O que as futuras gerações dirão de você?

Postado em 9 de fev. de 2011 / Por Marcus Vinicius

Quando penso que a minha tataravó se casou com 13 anos, não posso deixar de me espantar com o fato de eu nunca ter casado mesmo já tendo passado (um tantão) dos 30.

Junto com a expectativa de vida que faz com que nosso sistema previdenciário seja um problema real, e com que as filas de banco demorem uma eternidade com todos aqueles sexagenários retirando suas pensões, as comparações entre gerações escancaram o tamanho da imaturidade - e não digo isso num sentido ruim ou crítico - das pessoas, digamos assim, mais contemporâneas.

Como a minha e a sua avó diziam, somos verdadeiros crianções.

Crescemos ouvindo histórias sobre um tataravô que fugiu aos 16 anos da fazenda com sua namoradinha de 12 que estava prometida para outro e foi morar na cidade grande, num quartinho do tamanho de uma solitária de presídio, trabalhando num armazém de secos e molhados carregando caixas de bacalhau na cabeça e que, depois de labutar não sei quantos anos dia e noite, hoje é aquele senhor de cabelos brancos sentado na sua frente na ceia de Natal.

Você sinceramente se imagina fazendo tamanhas loucuras hoje, com 20, 30 ou 40? Imagine então aos 16. Se fosse hoje em dia talvez houvesse até uma lei transformando isso em contravenção ou pelo menos em algo politicamente incorreto e reprovável.

Nossos pais foram vendedores, trabalharam de dia para estudar à noite, casaram por volta dos 18 e aos 25 já tinham filhos, casas, todos os amigos casados e alguns cabelos brancos e entradas na testa.

Já faz alguns anos que meu pai desistiu de me dizer que "com a sua idade, eu já era seu pai". Daqui a pouco ele me avisa que com a minha idade "já era avô".

As gerações passadas, com todos os seus defeitos, estão repletas dessas histórias de amadurecimento, que na época deles nem era precoce, histórias de renúncia, de sacrifício, de trabalho duro.

E nós? Nós fazemos parte do mundo globalizado, de infâncias e adolescências cada vez mais longas, das viagens de férias, dos playgrounds, shoppings e condomínios.


Jogamos vídeo game até os 40 e tantos, curtimos engenhocas eletrônicas, nos acostumamos à famílias tão heterodoxas quanto aquelas formadas pelos nossos pais, com seus novos cônjuges e filhos, todos reunidos em volta de uma mesa na festa de aniversário.

Eles não. Eles chamavam divórcio de "desquite" e mulher divorciada passava automaticamente a ser "aquela ali". Não era legal, mas imagine viver com essa pressão à sua volta.

Não lutamos nem derrubamos nenhuma ditadura, não corremos da polícia a não ser para jogar a ponta do baseado no bueiro mais próximo, ouvimos rock pesado e música eletrônica, ostentamos cortes de cabelo estranhos e roupas coloridas, com frases engraçadinhas e talvez continuemos assim por um bom tempo.

Temos até um certo orgulho de nossa imaturidade.

Não me imagino de chapéu, de terno xadrez ou curtindo passar as manhãs numa praça vendo as babás e jogando damas numa mesa. Não tive e nem sei se teria a tenacidade suficiente para passar pelas coisas que meus bisavós ou avós passaram na vida deles.

Pense só nisso: essa gente viveu uma guerra mundial. Nós vivemos o que? Os paredões do BBB? Não tenho esse conceito de que só porque o sujeito é coroa passa a ser mais sábio automaticamente. Pode ser que ele tenha passado a vida inteira fazendo merda e só deu sorte de não se ferrar, quem garante?

Nossos netos terão avôs e avós tatuados e que além de saberem o que é, nem vão se horrorizar ao ouvir alguém falar de coisas como "casa de swing", "casamento homosexual" ou a Família Sarney (essa não conta, porque até nossos avós já conhecem).

