Porque estamos virando turistas japoneses

Postado em 14 de set. de 2011 / Por Marcus Vinicius

De repente todo mundo parece um turista japonês.

Sei que até eu tenho culpa no cartório nessa, já que faço igual muitas vezes, mas a grande responsável mesmo é a indústria fotográfica e suas câmeras digitais.

Se antes nós precisávamos espremer nossas fotos em, no máximo, 36 poses dos filmes, agora contamos com vários gigabiytes para usar e desperdiçar eternizando abraços, viagens, a namorada pelada, filhotes de cachorro, pudins, cheeseburgers, insetos na parede, o vizinho barrigudo saindo do banho, etc.

Nossa sociedade sofre de obsessão pelo registro (ou "Síndrome do Turista Japonês"). Eu sofro de obsessão pelo registro. Sentamos num restaurante e quando chega aquele brownie delicioso de sobremesa, comemos vorazmente, certo?

Mais ou menos. Primeiro sacamos o celular e tiramos uma foto, depois, aí sim, é que fazemos o remake de "Shark Attack".

Se estamos diante de um monumento qualquer, seja em Paris ou em Duque de Caxias (deve ter algum por lá), primeiro tiramos uma foto na frente do monumento, depois ao lado do munumento e terminamos correndo dos guardas quando tentávemos tirar uma foto na garupa da estátua eqüestre do monumento.

Sem contar os duzentos e setenta e nove closes e tomadas diferentes. Viramos aquele anão da Amélie Poulain.


Acho que isso é fruto da efemeridade dos nossos tempos. Se antes aquela estátua do General Brancaleone era colocada no centro de uma praça e permanecia ali por séculos, hoje algum prefeito pode criar alguma comissão de artistas que após uma dezena de reuniões vão concluir que a estátua é "esteticamente feia" e precisa ser retirada.

E assim como a paisagem urbana, tudo que nos cerca é efêmero. Você tira foto de um BIS sabor limão porque não sabe até quando a Lacta vai continuar produzindo-o. Tira foto junto com seus amigos no churrasco, na praia, no rodízio de pizza, na delegacia registrando ocorrência, vomitando na micareta, porque sabe-se lá quanto tempo aquela amizade vai durar.

Antes nossa infância era toda coberta com 100, 200 fotos. Hoje quem quiser relembrar os tempos de criança achará um acervo com algo em torno de 500 gigabytes e 100 mil fotos. Vai precisar contratar um CSI pra fazer o trabalho.

Não basta mais "estar ali", é preciso registrar cada pequeno detalhe para mostrar depois.

Aí, vendo esses álbuns que as pessoas colocam na internet, concluo que muitas delas só conheceram realmente a Torre Eiffel ou o Empire State Building semanas depois, quando chegaram em casa e foram revirar as fotos que tiraram no local.

É mais ou menos como conhecer os lugares através de cartões postais, só que pagando um pouco mais caro por isso.

11 Comentários:

۞ Potira ۞ postou 14 de setembro de 2011 às 08:28

Estamos mesmo virando aquele anão da Amélie Poulain...

=/

Anônimo postou 14 de setembro de 2011 às 08:58

é verdade!

Liv postou 14 de setembro de 2011 às 09:03

Tirei poucas fotos na última viagem. As lembranças que não ficam nas fotos são as melhores :)

Carla Lima postou 14 de setembro de 2011 às 09:34

Adquirimos um medo absurdo de nos desfazer de coisas sem importância e isso implicou em trazer mais coisas sem importância pra perto de nós.
Hoje, não basta lembrar, temos que provar que nunca esqueceremos.

Rafa Osti postou 14 de setembro de 2011 às 11:46

Por mais que a síndrome do turista japonês, rs, está cada vez mais frequente.... não tem como não guardar nossas mais belas lembranças em registros fotgráficos. Pois eles ficam e fazem os momentos durarem um pouco mais.....

Anônimo postou 14 de setembro de 2011 às 13:15

concordo com a sua caracterização dos fatos, mas tenho que discordar do motivo.. não acredito que seja a efemeridade que cause isso. É o medo de esquecer, porque o que se esquece nunca existiu.

Gustavo Ca postou 14 de setembro de 2011 às 19:10

Bastou uma vez, um show, em que passei grande parte do tempo preocupado em tirar boas fotos, pra depois perceber o quanto perdi em realmente VER o show, ficar revoltado comigo mesmo e nunca mais cair nessa. Hoje em dia, acredite se quiser, não tiro mais fotos e me desfiz de todas que tinha. Não gosto mais de guardar coisas cuja principal função é ficar guardada. Ainda tenho uma vaidade de gostar de sair em fotos, desde que as fotos fiquem todas a cargo de quem tá comigo, pq eu tenho preguiça de cuidar de câmera e tudo mais.

mvsmotta postou 14 de setembro de 2011 às 19:14

Eu tento lutar contra o japonês que tem em mim, mas confesso que ele ganha várias vezes. Rs

Abraços!

ESCORPIÃO PRATA postou 15 de setembro de 2011 às 08:36

Em minha última viagem, João Pessoa-PB, banquei mesmo o turista japonês. E máquinas digitais tem nos tornado "monstros da incoveniência" ás vezes. Fotografei muito, mas passei quase tudo pro papel. Pior são os que descarregam tudo no pc e nada vira fotografia! Não há memória de pc que aguente! rsrs

Isabel postou 15 de setembro de 2011 às 11:32

Desse mal eu não sofro, e até fico irritada quando viajo com alguém que não para de fotografar tudo que vê ou come (essa foi pra vc!). rss. Acho legal registrar o momento, principlamente um lugar onde vc provavelmente não voltará, mas sabendo escolher bem as cenas, bastam 10 fotos, ao invés das 500 que muitas pessoas tiram. No final, ninguém tem saco de rever as milhares de fotos armazenadas.

Mariana Terra postou 21 de setembro de 2011 às 17:17

este drama nos acompanha aonde quer que vamos! eu já havia escrito sobre este tema tão habitual nos dias de hoje. (pra quem quiser conferir http://entre-esquinas.blogspot.com/2011/05/sociedade-do-registro.html)

a regra é clara: sua felicidade/satisfação/contemplação com um evento/viagem/situação é indiretamente proporcional à quantidade de fotos que vc dispara! (e depois dispara no FB.. argh!)

 
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