O Rio que passou pela Rio Branco

Postado em 18 de mar. de 2010 / Por Marcus Vinicius

Era mais ou menos 16:40 da tarde quando resolvi sair do meu trabalho para observar e, porque não, participar da manifestação convocada pelo governo do Rio de Janeiro contra o linchamento regimental que o estado sofreu com a assim chamada "Emenda Ibsen".

Antes de mais nada, falemos da parte chata, que é a técnica. O petróleo descoberto em alto mar é propriedade da União, que como forma de compensação pelo impacto ambiental de sua exploração e pelo impacto social que o contingente de pessoas que acomete aos locais que servem de base para sua exploração causam, repassa um valor maior a estes estados e municípios.

O atual regime de compensação funciona assim, mas a descoberta da camada pré-sal gerou um fato novo, que consiste basicamente no seguinte problema: como repartir tamanha riqueza e espalhá-la como benefícios por toda a nação?

Claro que essa quantidade imensa de recursos despertou cobiça e os demais estados não-produtores começaram a exigir uma fatia maior desse ganho futuro. O governo Lula, na ânsia de agradar eleitoralmente suas bases em todo país, apresentou uma forma de divisão dos royalties deste petróleo diferente, que "dividia mais o bolo".

De forma inábil e sem pensar que a quantidade absurda de petróleo ali existente compensaria a diminuição da porcentagem do repasse de verbas originadas por ele, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, disse que o Rio estava sendo "roubado" pelos deputados e não se dignou a negociar seriamente o assunto.

Como uma espécie de punição a um garoto mal criado, a Câmara dos Deputados, aquela casa de tolerância que decide às vezes o futuro da nação, através de emenda apresentada pelo ex-anão do orçamento e deputado cassado Ibsen Pinheiro, resolveu mexer até no que já existia. Ou seja, os 7 bilhões por ano que o Rio já recebia por conta do petróleo que era explorado antes do pré-sal também entraram na divisão e desta forma o estado passaria a receber apenas algo em torno de 100 milhões por ano, caindo de 1º para 22º na lista de recebedores destes recursos.

Obviamente isto inviabilizaria financeiramente o estado e literalmente quebraria a região norte deste, formada por municípios que vivem quase que exclusivamente dos dividendos da exploração do petróleo.

E dessa forma, tal qual patos que a cada passo dão uma defecada, os atos dos nossos políticos nos levaram à tal manifestação que fui acompanhar.


Foto: Agência O Dia


Pronto, chegamos à parte boa. O que vi ali?

Primeiro de tudo vi centenas transformando a avenida Rio Branco, uma das principais ruas da ex-Capital Federal, em um rio de gente. Pessoas vindas de todos os lugares do estado, estado este que perdeu muito com a mudança desta capital para Brasília e não recebeu compensação alguma por isto.

Vi pessoas carregando as bandeiras azuis e brancas do Estado do Rio de Janeiro, sem se importar com o fato desta bandeira ter-lhes sido imposta. Metade dos que ali estavam eram do antigo Estado do Rio, a outra metade do extinto Estado da Guanabara.

Esta fusão, feita autoritariamente pela ditadura militar, trouxes problemas estruturais gravíssimos, que até hoje perduram e, mais uma vez, nenhuma compensação.

Finalmente vi pessoas reclamando a possível perda de 7 bilhões, sem se dar conta que já haviam perdido outros 7 bilhões, quando a cobrança do ICMS (que é o principal imposto estadual) do petróleo foi forçadamente feita no destino e não na sua origem com é com o carro de São Paulo e a carne do Rio Grande do Sul, por exemplo.

Com essa cobrança diferenciada do que ocorre com todos os produtos, de todos os estados, menos o petróleo, o Rio de Janeiro recolheria outros R$ 7 bilhões. Mas não pode cobrar. Somadas as perdas, são 14 bilhões de reais.

Costumo dizer que nosso estado produz os piores políticos que se tem no Brasil, e acho incrível que num país de péssimos políticos isso possa ser possível, mas não é somente essa a causa de tantas mazelas que o estado enfrenta, como a poluição, o caos urbano, a favelização, a violência, a ignorância disseminada.

Recebemos aqui imenso contingente de migrantes de outras regiões, gente que vem atrás de uma vida melhor e termina deteriorando a sua própria qualidade de vida e a dos cariocas e fluminenses com o inchaço urbano. É preciso dinheiro para cuidar de toda essa gente.

