Eu te amo é bom dia?

Postado em 18 de set. de 2009 / Por Marcus Vinicius

Bom dia, eu te amo!

Muito se fala sobre a superficialidade das relações humanas nesta época das mídias digitais. Hoje em dia, praticamente tudo acontece na velocidade das transmissões de dados e perecem com a mesma velocidade do último reality show.

Basta acesso a internet que tudo está à mão: sexo fácil e sem troca de fluidos, emprego sem sair de casa, amores na prateleira como num supermercado dos relacionamentos. Tão fácil e tão difícil, tão perto e tão longe.

Hoje está tudo tão estranho que, com a internet ficou mais fácil arrumar um (a) namorado (a) em Moscou ou em Tóquio, do que na nossa rua. Enviam-se beijos e carícias por email, suspiros por mensagens instantâneas, discute-se relação pelo Skype e mais cedo mais tarde estaremos baixando nossos filhos por torrent.

Nada contra, não me entenda mal. Eu mesmo adoro twittar coisas do meu cotidiano e possuo vários bons amigos que fiz pela intenet, alguns destes inclusive nunca saíram do âmbito dela. Não sou avesso à modernidade e a rapidez, pelo contrário, mas estranho um pouco os exageros que com certeza acontecem.

Um destes é a crescente falta de necessidade de contato. Por exemplo, outro dia pelo Twitter me convidaram para uma "festa". Cliquei no link imaginando chegar a um convite com instruções de como chegar ao local ou ao flyer de alguma boate, mas não. Eu cheguei foi numa espécie de sala de chat, onde as pessoas apareciam em pequenas janelinhas e suas casas, dançando ao som da música que alguém estava transmitindo também de sua casa e interagindo pelas webcams.

Era meio curioso, meio bizarro ver gente fantasiada, outros arrumados, dançando sozinhos na frente de uma câmera e vendo uns aos outros através do monitor. Com certeza é um bom método contraceptivo, mas tirando dizimar a população mundial e evitar a "Operação Lei Seca", não consigo encontrar outros atrativos nisso.

Relação virtual tem limite e isso chegou a ser mais estranho pra mim do que sexo por msn. Outra vez, nada contra, mas pelo menos pra mim, ainda faz muita falta conhecer pessoalmente amigos, beijar na boca e trocar saliva, sentir o cheiro. Não tenho a menor paciência para relacionamentos que permanecem "virtuais" por opção.

Mas seria bom se ficasse só nisso.

A presença da internet e desse universo internético em nossas vidas também contribui para o assassínio da língua escrita. E não falo só do filho débil mental do português, o miguxês, os falantes do idioma de Shakespeare também padecem com seus "LOL"(lots of laughs), "LMAO"(laughing my ass out), "BRB"(be right back).

Mais um pouco e somente um transplante de cérebro poderá ajudar os muito jovens a não soarem como silvícolas que só conhecem vogais.

Fico aqui tentando imaginar como seria o miguxês do Japão...

Talvez essa infantilização lingüística seja também a causa da infantilização emocional a que assistimos. Cadê a cerimônia pra lidar com "aquela coisinha louca chamada amor", como bem dizia a letra do Queen?

A rasteirice intelectual, a facilidade da comunicação e a crescente falta de interesse no contato criam essa banalização do termo "eu te amo" e até mesmo do "eu odeio". Basta ver a quantidade de comunidades no Orkut dedicadas ao tema "Eu amo" ou "Eu odeio" qualquer coisa.

Considero impossível ter pela mulher amada o mesmo sentimendo que temos por sucrilhos Kelloggs e muito menos odiar coxinhas de galinha com a mesma intensidade com que odiamos um político corrupto.

Vamos respeitar estes sentimentos maiores, tenhamos com eles a mesma cerimônia que teríamos ao chegar ao Olimpo e nos depararmos com Eros, Jupiter, Diana, Apolo, Afrodite ou Vênus.

Prefiro acreditar que nenhuma pessoa, por mais estúpida e rasa que seja, chegaria na frente de Afrodite e diria "oix, amu muitxu voxê!".

Pode ser muita inocência minha, mas prefiro acreditar que sob esse monte de tráfego na rede, esse monte de bites e bytes, ainda existam pessoas de carne e osso, que sentem de verdade, que conseguem viver acima de toda essa profunda superficialidade (uso o profunda aqui de propósito) de relações, que nos transforma em um contingente de solitários, cercados de gente por todos os lados.

Torço para não estar errado.

13 Comentários:

Unknown postou 18 de setembro de 2009 às 06:55

A concepção de valores criada pela era digital colabora para essa descaracterização do sentimento. Excelente text e parabéns pelo ponto de vista.

