - era conhecido como "Marcelo Caganeira".

Apelidos geralmente são cruéis. Quem estudou sabe disso. Nos primeiros dias de aula na escola nova você fica no seu canto, torcendo para ninguém perceber aquele detalhe anatômico seu que te "batizou" na escola anterior. Os dias passam, nada acontece e você tem certeza que conseguiu se livrar, mas que nada! Eles só não tinham proximidade suficiente para brincar contigo ainda.


Até que durante algum recreio, enquanto você se enrolava com o troco do cheeseburguer da cantina, um sujeito grita lá de trás da fila "Anda logo aí, Dumbo!" ou então "Paga logo isso que eu tô com fome, Big Head!".

Pronto, o que você temia aconteceu e a partir daquele dia você tem um apelido escroto outra vez.

O tempo passa e a gente se acostuma. "Ahh, quer saber? Melhor ter orelha de abano do que esse seu nariz de tucano" e dessa forma assumimos o "Dumbo", "Big Head", "Cogumelo", "Tucano" e até "Barriga". Não tem como lutar contra.

Só que nossos pais não são obrigados a achar isso legal. Nossos apelidos são quase acusações contra eles.

"Se meu filho é 'Nareba', a culpa é dos meus genes de turco", "Chamam a Camilinha de 'Tanajura', quem mandou ela puxar a avó", "Onde foi que eu errei que só chamam esse moleque de 'Arroto'?" e ainda "Tanto trabalho tentando educar e agora ele é o 'Capitão Bagunça', eu não mereço isso".

Alguns apelidos vêm com uma história embutida, o que os torna mais engraçados ainda, como um moleque da minha rua que tinha a língua presa foi apelidado de "Ferol" porque não conseguia de jeito nenhum dizer que ía passar "cerol" na pipa.

Ou a "Marcinha Cistite", que pedia para ir no banheiro umas dez vezes durante as aulas.

Mas outros são depreciativos demais e geralmente a pessoa apelidada só descobre tempos depois que era chamada assim, como é o caso de uma mocinha que fez Segundo Grau comigo que nem desconfiava que era chamada de "Luciana Serra Elétrica" (aquela que não deixa um pau em pé) pelas costas.

Mas tem apelido que o dono faz questão de que todos saibam. Quem não gostaria de ser chamado de "Elvis" ou "Xerife"? Nesses casos há quem apele: "pô, me chama de Surf, aí que eu te chamo de algum apelido maneiro que você queira...".

Certos apelidos são quase universais. É difícil alguma rua, pracinha de bairro ou escola que não tenha um "Cabeça" ou uma feinha que ninguém quer pegar apelidada "Sorriso".

Mas engraçado foi uma vez quando um amigo foi apresentar a namorada para a turma e de repente um deles vira e o chama: "Chega aí, Monstro!".

A menina ficou ofendida e saiu em defesa do namorado:

- Você já se olhou no espelho e viu como é feio e gordo pra chamar meu namorado de monstro?

E o namorado na mesma hora correu para esclarecer tudo:

- Calma, amor, é que meu apelido aqui na rua é Monstro, o Jaba sempre me chamou assim desde que a gente era criança.

Diga-me com quem amas, que te direi quem és

Postado em 8 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 16 Comentários

Dizem por aí que aquele que ama o feio, bonito lhe parece. Não sei se é verdade - eu particularmente acho que existe campo pra discussão aí - mas se é assim, o amor é a versão mais antiga que existe do Photoshop.

Mas se você observar atentamente, verá que as pessoas tendem a formar pares por similaridade. Óbvio que existem exceções, mas é muito comum que busquemos no outro coisas que nos aproximem.


Daí a vermos casais de gordinhos que provavelmente se conheceram em algum rodízio ou que pelo menos passarão a frequentar muitos, casais de marombados (ela parecendo uma Barbie depois da overdose de anabolizante e ele parecendo um remador de porta-aviões), roqueiros, apreciadores de óperas, mauricinhos e patricinhas, gente rica com gente rica, ou seja, pares de quase todos os tipos de pessoas que existem, menos micareteiros, porque estes geralmente gostam namoram o trio elétrico inteiro de uma vez.

Quando essa ordem é invertida, vemos grandes conflitos ou então gigantescas transformações.