Sei que os recursos são na maioria das vezes mal aplicados, sei que o Rio de Janeiro poderia estar muito melhor se tivesse governantes melhores nos últimos 30 anos, mas não será tirando mais dinheiro e lesando mais uma vez o estado que algo irá melhorar.

Esses 7 bilhões que tanta falta fariam aqui, serão pulverizados no buraco negro dos municípios, dissipado nos desvios que todos conhecemos. Terminará não servindo para mitigar nenhum dos problemas dos seus recebedores e para piorar ainda mais os de quem perderá essa quantia.

Como muito bem disse o Secretário de Fazenda, Joaquim Levy, vai ser um dinheiro que garantirá "mais algumas festas de São João no Nordeste", ao que acrescento: e mais algumas favelas e problemas no Rio.

O deboche de Ibsen Pinheiro, dizendo que o Rio não é produtor e sim, no máximo, um lugar com "excelente vista para o mar" e que "podem juntar até um milhão de pessoas nas ruas que nada vai mudar", não é de se espantar. Vindo de um elemento que já foi cassado e que, como todo bom político, pouco se importa com os destinos do povo, sabemos que ele vive para o jogo, porque se prestasse para outra coisa melhor não faria parte da classe mais detestada do Brasil.

Mas a pergunta que fica é: até quando o Rio de Janeiro servirá apenas de outdoor do Brasil, de propaganda turística, sempre sendo lesado quando existe uma oportunidade?

Porque então não dividirmos o dinheiro do minério de Minas e do Pará, da indústria de São Paulo, da carne do sul, da agricultura do centro-oeste? Porque cada lugar precisa viver do que produz, e sim, o petróleo é do Rio de Janeiro.

Esta não é uma questão partidária, não é uma questão de apoiar ou não políticos especificamente, não é nem mesmo uma questão pessoal de cada carioca e fluminense, esta é uma discussão que influenciará na vida de nossos filhos e netos.

Dele, depende um surpreendente surto de bom senso da súcia de Brasília e a nossa capacidade de mostrar a eles que uma hora, alguma hora, ainda que tarde, o Rio também saberá dizer "não".

20 Comentários:

Léo Brossa postou 18 de março de 2010 às 08:40

Cara, belo artigo. Estive lá ontem e confesso que fiquei feliz em perceber que o ato foi menos político do que eu imaginava.

Vi realmente as pessoas preocupadas e engajadas e não deixar o Rio sofrer novamente uma grande perda, como você pontuou.

Estava na hora de mostrarmos que o povo Fluminense tem fibra e sangue nos olhos quando precisa e não apenas um ícone turístico e cultural, como os outros estados nos vêem.

Carlos Alberto postou 18 de março de 2010 às 08:58

Lamento que tenhamos chegado absurdo de ter que decretar ponto facultativo no Estado e nas prefeituras para que funcionários, de carreira ou não, bem como contratados, tivessem que ocupar as ruas do Centro da cidade, para um showmício - mais show que "mício". Isto deve-se, assim vejo, ao fato de não termos governo Central e estadual, bem como representantes na Câmara Federal suficientemente qualificados para ocuparem os espaços públicos que ocupam. Culpa nossa? Claro! Vejamos: o governador alega e até se gaba de ter com o presidente Lula e a ministra Dilma íntima afinidade e estreita parceria institucional. Pois bem, por que não os alertou sobre a aberração da emenda Ibsen e suas nefastas consequências - não só para o RJ e ES, mas para a Federação? O presidente tem o dever de resguardar a harmonia federativa. Estaria o governador de ressaca do Carnaval ou ainda encantado com a sua Paris? E a inércia da bancada fluminense na Câmara? Como permite que tramite normalmente uma proposição que inviabilisa o Estado do Rio de Janeiro? Deveriam estes usar de todas as prerrogativas da bancada. Permitir que a matéria fosse à CCJ é prova da inércia dos representes nossos, e deixar que fosse aprovada é prova de total descaso. Pois bem, depois de aprovada na Comissão, deveriam os deputados requerer na Justiça sua inconstitucionalidade. Nenhum o fez! Posteriormente a matéria entra em pauta quase imediatamente. Metaforicamente, a avenida estava descongestionada. Deveriam usar dos expedientes regimentais para obstrução das matérias em trâmite antes que chegasse a votação da descabida emenda para, no mínimo, adiá-la com pedidos de verificação para contagem de quorum, o que, fatalmente, faria cair as seções, pois tão ausentes quanto os nossos, são os outros. E as matérias são aprovadas por acordo de lideranças, não necessitando estarem presentes grande número de parlamentares. Como demonstro, o presidente, o governador e a bancada federal fluminense não tomaram qualquer atitude para impedir o facílimo trâmite e a tranquila aprovação da emenda Ibsen. Agora, um showzinho cai bem. E, quem sabe, estes inertes e irresponsáveis não saem bem na foto? Talvez virem heróis! Agora é a vez do Senado se posicionar, e não espero que derrube a emenda por ser este poder a representação dos Estados-membros, sempre ávidos por recursos, restando quase impossível que seus representantes votem contra isso, mesmo que tenham consciência da inconstitucionalidade do tema. Enfim restará ao Supremo - e este não terá como fechar os olhos ao § 1º do Art. 20 da Constituição - por fim a essa insanidade legislativa e perigoso confronto federativo.