Unknown postou 18 de setembro de 2009 às 06:57

"Amei" seu posto...
O mundo virtual é louco, efêmero....bom ver um blog lúcido.

Unknown postou 18 de setembro de 2009 às 06:58

"Amei" seu posto...
O mundo virtual é louco, efêmero....bom ver um blog lúcido.

um blog de links postou 18 de setembro de 2009 às 07:12

Engraçado,
adoro relacionamentos virtuais!
Ultimamente tenho conhecido muita gente legal.
Inclusive tem horas que eu acho o virtual melhor do que real,mas com certeza nada melhor do que passar do virtual pro real.
E concordo com vc, nada supera um beijo na boca, sentir o cheiro, dançar com amigos!
e por falar nisso, tem I LOVE POP no sabado no Circo Voador.heheh
chama a sua namorada e vamos dançar! ahahah

bjs

Cynthia

(http://linked-o-rama.blogspot.com

7ropz postou 18 de setembro de 2009 às 07:20

Dentre os assuntos que voce abordou, é interessante e considerável pensar no distanciamento da sociedade. É uma certa pós-modernidade aguda. Quanto aos extremismos de expressão de sentimento é de praxe a assim criada adolescencia se expressar.

Anônimo postou 18 de setembro de 2009 às 07:22

Seu artigo me lembrou os livros "Modernidade Líquida" e "Amor Líquido", de Zygmunt Bauman. Parabéns, adorei!

Dani Rodrigues postou 18 de setembro de 2009 às 07:32

Texto brilhante como sempre!!! Muitas pessoas adotam essa postura por modismo, é fato. Contudo, parcela expressiva tem medo da vida real (bem diferente das novelas de Manoel Carlos), que não pode ser formatada com alguns comandos, que não tem tecla “DEL” ou “desfazer”, que não pode ser excluída com um clique. O roteiro não é previsível, mas o enredo, sem dúvida, é muito mais prazeroso. Motta, acredito que na rede coexistem os dois perfis - “solitários na multidão” e os que seguem com pés firmes no terreno real e se permitindo VIVER (com todos os dissabores e alegrias que perpassam nosso caminho, rs), mas sem fechar os olhos para as oportunidades das redes sociais e afins. Parabéns! Assunto pertinente e texto delicioso de ler como sempre!

Al Machado postou 18 de setembro de 2009 às 10:38

Texto de uma sensibilidade ímpar. Volta e meia quando sobra um tempo passo por aqui para partilhar de seus escritos. Aceito a praticidade dos relacionamentos virtuais, mas acho inaceitável mantê-los virtuais por opção. Se posso conhecer a pessoa porque não fazê-lo? A cada vez mais pessoas que não pensam assim. Infelizmente... bom... Parabéns pelo blog!

isah postou 18 de setembro de 2009 às 19:23

Muito bom esse seu post..adorei sua comparação"Considero impossível ter pela mulher amada o mesmo sentimendo que temos por sucrilhos Kelloggs e muito menos odiar coxinhas de galinha com a mesma intensidade com que odiamos um político corrupto" hahaha.E lhe digo mais por mais que estejamos cercardos por pessoas "virtualmente" há muitas pessoas carentes no mundo.Somos muito vulneráveis com nossos sentimentos que podemos chegar ao ponto de banaliza-los por meio da internet.Pq usar esse artificio quando é mais gostoso desfrutá=lo pessoalmente,não é mesmo?!
Parabéns pelo blog.

Vi Marassi postou 18 de setembro de 2009 às 20:01

Adorei o texto, muito bom! E estou passada com a tal festa pela web, nunca tinha ouvido falar!

Unknown postou 18 de setembro de 2009 às 20:13

Qndo um texto é bom, a gente o devora e o consome sem se dar conta. A leitura flue. É o caso deste texto. Adorei! Concordo - nada melhor e mais gostoso do que os olhos nos olhos, do que o calor humano...As pessoas devem deixar a internet acrescentar, nunca substituir.

Soraya G.L.Bassicheto

Maria Beatrix postou 19 de setembro de 2009 às 07:24

O que aconteceu com o seu twitter? Vc sumiu da minha lista.Tentei te acessar e deu "conta suspensa". Obra de algum petralha? Volta! Some, não!

Babi e Leo postou 28 de setembro de 2009 às 16:53

"mais cedo mais tarde estaremos baixando nossos filhos por torrent."
Adorei esta parte! Talvez assim eu me anime de virar mãe.Ou não.rs.

 
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