Essa é aliás uma coisa que vale até mesmo para os casais mais semelhantes: a convivência de algum modo nos transforma. É praticamente impossível passar muito tempo ao lado de alguém sem adotar para si certas visões de mundo, posturas, manias. Não adianta, o ser humano emula certas características quase que naturalmente.

Seja um sotaque (experimente namorar uma gaúcha pra ver se você não vai falar pelo menos um "tchê" de vez em quando), alguma mania (dormir com 4 travesseiros, por exemplo) ou gostos particulares como passar a beber café de manhã, ir à praia num dia de sol, comer cenoura com chantilly, bem, esqueça essa, isso é só pra quem namorou algum(a) maconheiro(a). São pequenos hábitos que não possuíamos e que passam a fazer parte de nós.


Mas alguns levam esse fenônemo ao extremo, como nas gigantescas transformações que disse antes.

É o caso daquele seu amigo beberrão e notívago, que cultivava com esmero uma poderosa barriga de chopp e por algum motivo encontrou uma gatinha malhada de academia que se encantou pelas suas teorias de mesa de bar, como as "ponderações dialéticas sobre a superioridade dos tremoços sobre os amendoins na degustação da cerveja" e resolveu namorar com ele.

Meses depois você encontra o cara na rua e pensa que ele entrou naquela máquina do filme "A Mosca" e realizou uma fusão molecular com o Paulinho Cintura. O cara está sem barriga, bronzeado, com bermuda e blusa de academia, indo se preparar para correr uma maratona de 20km.

Tem também aquela sua amiga que só se alimentava com comida macrobiótica e tomava suco de gengibre na temperatura ambiente, fazia ioga 5 vezes por semana(sempre corrigindo quem pronunciava o nome errado lembrando que se fala "iôga") e dormia às seis da tarde para acordar as cinco e meia da manhã e fazer exercícios sobre o orvalho.

De repente ela viaja pra São Paulo, vai na galeria do rock, conhece alguém na galeria do rock e quando você a reencontra ela está de cabelo pintado de azul, roupas pretas, virou gótica, passou a detestar sol, passa as noites bebendo vinho com anfetaminas e lendo Edgar Allan Poe.

Mudanças são sadias quando nos acrescentam coisas e com isso não quero dizer que o sujeito beberrão que virou marombeiro se deu melhor do que a natureba que virou filhote de morcego, falo é de portas que as pessoas nos abrem, novas visões do mundo que nos cerca e novas perspectivas.

Parar de ouvir funk, de comer pele de porco todo dia no almoço ou de se vestir de Jedi para ir ao cinema com quase 40 anos são mudanças boas. Virar um babaca completo só porque sua namorada curte intelectuais existencialistas não é.

Transformações e mudanças geralmente são boas, desde que não seja nada tão radical que nos transforme num mutante. Uma coisa é absorver características de alguém, outra bem diferente é servir de Playmobil ou uma daquelas bonecas Polly, que a pessoa coloca do jeito que bem entende para "brincar".

Mudança radical, total, drástica e boa acho que só uma: casar pobre e vira rico.

Quanto custa?

Postado em 7 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 7 Comentários

- Posso ajudar o Senhor?

- Pode sim, coloque preço nas mercadorias e depois me deixe em paz.

Esse diálogo nunca aconteceu (pelo menos comigo), mas em certas lojas dá a maior vontade de fazer isso.

Quem nunca passou por uma loja, viu alguma coisa na vitrine, mas a aparência luxuosa, o exército de vendedores a postos ou a carteira magra desestimulou a pergunta fatal: "quanto custa?".

Em alguns shoppings eu tenho certeza de que fazem isso como uma forma de espantar pobre, é aquele pensamento "se você precisa perguntar o preço, é porque você não pode pagar", que é intimidante, é.

Dizem que tem uma lei que obriga os estabelecimentos a colocar os preços expostos em local visível, mas em algumas lojas eu confesso que seria meio estranho. Imagina uma joalheria colocando "Colar de pérolas negras, R$300.000,00, parcelamento em 68 vezes sem consulta de crédito, quer pagar quanto?". Isso pode ficar engraçadinho nas Casas Bahia, mas para produtos de luxo realmente não pega muito bem.