Fran Alves postou 18 de março de 2010 às 10:20

Belo artigo ,escreveu sua opinião com consciência que o Rio , não precisaria passar por isso se governos anteriores tivessem usado o dinheiro para seus devidos fins , ajudando a população.

deliziardi postou 18 de março de 2010 às 10:26

Belo artigo, sou do estado do Rio Grande do Sul, onde muitas pessoas e liderenças políticas não apoiam a medida do Ibsem. Eu sou um desses...
Parabéns pelo texto.

André Liziardi.

Isabel postou 18 de março de 2010 às 10:34

Excelente texto! Disse tudo! :)
Pena que não deu para ir na manifestação...

Gabriela postou 18 de março de 2010 às 10:48

É fácil entender a indignação de quem perde alguma coisa, mas não devemos engolir que essa perda sempre se dá diante de uma injustiça.

O petróleo não é do Rio de Janeiro, ele é da União. E ele é explorado com recursos federais, não com recursos do estado do Rio. Portanto, ele pertence a todos nós, brasileiros.

A Constituição garante que o estado onde se exlorem recursos minerais obtenha uma participação nos lucros ou seja compensado financeiramente por essa exploração. Mas temos que lembrar que a participação nos lucros deve ser justa ou que a compensação pelos possíveis danos ao ecossistema se dê na proporção dos prejuízos suportados, pois assim determina a nossa legislação.

Entender de outro modo, é privilegiar um estado (rico, diga-se de passagem) em detrimento de tantos outros entes federados, que não tiveram a chance de receber os mesmos investimentos da União.

É justamente para corrigir tais distorções que se impõe a sistemática do ICMS que foi mencionada no texto. Porque o lucro obtido pelo estado com o ICMS, nesses casos, também vem do investimento em recursos minerais feito pela União. Naquelas situações, circulam produtos cuja produção foi viabilizada através de recursos federais.

Os recursos minerais do País são bens da União e só podem ser por ela explorados ou com a sua autorização. E da mesma forma como ocorre com o petróleo, os estados tem uma participação nessa exploração. Assim, nada mais justo que, havendo capital federal investido, os lucros sejam repartidos para todos. O carro que vem de SP e a carne do RS são produzidos com recursos privados. A situação é outra.

Tudo o que se quer com essa emenda é corrigir uma situação de privilégio injustamente criada em benefício do RJ, em que um lucro enorme obtido com investimentos da União fica retido em apenas um estado, quando temos um País inteiro precisando também desses recursos.

Espero que os cariocas entendam isso sem mágoas.

mvsmotta postou 18 de março de 2010 às 11:07

Na verdade, Gabriela,

Tudo que se quer com essa emenda é avançar sobre recursos de um estado, utilizando-se para isso a tática de rapinagem em bando.

O petróleo é prospectado por empresas privadas, sediadas no estado, não só a Petrobras. Quer um exemplo? A OGX.

Se essa conta entrar como investimento da "união", então os empréstimos que agricultores e fabricas pegam no BNDES entram também e tem que se dividir todo o bolo do minério de Minas, da carne do Sul, dos grãos do Centro-Oeste.

Tudo também sem mágoas.

Um abraço,

Marcus

Gabriela postou 18 de março de 2010 às 11:56

Marcus,

o petróleo é um bem da União, não é de um estado. Se alguma empresa de capital privado quiser explorá-lo, deverá ser com o consentimento da União que deverá levar em consideração (ao menos em tese) o interesse de toda a nação para permitir que seus recursos sejam extraídos por um particular, o que (também em tese) deve gerar outros benefícios em contrapartida (para toda a União e não apenas para um estado).

