Eu te amo, mas vai pra...

Postado em 23 de out. de 2012 / Por Marcus Vinicius

Vocês estão juntos há algum tempo e sua relação chegou naquele ponto em que já é longa demais para só "deixar levar" e ainda é recente o bastante para que não sofram aquela velha pressão social por se enforcarem na frente de um padre.

O problema é que relacionamento é igual um tubarão. E antes que você pense em mordidas e canibalismo (que não estão totalmente descartados dependendo do seu tipo de relação), é com outra característica desses animais que todo casal se parece: tubarões utilizam a sustentação dinâmica para manter a profundidade, e afundam quando param de nadar.

Em outras palavras, todo mundo precisa se movimentar, senão afunda. 

Daí a existir casais que passam a vida brigando, porque, afinal, se eles não tem para onde ir, pelo menos se mantém em movimento e assim não vão para o fundo do poço - que, por sinal, geralmente sempre tem um subsolo. 

Relacionamentos iô-iô, brigas e reconciliações, DRs (discussão de relação) eternas, bate-bocas até para resolver se vão comer pizza de presunto ou calabresa. Certos casais, de tanto que deliberam sobre qualquer coisa, terminam parecendo mais uma reunião de condomínio.

Até que chega aquele momento em que ninguém sabe direito como foi parar ali. 

Vocês brigam, ela sai batendo a porta, você apaga o número dela do seu celular. A raiva aumenta, você liga o computador e apaga todas as fotos juntos, enquanto ela corta com uma tesoura todas as suas roupas que estavam na casa dela. 

Encontram os amigos e falam coisas escabrosas um do outro, como aquela mania irritante dela falar com voz de criança ou o fato de você usar o mesmo par de meias durante três dias seguidos. A coisa avança e você descobre que ela andou chamando sua mãe de "neurótica do pudim de leite" enquanto você é o "tarado do controle remoto", como vingança você espalha pra todo mundo que o pai dela já teve um filho com uma empregada e assim a coisa vai ficando cada vez mais feia.

Até que bate a saudade.

Primeiro nenhum dos dois dá muito o braço a torcer. Ela cria perfis em sites de encontro, você sai para beber com os amigos e termina a noite em boates de strip tease. Liga pra ex-peguetes, ela resolve sair com aquele chato que a tia vivia querendo apresentar, mas nada parece ter a mesma graça.

Até que vocês começam a emitir sinais de que desejam uma reaproximação. Sabe como é, uma ligação só pra avisar que precisa devolver um CD que ficou contigo, ela te encontrando na rua e dizendo que lembrou de você quando foi tomar milk-shake de jabuticaba (ninguém mais além de vocês dois gosta disso).

Não há quase nada que um tempo longe não resolva. Você esquece que ela é chata com esse negócio de ecologia (aqueles avisos "pense no meio-ambiente antes de imprimir" no fim dos emails dela nem te irritam mais tanto), ela acha que um futebolzinho no final de semana não é tão imperdoável, afinal exercício é bom para a saúde e todos os defeitos de um e de outro vistos à distância nem parece tão defeitos assim.

E vocês finalmente resolvem se encontrar pra conversar. Tanto tempo junto, tantas histórias, não tem como deixar isso assim para trás, deixar que termine com um simples "vai você pra putaquepariu!" e uma porta batendo. Pelo menos uma conversa vocês devem um ao outro.


Segundo ensinam os filmes de Hollywood isso termina com vocês dois dizendo que se amam e fazendo aquele make up sex hardcore, com direito a brincadeira com geléia de manhã e tudo.

Mas sua vida nunca foi hollywoodiana, você não gosta de comédias românticas e no final das contas sabe que vai acabar acontecendo alguma cagada de novo. E como poderia saber isso? Fácil.

Se telefonam, marcam um encontro, você vai pra lá certo de que o melhor é resolver tudo, dizer o quanto a ama, pedir para voltar e serem felizes para sempre, sentam e começam aquela conversa que supostamente terminaria na cama.

- Quanto tempo, né? - Você diz

- Pois é...

- Então queria te dizer uma coisa...

- Antes me deixa falar primeiro. Olha, eu gosto muito de você e estou disposta a te dar outra chance. Basta você deixar de ser infantil, vagabundo, parar de andar com aqueles retardados dos seus amigos, troque de meia todo dia, não deixe a toalha molhada na cama e pare com a sua ditadura do controle remoto...

- Tudo bem, mas olha...

- Eu não acabei ainda. Você precisa sair da barra da saia da sua mãe, precisa acabar de uma vez por todas com essa amizade esquisita que tem com aquela galinha do seu trabalho, sem contar a sua mania insuportável de ouvir música aos berros.

- Mas, eu só...

- Eu prometo que não reclamo mais do seu futebol no sábado, é bom fazer exercício, mas de nada vai adiantar se exercitar se você continuar se entupindo de chocolate e carne vermelha, além do que isso de jogar vídeo game é coisa de moleque, você não é mais um moleque ainda que pense que ainda é.

- Já terminou?

- Quase. Você só fala de carros, futebol, filmes de ação e faz piadas escatológicas, que tal conversar sobre moda comigo de vez em quando? Além do mais, eu preciso de um homem que respeite minhas opções pessoais, que não implique com minhas viagens de negócios, que entenda caso eu não queira transar por duas semanas seguidas se eu estiver muito ocupada e, claro, que faça planos para o futuro e não só para as próximas férias.

- ...

- Pronto, terminei. O que você queria me falar?

- Sabe se o meu CD do Whitesnake ficou contigo?

- Era isso?

- Basicamente. Tá afim de um milk-shake de jabuticaba?

- Vai pra putaquepariu, vai.

Seja o primeiro a comentar!

 
Template Contra a Correnteza ® - Design por Vitor Leite Camilo