Comprar um Celta ou um Palio em 48 meses é normal. Comprar um BMW top de linha desse jeito me parece o prenúncio de um oficial de justiça indo na casa do cara fazer a apreensão do possante por falta de pagamento.

Mas ruim mesmo é você perguntar o preço e o vendedor te dizer "isso aí é caro...". Porra, pera aí, você não perguntoi se era caro ou barato, perguntou quanto é. Juro que se eu fosse o Eike Batista me fantasiava de mendigo só pra entrar nessas lojas, receber uma resposta dessas e depois tirar a fantasia e dizer: "Ráááá pegadinha do milionário!".


Pode me chamar de tarado, pervertido ou o que for, mas toda vez que eu penso em vitrine, lembro daquelas virtines de Amsterdã com as mulheres se exibindo. No caso dessa história toda de expor o preço, eu imagino a situação: "duas loiras pelo preço de uma" ou então "parcelamento em 6 vezes com o serviço entregue somente no final". Será que fariam algum saldão?

E por falar em mulher, já notou como as lojas mais caras geralmente são aquelas que colocam as vendedoras mais gostosas para te atender?

Você entra, vê aquele cinto de couro maneirinho, uma morena de olhos verdes daquelas que só sorriem para você quando querem vender alguma coisa te atende, você elogia o cinto e quase chama a fivela dele de "gostosa" enquanto observa o generoso decote, até que depois de muita conversa ela te oferece uma camisa, uma calça e um chaveiro.

A calça parece meio do seu avô, a camisa é estranha, você sabe que nada daquilo está muito bem - além de que vai custar caro - mas ela fica repetindo como você está bonito, como tudo caiu bem, que nem tinha percebido como aquele cinto realçava o equador da sua cintura e mesmo que ela dissesse algo como "credo, você conseguiu ficar pior do que já era quando entrou com essa roupa de Bozo", ainda assim você sorriria agradecido.

Mulher gostosa pode ser a maior cretina que ainda assim será bem tratada por onde for. Esse é o nível de injustiça do mundo, conforme-se.

Mas você não está nem aí pras injustiças da humaninade e tudo o que consegue pensar é em como está animado com uma mulher assim te dando atenção, até que vem a broxada: R$1.899,00 pelo cinto, a calça e a camisa, o chaveiro ela diz que você vai ganhar de brinde. Uau! Se ainda fosse um passeio no provador.

Tem quem faça uma loucura inútil e garanta a comissão da morena. Eu já sou do outro time, aquele que diz que está sem cheque, sem cartão de crédito, sem nada na carteira, mas que vai sacar o dinheiro rapidinho e já volta.

Aí, só pra te fazer se sentir bem mais pobre do que é, ela responde:

- Se o Senhor quiser, posso arrumar um jeito de fazer um carnê.

A favelagem carioca

Postado em 3 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 8 Comentários

Essa cobertura extensa da tomada do "Complexo" do Alemão pela polícia e pelas forças armadas serviu para mostrar um monte de coisas, entre elas o estado de favelização completo em que se encontra o Rio de Janeiro.

Para se ter uma idéia do tamanho do problema, apenas esse conjunto de favelas do Alemão -  que é um dentre muitos - se extende por 15 bairros da cidade, degradando o meio ambiente e emporcalhando a visão.

A cidade sempre sofreu com este problema, desde quando era capital federal e recebia trabalhadores de todo o Brasil até os dias atuais, onde o preço do metro quadrado atinge níveis inimagináveis para um lugar com tantos problemas de infra-estrutura como é o Rio de Janeiro.

Nos espaços onde hoje estão a UERJ (no bairro do Maracanã) e o Parque da Catacumba (na Lagoa Rodrigo de Freitas) antes existiam favelas. Outros locais hoje recuperados da cidade como o Planetário também eram tomados por barracos na década de 60.

A diferença é que os governos daquela época - hoje taxados de higienistas e "anti-pobres" pela indústria faveleira, porque na cabeça deles querer uma cidade mais bonita virou crime - faziam algo efetivo para diminuir o problema e achar soluções reais, que é a remoção e o reassentamento.