A questão é que o estado do Rio não aplicou nenhum investimento nessas empresas e nem abriu mão de nada para ficar com os direitos ao royalties só para si. Não concorda?

Pelo contrário, a exploração é de um recurso mineral que pertence a todo o povo brasileiro, e feita com capital federal (ou por empresa particular, com o consentimento da União, devendo haver a contrapartida em prol do interesse público de todo o País). O estado do Rio nem poderia extrair petróleo do subsolo sem o consentimento federal, pois estaria usurpando um patrimônio nacional.

E essa é uma forma de democratizar uma riqueza natural que não foi concebida como fruto de um esforço de algum ente federado, mas pela própria natureza.

Por isso, o petróleo pertence a todos os brasileiros. Isso também ocorre com os potenciais de energia hidráulica do País. Veja: Alguns estados tem enorme potencial energético natural. Seria justo apenas ele usufruir disso, cobrando ICMS de todos os estados para a distribuição de energia pra eles, por exemplo?

Estamos tratando de recursos naturais de enorme de importância
pra todo o País. E é por isso que ele não pode ser monopolizado por um estado apenas.

Se o domínio sobre esses bens fosse passado pra um estado somente, provavelmente ele não teria nem recursos suficientes pra explorá-lo, deixando toda a nação no prejuízo.

Ou pior, poderiam outros estados ficarem submissos à ganância e à voracidade de alguns entes, porque dependeriam infinitamente dos seus recursos minerais. Perceba que estamos falando de petróleo, energia elétrica...

Por tudo isso, esses são bens da União (de todos nós).

A única questão que eu vejo como motivo pra um estado apenas ficar com esse tipo de lucro é como retorno pelos eventuais danos provocados ao seu ecossistema. Mas essa indenização deve ser dada na medida do prejuízo provocado. Pelo menos esse é o critério legal pra se fixar a reparação por um dano ambiental.

E os agricultores e fábricas pegam realmente empréstimos com o BNDES. Não é lícito doar nada à iniciativa privada pra que explorem esses setores. Se eles pagam de volta ou não é outro problema.

Bom ter a oportunidade de discutir isso aqui e dar minha opinião.

mvsmotta postou 18 de março de 2010 às 12:09

"a exploração é de um recurso mineral que pertence a todo o povo brasileiro"

Porque não dividimos então os minérios dos estados produtores? O vento que venta no petróleo tem que soprar para todos os lados.

Entendo em parte o seu ponto de vista, mas royalties não são "lucros" para os estados produtores, são compensações. Logo, quem sofre com os efeitos da exploração, tem sim que receber compensações maiores.

São 7 bilhões que, divididos, não ajudarão e nem farão diferença para ninguém e quebrarão um estado.

O STF inclusive já emitiu todos os sinais de que se acionado derrubará isso na íntegra.

Um abraço!

Gabriela postou 18 de março de 2010 às 12:42

Marcus,

os demais recursos minerais também são bens da União e devem ser explorados por ela ou com seu consentimento, assim como o petróleo, sendo assegurado ao estado de origem uma compensação pela sua exploração.

Com relação ao petróleo a gente sabe como isso é feito. Já com relação à exploração dos demais recursos minerais, eu não sei como se faz a sistemática de distribuição de royalties ou qualquer outra coisa. Talvez a gente nunca tenha ouvido falar disso porque não tem a mesma dimensão do petróleo pro País. Mas tá lá assegurado pela Constituição pelo menos.

E eu entendo que os royalties sejam considerados como uma compensação. Mas na prática, não seria uma compensação exorbitante? Porque se for pelos prejuízos ao ecossistema, a retribuição deve ser dada na proporção do dano e esses danos devem ser provados. Isso, de acordo com a nossa legislação ambiental.

Se for compensação por outra coisa, então, eu quero saber, pelo quê? Por não permitir que o Rio explore o petróleo correspondente ao seu território?

Então a gente volta pra aquela conversa de que ele é da União e se ela explora o próprio bem (ou permite à iniciativa privada que o explore) não precisa haver contrapartida pra qualquer estado, redirecionando um capital significativo, que é obtido através de investimentos federais.

