A dança do tamanduá brasileiro

Postado em 23 de ago. de 2010 / Por Marcus Vinicius

Não sei se era do seu tempo, mas quem viu o filme "Namorada de Aluguel", clássico dos anos 80, com certeza vai se lembrar da "dança do tamanduá africano", protagonizada pelo personagem de Patrick Dempsey.

Na cena, ele tenta impressionar uma garota com uma dança que aprendeu na TV, pensando que estava assistindo uma aula de dança comum, quando na verdade estava vendo o National Geographic. O mais bizarro é que ao ver aquela estranha dança sendo feita pelo cara que está saindo com a garota mais popular da escola (ninguém sabe até então que ela foi para para isso), todo mundo no baile começa a imitá-lo, fazendo o mesmo papel ridículo sem imaginar que aquela dança era na verdade parte de um ritual da África.

Não são raras as vezes em que estou em alguma festa ou boate e me lembro disso. Mas há uns dois anos a coisa tomou proporções surreais, quando fui convidado para uma festa de "gipsy punk", isso mesmo, "punk cigano". Na época era modinha no Rio de Janeiro e fui lá conferir.

A tal fusão de estilos nem me assustou tanto, visto que depois do "samba reggae" e do "samba rock", qualquer cruzamento de "cruz credo" com "deus me livre" pra mim é normal.

Chegando na festa, o que me impressionou de cara foi a certa quantidade de caras usando bigodes ao estilo Bill Butcher (personagem de Daniel Day Lewis em "Gangues de Nova York), bigodes aliás bem parecidos com o do líder de uma das bandas cultuadas do estilo. Mas a coisa ficou mais interessante ainda.


Em uma das salas do local onde estava rolando a festa, tocava uma espécie de música folcórica do Leste Europeu, uma mistura de forró, polka e quadrilha de festa junina. E, aí sim, a coisa ficou surreal, porque a tal sala estava entupida de gente, formando rodinhas, dançando aquela ciranda da Cortina de Ferro e levantando as perninhas como se simulassem um Cancan dos Balcãs.

Nada contra, afinal, se a pessoa quiser fazer a dança do siri no meio da praça ao meio dia o problema é dela, mas me faz pensar que o brasileiro é um dos maiores "marias vai com as outras" que existem no mundo.

E nem pense em tomar essa crítica como "defesa da cultura nacional", porque não é nada disso. Sou partidário da idéia de que quanto mais batuque existe num país, menos saneamento básico está disponível. O que espanta na verdade é que se aquela dancinha estilo quadrilha de festa junina fosse efetivamente quadrilha de festa junina, pouca gente "descolada" ia achar "descolado" dançar.

Mas como é um lance trazido pela onda "gipsy punk balcânica", vale até dançar cancan-balalaika-carimbó.

Tenho pra mim que alguns gringos tem essas idéias mais ou menos assim "Já sei! Vou pegar uma dança estranha e exótica, misturar com música folclórica da minha terra, inserir umas batidas eletrônicas e uma guitarra distorcida e ir vender lá no Brasil, eles compram qualquer idéia mesmo!".
Sei que outros países também sofrem com esse problema, mas talvez seja em menor escala, e também não é problema meu. Mas o Brasil com certeza está no Top 3 desse mimetismo cultural, certeza.

Não que aqui já não exista um grande estoque de lixos como rebolation, axé e funk, mas não custa nada importar mais alguns, não é mesmo? Por isso qualquer dia não se espante se ver por aí a "dança do tamanduá brasileiro".

E pior, vai arrumar um fã-clube extenso.

3 Comentários:

Vincent postou 23 de agosto de 2010 às 07:37

Também presenceio manifestações corporais um tanto enfadonhas, algumas são ditas expressões artísticas e outras expressões do próprio ridículo que as pessoas se submetem...No Brasil,o surgimento dessas "danças" é frequente, não só pela mistura cultural e étnica,clima tropical, exibicionismo corporal, mimetismo cultural....Tudo isso. impulsiona para um êxtase mental e coletiva,libertinagem, conquista, enfim o ser humano acaba por vezes,mostrando sua face animal e irracional...Tem muita coisa de bom gosto, outras totalmente descartáveis...A criação ou recriação, nem sempre tem um bom resultado...imagine num país subdesenvolvido..
Abrass!

SukaTsu postou 23 de agosto de 2010 às 09:16

Nem dá pra defender o povo brasileiro dessa acusação: infelizmente existe a cultura de que tudo que vem de fora é bom e/ou melhor do que o que criamos por aqui.
Pode ser música, dança, filme, qualquer coisa. O único produto nacional que é defendido como sendo o melhor do mundo são as novelas, especialmente as da vênus platinada.
Como se, com tanto lixo produzido aqui, precisássemos importar lixo cultural...

Tuka Siqueira postou 23 de agosto de 2010 às 11:00

Admiro aquelas pessoas que sabem exatamente que ritmo é uma música só de ouvir os primeiros acordes. Pra mim, a diversidade de ritmos e de rótulos é tanta que preferi classificar de outra maneira: 1- música que eu gosto;2 - música que eu não gosoto e pronto.
As dancinhas é que são um capítulo à parte. De boquinha da garrafa, passando por éguinha pocotó até o rebolation, cada uma mais ridícula do que a outra. Mas tem quem goste e chame isso de "manifestação cultural".

 
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