Não vai deixar de ser legal sentar um dia com um neto (se eu viver para conhecê-los) e contar sobre um show do Morrissey, sobre a era da internet discada, sobre a primeira TV a Cabo ou mesmo sobre como minha geração pode perder a virgindade sem ser com uma prostituta com idade para ser nossa tia.


Mas de qualquer forma é de se admirar as histórias que eles todos contam sobre o que viveram.

A menos, é claro, que tudo isso seja uma grande pegadinha coletiva que eles criaram para nos enganar, e que nós vamos passar adiante para nossos filhos e netos, como uma espécie de trote da tal "faculdade da vida".

9 Comentários:

Anônimo postou 9 de fevereiro de 2011 às 08:02

Muuito bom mesmo! Hoje só sabendo sentar o traseiro no sofá e reclamar de coisas que não temos a capacidade de tomar providência. Falou tudo...

Leandro Moraes postou 9 de fevereiro de 2011 às 08:24

Meus filhos irão me perguntar como eu conseguia viver num mundo onde não se resolvia tudo em casa pela internet.

Anônimo postou 9 de fevereiro de 2011 às 11:44

Oi Marcus.
Acho que somos da mesma geração essa dos trinta e poucos muitos anos,rs.
E aqui em casa também rola esse papo de fugir com vó aos 13 anos, família que saiu do nordeste e fez a vida no RJ e tal. Acho admirável gosto de ouvir mas não me veria em situações nem de perto parecidas. A época deles devia ser bem chata, aos meus olhos, sem muitas opções de entretenimento, a diversão era fazer filhos. Acho que a independência financeira, morar sozinho, ser resolvido, decidir a própria vida não é muito entendido por eles, que prezavam pela família grande e cheia de crianças. O mundo está mais imediatista, as pessoas mais individualistas e sem lugar pra dividir tanto. Outro dia falando com meu pai pelo telefone (ele não mora na minha cidade), ele ficou com dó de mim porque eu disse que ia passar o carnaval sozinha.
- Mas sozinha ??
- Sim s o z i n h a !! Ele não entende essa minha necessidade.
Enfim, nossos netos serão muito mais descolados que eles e que nós também.
Desculpa viajei, rs

Beijos

Ninon postou 9 de fevereiro de 2011 às 16:11

Pois, sempre me faço essa mesma pergunta... Minha relação com meus pais, sempre foi mto aberta, sempre contei absolutamente tudo para minha mãe e sei que ela também sempre me contou tudo. Outro dia ainda dizia pra ela, que parece que minha vó, pra mim, sempre foi uma pessoa velha e minha mãe, nova, e ainda a considero assim. Mas e meus filhos, com certeza a verão como velha... é como diz a música, daquele desenho: "o ciclo sem fim, que nos guiará". E para mim, é assim mesmo, pretendo ter com meus filhos a mesma relação que tenho com minha mãe, que é de longe, minha melhor amiga!! E é desde que eu me conheço por gente!! As vezes eu penso nas coisas que ela me conta, de como eram as coisas qdo ela casou com meu pai e me acho tão criança, aos quase 30 anos e mãe de 2!! Em vários pontos sei que sou... Amo me jogar no chão, brincar de LEGO, de boneca, de carrinho, trenzinho... uma eterna criança, em corpo de mulher, em corpo de mãe.
Obrigada por esse post!!! Acho que foi um dos melhores que vc já escreveu!! (Bem que te acompanho nem faz tanto tempo assim, mas li alguns seus pra trás.)
Ahh, só para constar, quem me indicou ler vc, foi minha mãe!! E ela sempre comenta suas publicações tb. Vamos ver se ela vai comentar essa!!! hehehehe

Bjos!!!

mvsmotta postou 9 de fevereiro de 2011 às 17:12

Ninon,

Agradeça à sua mãe pelo carinho e seja bem vinda.