Hoje em dia as favelas se tornaram grande fonte de dinheiro, prestígio e votos. São associações de moradores, políticos que fazem currais eleitorais, milícias, empresas que vendem gás e outros serviços, vans e Kombis, gatos de luz, de net, de água, jogos ilegais, agiotagem e, claro, muita especulação imobiliária que se unem para garantir os seus negócios e que o Rio de Janeiro jamais se livre da montanha de barracos que enfeia o seu visual.

Dizem que não se pode tirar aquelas pessoas simplesmente, que é "obrigatório" que as coloquem em locais próximos de onde existe a favela atualmente, como se uma invasão fosse algum direito, como se um imóvel dado ou subsidiado pelo estado já não servisse para satisfazer o direito à moradia.

Uma coisa é morar, que realmente é um direito de todo cidadão, outra coisa é a localização, que é mérito.

Mora em Ipanema quem pode.

Mas como enfrentar essa indústria e esse pensamento padronizado que foi imposto à sociedade demanda riscos políticos, nossos governantes preferem se omitir e não fazer nada a respeito. E quando tentam, logo são lembrados dos prejuízos eleitorais que podem sofrer com isso.

A Lagoa da qual hoje o carioca se orgulha tanto era assim, se fosse hoje,
na era do "direito", imaginem que gracinha seria...

Afirmações e loas cretinas como "favela não é problema, é solução", "Viva a Favela!", e também filmes e outras manifestações artísticas que tentam convencer pela repetição de que aquela degradação da cidade é na verdade um bem "cultural", tudo isso junto com ONGs que vivem muito bem da graninha que arrumam defendendo a favelagem e os sempre presentes "Movimentos Sociais", fazem do Rio de Janeiro um lugar que beira a insolvência urbanística.

Suas ruas apertadas, sua geografia peculiar e o paredão de barracos que sitiam a cidade são a prova disso.

Recentemente o prefeito resolveu remover uma favela chamada "Favela do Metrô", justamente porque fica colada à linha férrea, o que por si só já seria razão mais do que justificável para remover tudo dali. Mas some-se a isso oficinas mecânicas ilegais, desmanches de veículos, carros abandonados e áreas públicas invadidas. O local seria limpo e transformado em parte do novo Complexo Esportivo do Maracanã, que sediará a final da Copa do Mundo.

Pois bem, as tais ONGs, Movimentos Sociais e a indústria faveleira já se uniram e começaram a fazer escândalo contra isso. "Não podem tirar a 'comunidade' dali", "algumas pessoas estão ali há 40 anos!","isso é uma violência!".

Quer dizer então que se eu roubar um carro e conseguir ficar com ele durante 40 anos ele passa a ser meu? Sei que o exemplo é extremo, mas tudo nessa história o é. Não podem tirar a "comunidade" porque? Porque compraram terrenos invadidos da mão dos invasores? Isso é uma "violência" porque? Porque remover pessoas de um local infestado de barracos para colocar em imóveis populares ofende o princípio básico da indústria faveleira que é "depois que invadiu, ninguém mais tira"? Até em áreas de risco comprovado a tarefa da remoção é quase impossível por conta de tanta pressão política.

E a violência contra a cidade que esse monte de favelas representa? A sujeira, a feiúra, a degradação, a informalidade? Isso tudo merece ser premiado?

E tome urbanização, teleférico, maquiagem, porque isso tudo dá voto e perpetua a dinheirama que essas "comunidades" fazem girar diariamente. Solução mesmo que é bom, nada.

E o Rio de Janeiro, que um dia já foi realmente a tal "Cidade Maravilhosa", segue na sua triste sina de violência, caos urbano e descida da ladeira.

Senhor Marido, Dona Esposa

Postado em 2 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 6 Comentários

Pra começar quero deixar claro que acho que todo sujeito que chame a esposa de "patroa" merece ser demitido por justa causa.

Mas é fato que muitos homens por aí se referem à esposa por apelidos românticos como "Dona Maria", "polícia" e até - nesses casos mais graves - "patroa".

Mas esse é apenas um dos muito sinais de que o cara virou o "marido", uma entidade meio universal e que consegue broxar a maioria das relações.

Para ser justo, preciso admitir que esse é um crime conjunto, uma associação. Todo "marido" precisa de uma "esposa", por mais redundante que isso possa parecer. E não tem nada a ver com o casamento, que por vezes pode ser uma doença tão grave que chegam a se referir a ele como "contrair núpcias", mas com a postura que ambos assumem depois do enlace.