Vale aqui lembrar que mesmo quando é a iniciativa privada que empreende a exploração desses recursos, isso só é válido e legítimo quando autorizado pela União e quando há uma contrapartida pra nação, isto é, quando é em prol do interesse público, tendo em vista os interesses de todo o País (pelo menos em tese, blábláblá...). E eu acho que há uma série de restrições pra essa atividade, que é mesmo monopólio da União.

Não sei se 7 bilhões se tornam uma quantia irrelevante quando se fala na sua distribuição pra todo os estados, mas não acho que isso seja um argumento válido pra essa questão, porque a gente tem que defender o que é justo, não é?
Porque se for somente pra ser realista, esse dinheiro vai ser levado na cueca de muita gente antes de chegar ao seu destino legítimo, seja ele qual for.

Mas vamos ver como o STF vai se posicionar pra decidir isso. Acredito que a emenda não ofenda nenhuma cláusula pétrea, sendo, assim, constitucional, mas devemos recordar que o STF é um tribunal político por definição e pode decidir mesmo em qualquer direção.

Eu vou ter que acompanhar essa questão, querendo ou não. =P

Muito bom seu blog!

Abraço.

Gabriela postou 18 de março de 2010 às 12:53

Esqueci de dizer uma coisa.

Realmente a emenda, se vingar, não deve retirar os recursos do estado do Rio de maneira repentina, sem antes prever uma forma de equilibrar suas contas.

Ela deve trazer um regime de transição, como se fala.

Se não for assim, será muita irresponsabilidade, de fato.

mvsmotta postou 18 de março de 2010 às 13:06

Gabi, (depois de tanta conversa, permita-me chamá-la assim),

Os royalties não são concessão da união aos estados produtores, são direitos garantidos na Constituição.

O Jurista Ives Gandra Martins inclusive declarou que "O artigo 20 da Constituição é mais do que suficiente para decretar a inconstitucionalidade da emenda".

Este artigo garante aos estados e municípios “participação nos resultados da exploração de petróleo no respectivo território, plataforma continental ou mar territorial, ou compensação financeira por essa exploração”.

Inclusive votos dos dois ex-ministros do STF, Sepúlveda Pertence e Nelson Jobim, deram conta de que os "royalties são “uma receita originária dos estados, face à compensação financeira da exploração em seu território de um bem”.

Observa ainda o jurista Luiz Roberto Barroso: "Royalties não têm a ver com a propriedade do óleo, mas com o impacto produzido pela exploração desse recurso natural".

Há mais de 10 anos caiu no STF o conceito de que "o que está no mar não pertence aos estados", porque o próprio tribunal entendeu que as empresas que prestam serviços à Petrobras na plataforma continental são obrigadas a pagar ICMS e ISS aos estados e municípios confrontantes.

Sendo assim, a tal "Emenda Ibsen" é juridicamente natimorta e sua única função (e arrisco dizer, razão principal de sua existência) é forçar os estados produtores a abrir mão de uma fatia maior do que for explorado na camada pré-sal.

Se os demais estados insistirem no linchamento e quiserem forçar a barra, perderão tudo.

Entendo a sanha arrecadatória e politiqueira em ano eleitoral, mas não se pode tungar de um estado seus recursos naturais e isso é ponto comum em todos com quem falo, já que mineiros, paulistas e gaúchos prontificam-se a defender o que é seu quando colocado também "na roda".

A questão é quebrar ou não um estado, privando-o dos seus recursos naturais, em nome de uma visão embaçada de justiça.

Não existe democracia quando qualquer minoria é esmagada por uma maioria e foi isso o que ocorreu no Congresso.

Abraços!

Isabel postou 18 de março de 2010 às 13:27

Talvez a Gabriela não conheça cidades com Macaé e Rio das Ostras, que cresceram muito em função do petróleo. Com uma população maior, é necessário investimento em infraestrutura, como transporte, educação, etc. Não se trata apenas de compensação pelo impacto ambiental. Além disso, querer tomar essa grana do Rio agora que se prepara para as Olimpíadas, onde o Rio está representando o Brasil como um todo, é uma grande putaria.
Beijos! ;)

Gabi postou 18 de março de 2010 às 13:53

Marcus,

eu acho que você está partindo da premissa de que o petróleo é, ou deveria ser, um bem do estado do Rio. E os votos que você citou dos ex-ministros também parecem partir daí.

Tudo bem, o recurso pode ser extraído em parte do território de um estado específico - não vou discutir a questão do mar, porque a Constituição parece ser bem clara quanto a isso -, mas isso não significa que este bem pertença a ele.