Beijos

Unknown postou 10 de fevereiro de 2011 às 14:19

"As gerações passadas, com todos os seus defeitos, estão repletas dessas histórias de amadurecimento, que na época deles nem era precoce, histórias de renúncia, de sacrifício, de trabalho duro."
Marcus, ainda não me sinto madura o suficiente para dizer que sei tudo... nada sei ainda, aos 57.
Mas desde os 23 assumi uma vida
de dedicação e muito trabalho braçal, porque quem é mãe e" dona de casa" faz de tudo para criar uma situação confortável para os filhos. Trabalhei num ancianato por 16 anos, como orientadora de idosos, nunca tive empregada doméstica e saía da maternidade com os pontos da cesárea, sem fazer resguardo, direto para o trabalho. Tive 3 filhos, mas perdi a primeira e os 2 homens que eu mais amo estão na faixa dos 30.
Não segui a renúncia ao meu direito de ser feliz ficando num casamento desagradável, donde casei 3 vezes e estou me divorciando agora.
Na realidade eu acredito em encontro especial de gerações, coincidindo nascerem todos na mesma época, e vindo com tudo para modificar. Sou uma delas. Ah, meu querido Hesse em Lobo das Estepes, Demian e Sidarta, Gibran, Vandré,
Chico e Lennon.
Não somos melhores, mas andamos com pessoas mais iluminadas e mais corajosas.
Mas, você, pode ter trinta e uns tantos, mas veio para arrebentar e é o que nós adoramos e respeitamos.
Mais uma vez, surpreendente e revelador...
Beijos
Angela Vieira

Fernanda Lizardo postou 14 de fevereiro de 2011 às 05:40

Meu namorado diz que "temos a felicidade de ser a última geração que teve o privilégio de passar a infância sem internet". De certa forma, acho que ele está certo.
Tecnologia é legal, mas o pessoal que está vindo por aí anda bem acomodado. Hoje, para fazer revolução basta colocar um # antes da palavra e pronto.
Eu saí de casa aos 14 anos. Tudo bem que com o aval dos pais: a gente morava numa vila de uns 10 mil habitantes no interior do Pará e eu precisei sair para estudar. Mas não era mole: a grana era curta, tudo contadinho e eu tinha de ser responsável o suficiente para usar o dinheiro para pagar o material de estudo e comprar comida em vez de gastar tudo num baseado (as pessoas ainda se chocam quando eu digo que nunca experimentei maconha ou qualquer outra droga, mesmo tendo morado em Ouro Preto). Acho que essa experiência ajudou bastante - e explica o fato de, aos 29 anos, eu conseguir me manter sozinha, viver confortavelmente e segurar a onda de muita gente à volta (emocionalmente falando, inclusive). Dizem que toda geração é nostálgica e que sempre parece que as gerações anteriores sofreram mais e fizeram mais (é como criticar o pessoal do Restart e esquecer que na nossa época houve algo como os Menudos). Eu costumava acreditar nisso, mas agora não sei mais. A impressão que tenho é que todo mundo está ganhando um medo imenso de viver e de assumir responsabilidades, e que futuramente toda a população de 35 anos ainda morará com os pais (e dependerá financeiramente deles) e só levantará da cama com uma boa dose de Prozac.
Abração!

mvsmotta postou 14 de fevereiro de 2011 às 06:34

Fernanda,

Essa época nem vai demorar tanto, visto que é raro eu conhecer pessoas entre 25 e 30 que não morem com os pais e ainda não recebam uma mesada.

Dizem que é a evolução, sei lá, em todo caso, confortável é.

;)

Bruno postou 6 de junho de 2011 às 00:22

Posts como esse me fazem esquecer os problemas da semana e me motivam a sair do pc e estudar (o máximo que esse menino de 18 anos dessa geração tão "facilitada" pode fazer por hora), parabéns tu escreve muito bem :3

 
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