Durante o namoro a maioria das pessoas procura impressionar o outro. Sair para lugares diferentes, planejar viagens, surpreender, não deixar que a barriga saia da já inaceitável condição de "pochete" para virar uma "mochila de camping", entre outras coisas. Mas basta vir o casamento e assistimos uma verdadeira transformação nessa relação de tênue equilíbrio.

Dos sábados de amor sem limites e domingos de praia e soneca no meio da tarde eles passam lentamente aos rodízios de pizza, festas infantis e ao temível futebol na TV. Ela que não podia passar de shortinho na frente dele agora continua não podendo passar, só que para não atrapalhar a visão da cobrança de penalties.


E aquelas sextas-feiras em que ele esperava ansioso pra ver qual programação ela inventaria - que podia ser uma exposição legal, um filme cult ou até um queijos e vinhos - agora viraram um jogo semanal de buraco com alguns vizinhos em que todos passam a noite na empolgante atividade de falar mal dos outros e conversar sobre o colégio dos filhos enquanto bebem cerveja e se empanturram de amendoins e Doritos.

De uma hora pra outra eles percebem como tudo mudou. Ela olha para o lado e vê o Homer Simpson, ele olha pro lado e vê a sua tia que fritava pastéis em todas as festas da família.

Quais seriam os próximos passos nessa descida da ladeira? Fazer suas necessidades enquanto o outro toma banho? Um na frente do outro discutindo sobre a conta de telefone? Ela passar a chamá-lo pelo sobrenome? Essa aliás é uma das coisas que mais me assustam quando vejo certos casamentos, a mulher falando do marido usando o sobrenome.

- Você não sabe a última que o Almeida aprontou...

- O Duarte gosta das camisas dele muito bem passadas.

- Eu acordo cedo todo dia para preparar o café com leite do Meireles.

O equivalente é ele chamá-la de "mãe". Porra, dá licença, ela pode até ser mesmo mãe dos seus filhos, mas para ele não pode nunca, jamais, de forma alguma ser a "mãe". Porque como é que funciona isso? Chega a noite e ele vai pra cama e come a "mãe"? Não dá, simplesmente não dá.

As pessoas se largam tanto durante um casamento que desde a sabedoria popular até qualquer artigo de revista vagabunda que fale de traição, todos apontam como primeiro sintoma a pessoa se cuidar melhor.

A mulher volta a cortar o cabelo e a tingir eventuais mechas brancas, o cara raspa aquele bigode ridículo e entra para uma academia, ela volta a fazer as unhas, ele deixa de usar cuecas furadas, ela fica menos disponível, ele passa fatalmente a desejá-la mais por conta disso (o que o fato dela aposentar as calcinhas bege também ajuda bastante), enfim,  voltam a agir como se fossem namorados - só que agora de um suposto "outro(a)" - e saem do papel de "marido" e "esposa".

Já ouvi por aí que se o namoro é tão bom, se o segredo dos casais felizes é se manterem eternos namorados, não existe nenhuma razão para mudar esse status e casar, o que só complica tudo.
Os mais radicais resolvem isso correndo pra alguma casa de swing, trocando chifres em comum acordo. Outros se divorciam, passam a agir totalmente ao contrário do que faziam quando eram "marido" e "esposa" e algumas vezes até se apaixonam de novo num eventual reencontro, quando podem olhar um para o outro sem o peso daqueles papéis.

A verdade é que tudo isso é muito mais culpa nossa do que do outro, entende? É uma troca. Ela vê seu bigodinho de escova de pia e passa a usar aquelas calcinhas bege da avó, você se frustra porque ela agora não quer mais dar umazinha na volta da praia porque está preocupada com o almoço e se vinga passando o resto da tarde vendo televisão, ela te chama de "Sampaio" e você começa a chamá-la de "patroa", e por aí vai.

Melhor nem começar.

Nossas escolhas

Postado em 1 de dez. de 2010 / Por Marcus Vinicius 4 Comentários

"Seu" Paulo é torcedor do Flamengo, "Seu" Olavo é torcedor do Vasco, "Seu" Luiz é torcedor do Botafogo e "Seu" Manoel torce pelo Fluminense. A primeira estranheza é essa, um Olavo torcedor do Vasco enquanto um Manoel é tricolor.