Se fosse assim, nenhum bem seria federal, certo?

Acredito que a Constituição, quando estabeleceu que certos bens seriam de domínio da União, primou pela sua importância, que compreende todo o País.

O Brasil não funciona sem petróleo, sem energia elétrica, enfim, sem recursos minerais.

Alguns estados são privilegiados e bastante ricos com relação a esses bens em seus territórios.

Na minha leitura da Constituição, inclusive interpretando o sentido daquela sistemática do ICMS que você comentou, que garantiu que esse imposto não deve ficar retido no estado de origem exclusivamente quando derivado da exploração do petróleo ou outros minérios, ela (a Constituição) quis que os estados dividissem de forma equilibrada essas riquezas.

Isso porque esse é um patrimônio natural, e só está situado no território de um ou outro estado porque a nossa República Federativa foi dividida nestes moldes, mas poderia ter sido diferente. O Brasil poderia ser apenas um estado unitário, por exemplo.

Ou ainda, o RJ poderia não ter uma costa, como alguns estados não tem.

Assim, pra eliminar essas disparidades e somente quanto a recursos que são de enorme importância e garantem a riqueza e o desenvolvimento do País, a nossa Constituição determinou que tais bens sejam de domínio da União.

Isso, para que tanto o investimento pra exploração desses recursos, quanto os lucros correspondentes, sejam, respectivamente, subsidiados e aproveitados por todo o povo brasileiro.

Dessa maneira, eu parto daí: O petróleo não pode ser dividido como de um ou de outro estado. E eu acho que foi assim que quis a CF.

E se eu considero que a União explora um bem que é seu, aliás, é de todos nós, não há necessidade de uma compensação por isso. A emenda viria, portanto, pra corrigir essa distorção.

Nunca estudei a história da nossa tributação, mas tive curiosidade nesse momento e fui conferir a Constituição pra tirar a dúvida e constatei que a cobrança do ICMS através daquela sistemática que comentamos é nova. Ela veio com a EC 33/2001. Posso estar enganada quanto a isso. Mas se foi assim, ela tem o mesmo espírito, de distribuição de riquezas quando derivadas da exploração de recursos naturais relevantes nacionalmente, dessa nova emenda do petróleo (não quero nem ficar divulgando o nome de nenhum político pra não ficar vinculada a ninguém, Deus me livre).

Isso significa que ela está de acordo com o espírito da Constituição. Não acha?

Tá estampado na Constituição como objetivo da República Federativa do Brasil a redução das desigualdades regionais. Ora, esta é uma desigualdade regional, porque um bem federal está situado em território de determinado estado e não em outro, e a solução dada pela emenda reduz os seus efeitos. Não concorda?

Por isso, pra mim ela é constitucional.

Aproveitando Luiz Roberto Barroso, que você mesmo citou: "Royalties não têm a ver com a propriedade do óleo, mas com o impacto produzido pela exploração desse recurso natural".

Então, quando ficar demonstrado um prejuízo ambiental, ele deverá ser ressarcido na medida da sua extensão, mas nunca poderá ser presumido.

Fique à vontade pra me chamar de Gabi. =) Todos que conheço me tratam assim mesmo, de cara. Acho engraçado isso.

mvsmotta postou 18 de março de 2010 às 13:59

Mas o impacto não é só o ambiental presumido, é o social e real.

Macaé, por exemplo, viu sua população triplicar por conta do petróleo, essa gente toda(inclusive vinda de estados que agora querem abocanhar o dinheiro), custa caro.

Abs!

Gabriela (Gabi) postou 18 de março de 2010 às 14:20

Isabel e Marcus.

Bom, a questão agora não é sobre ser a emenda constitucional ou não, e sim, uma questão econômica e social. Ou real, como queira.

E aí, eu acho que seria importante, se essa emenda passasse, que ela trouxesse uma forma de compensar os prejuízos do estado do RJ, ao menos temporariamente, pra não haver nenhuma quebradeira. De outra forma, seria muita irresponsabilidade.

Isso tudo seria necessário apenas até que o estado se tornasse independente desses recursos. Porque afinal, o Rio é um estado riquíssimo e ele sairia dessa bem no final de tudo. Seria questão de tempo e de alguns incentivos federais em contrapartida.

Normalmente, quando se aprova uma emenda dessa relevância, ela traz normas de transição justamente pra impedir que se promovam efeitos indesejados, como seria a falência de um estado ou de alguns municípios.