Quando resolvem falar de futebol, cada um é uma enciclopédia mais infalível que o outro:

- Lembra aquela final que o Vasco ganhou com um gol do Cocada?

- Não era Cocada, era Cuscuz.

- Que Cuscuz nada! Era Cocada mesmo...você entende muito é daquele paraguaio, o Juancito!

- Romerito, Juancito foi aquele que jogou no Botafogo junto com o Túlio Maravilha...

- Nunca teve Juancito no Botafogo, no máximo tem um Loco Abreu.

- Nem quero saber, meu negócio mesmo é o Zico e o time de 81.

Entre confusões naturais e gozações futbolísticas, todos eles realmente tinham excelente memória (ou quase), isso porque é quase certo que nenhum deles saiba o nome do sujeito no qual votou para deputado.

Dizem por aí que o brasileiro tem memória curta, mentira. Experimenta dever dinheiro pra alguém e veja se nossa memória é mesmo curta. Nossa memória é seletiva e muito mal programada.

Certas coisas um homem tem a obrigação de lembrar. Seu endereço, seu telefone, sua identidade e o nome do primeiro amor. O resto a gente escolhe.

Uma pesquisa recente mostrou que mais de 20% dos brasileiros não conseguem lembrar o nome do deputado em que votaram na última eleição. Mas note que esta pesquisa foi realizada apenas um mês após a eleição, o que me leva a pensar que daqui a mais um mês esse número possa ser 40% ou quem sabe até 50%.


Em dois anos talvez existam mais brasileiros que saibam cantar de trás para frente do hino do Japão do que os que saibam o nome do "seu" deputado estadual, federal ou senador.

E isso transforma o Congresso numa espécie de massa amorfa de sem-vergonhas. São os "ladrões", os "corruptos", os "canalhas", os políticos. Tirando um ou outro que se empenha mais em aparecer num escândalo de maior proporção, todos ali tem mais ou menos a mesma feição perante o resto do país: são "eles".

"Eles não ligam para a gente", "eles só querem saber de roubar", "pra eles a coisa nunca está ruim", "eles vivem na maior mordomia às nossas custas".

Fala-se de políticos em bares, filas de banco e almoços de domingo como se fossem personagens de uma novela da televisão, uma história de ficção que está desconectada da realidade.

O brasileiro decora mais facilmente um bordão televisivo, uma piada, nomes de personagens de novela ou uma letra de axé - se bem de que decorar letra de axé não é tarefa que exija lá grande quantidade de neurônios - do que guarda o nome da pessoa que irá representá-lo na Brasília-Maravilha durante pelo menos quatro anos.

Tudo bem que não são pessoas exatamente agradáveis de se pensar diariamente, mas até no futebol - essa paixão do país monoesportivo - a gente faz questão de lembrar da derrota de 82, do penalty que o Sócrates perdeu em 86, do passe do Maradona para o Caniggia em 90 que afundou aquela Seleção do Lazaroni, da borboletada do Marcos jogando pelo Palmeiras no Mundial de 99.

Se dizem que todo brasileiro é um técnico de futebol, todo brasileiro também é ou será eleitor por força de lei. Talvez seja essa a diferença: ninguém obriga o outro a assistir um jogo, mas depois de certa idade todo mundo é obrigado a ir lá exercer o que chamam de direito.

Durante muitos anos eu só acompanhei jogos de tênis. Conhecia o Ivan Lendl, Boris Becker, John McEnroe e nunca mais esqueci as pernas da Steffi Graff. Futebol não era a minha nesse tempo e se você me perguntar quem era o goleiro da Seleção naquela época, não saberei responder nem se você me oferecer uma boa grana pra isso. Essa era minha escolha.

Assim como escolho ir votar em cada eleição, sei o nome do "meu" deputado, observo sua atuação e faço questão de não maltratar a urna dali a quatro anos.

E talvez a urna só não seja mais maltratada no dia em que todos os brasileiros puderem optar entre a praia e a urna, o pagode e a urna, a micareta e a urna, o nada e a urna.

E cada um continue lembrando do que bem quiser.
 
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