Afinal, ninguém quer isso pro RJ nem pra estado ou município nenhum.

Beijos.

Isabel postou 19 de março de 2010 às 14:10

Gabriela,
as transformações que essas cidades sofreram necessitam de investimentos constantes, e não temporários, pois foram mudanças definitivas em suas estruturas. Além disso, a tendência é só crescer mais e mais.
O engraçado é que eu escuto muito isso, que o Rio é um estado riquíssimo, e só o que eu vejo são cidades degradadas, favelas pra todos os lados (até a Ilha de Paquetá tem sofrido com favelização). Talvez seja como o Marcus falou: todos os estados querem sua "boquinha", mas não param de mandar gente pra cá, e o que ocorre é o inchaço das cidades.
É claro que se os políticos não fizerem investimentos adequados e não souberem administrar o dinheiro público de forma decente, não há dinheiro que seja suficiente. No entanto, por tudo que o Marcus já falou, esse dinheiro é do Rio, trata-se de uma compensação justa e fará uma falta extrema para esse estado que não é tão rico assim (a propósito, de onde vc é?).
Um abraço.

Gabriela postou 19 de março de 2010 às 14:50

Isabel,

todos os estados e municípios dependem de investimentos constantes.

O Rio é um estado rico se comparado com outros do nosso País porque é bem desenvolvido, deve ter uma arrecadação enorme, enfim, tem uma economia muito melhor e mais sólida do que outros estados brasileiros, como os da região norte, por exemplo.

O problema das favelas é a má distribuição de renda. Acredito que seja um problema de todos os demais estados brasileiros. Falta uma boa gestão para a maioria deles.

Os demais estados não querem uma "boquinha" quando se trata do petróleo. Eles querem apenas que seja repartido um lucro auferido com um patrimônio nacional, ou seja, que pertence a eles também.

Dizer que o petróleo é do Rio, é o mesmo que dizer que a floresta amazônica pertence ao estado do Amazonas e só ele pode usufruir desse patrimônio natural da maneira que bem entender, sem dar satisfação aos demais estados.

O Norte e o Nordeste não "mandam" gente pro Sul ou Sudeste. Você falando parece que se trata de uma estratégia política para driblar a pobreza dessas regiões.

Essas pessoas vão pra o seu e pra outros estados, que fazem parte da sua própria pátria, bem dizer, buscando oportunidades de emprego que não encontram no seu estado de origem (o que é muito triste, e agora eu justifico a necessidade de que essa verba do petróleo seja investida também nessas regiões), assim como muitos cariocas e paulistas vão pro exterior pra alcançar melhores condições de vida e ainda precisam encarar o preconceito.

O inchaço na sua capital é fruto justamente das diferenças sociais entre os estados. E aí é onde você se contradiz em dizer que o Rio não é uma cidade rica. A realidade mostra que há uma desigualdade entre as regiões e se o Rio ou SP atraem tanta gente é porque são estados ricos, certo?

Esse dinheiro é do Rio hoje, porque a Constituição trouxe uma norma que eu acho absurda. Mas essa emenda veio pra modificar isso, por isso tem meu apoio. E deveria ter o seu também, se é que você se importa com o resto do País ou com o que é justo.

O Rio não extrai o petróleo, não refina, não investe. O petróleo não é de vocês. É de todo o País. Isso está na própria Constituição e eu já tentei explicar porque é assim. O petróleo apenas está localizado em um território que lá longe, no mar, num espaço que pertence, inclusive, à União, apenas corresponde ao território do seu estado.

Assim, se os investimentos pra que toda essa riqueza seja gerada são feitos por todos nós, brasileiros, por que então não repartir?

A propósito, sou de Recife. Mas isso não faz diferença. Eu pensaria da mesma forma se fosse carioca.

Beijos.

mvsmotta postou 19 de março de 2010 às 21:54

Como disse, tudo que tinha para falar está dito no texto, chega um ponto em um debate que ninguém mais quer convencer ou ser convencido e sim "ter razão".

O bom e velho Schopenhauer nunca errava.

Beijos!

Hilton Neves postou 23 de março de 2010 às 08:01

Parabéns por ter ido. Tomara que a Emenda não passe ou que o Supremo intervenha, conforme dito mais acima. Vejo como uma covardia(ou na sua cirúrgica definição, uma tunga) o que querem fazer aos cariocas e capixabas.

 
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