Requentado, reciclado, repetido

Postado em 31 de mai. de 2010 / Por Marcus Vinicius

"Nada se cria, tudo se copia". Podemos colocar à frente desta frase qualquer coisa: "em televisão", "na literatura", "na indústria automobilística", "no teatro", "na música", pense uma área de atuação que vá desde óperas até a venda de sacolés e sempre haverá alguém copiando, aperfeiçoando, mimetizando o outro.

Em recente entrevista a atriz e diretora francesa Fanny Ardant disse que "Todas as histórias já foram contadas. É o detalhe que faz a diferença. Há milhares de anos se contam histórias de amor. Mas, a cada vez, nos apaixonamos.". Não podia estar mais correta.

Quantas vezes já identificamos Romeu e Julieta até numa esquina de subúrbio? Uma breve pesquisa apontará que "Lucíola" de José de Alecar foi, para ser educado, "inspirado" na "Dama das Camélias" de Dumas Filho que por sua vez teve, aí sim verdadeiramente, inspiração no conflito moral de "Manon Lescaut", famosa ópera da Giacomo Puccini. Todas as 3 obras contando a luta entre o moral e o material, entre o amor verdadeiro e o bem estar financeiro, entre a inadequação e o desejo de ser aceito pela sociedade.

Todos estes valores e conflitos que há mais de três décadas são retratados diariamente nas intermináveis novelas de televisão. Acho até que se algum dia houver mesmo uma guerra nuclear e o mundo for destruído, sobrarão as baratas e as telenovelas na face da terra. Azar das baratas.

O amor, o ciúme, o dinheiro, a dor de corno, a inveja, as intrigas, tudo isso existe desde que lá no período quaternário alguns seres resolveram evoluir e se transformar no animal humano. E só o que impede que os seres humanos andem por aí matando uns aos outros como insetos são os códigos morais, a culpa e algo mais forte ainda: leis e punições. Não acreditem que é algo muito além disso.

Queremos o que é do outro, desejamos o que não podemos, sofremos por amor e fazemos os outros sofrerem.

E tudo isso precisa ser contado, cantado, rimado, retratado. Não tem como ser 100% original o tempo todo, e quem busca isso geralmente produz lixo. Basta ver esses artistas que batem em lata e sopram chaleiras. São originais, mas e daí?

A maestria de quem alcança o sublime está justamente em saber remontar o que já existe de uma forma pessoal, que se diferencie nas nuances, matizes, timbres. É aí que uma Anne Rice consegue falar sobre vampiros com a mesma sensualidade e sex appeal que faltam naqueles monumentos ao ridículo que são os livros da série "Crepúsculo". Ambos bebem na fonte das velhas histórias de vampiros, só que apenas um deles se afoga nessa fonte.

O problema é que a inspiração, a idéia, a referência são facilmente confundidas com a cópia grosseira. Uma coisa é um perfume criado a partir de notas de um outro famoso e consagrado, outra coisa bem diferente é uma falsificação de camelô com o mesmo nome, o mesmo rótulo e uma tonelada de álcool no lugar do fixador.

Durante muito tempo os japoneses foram conhecidos como exímios aperfeiçoadores de idéias. Seja o walkman, o vídeo cassete, os aparelhos de som ou até o limpador de pára-brisas (que segundo a piada foi inventado pelos portugueses e colocado do lado de fora do vidro pelos japas), eles emprestaram seu esmero, sua paciência, seu minimalismo a um sem número de invenções, tornando-as melhores. A maior prova disso são os automóveis japoneses, que até hoje são referência de estilo, conforto e confiabilidade.

Já a China, gigante econômico, é conhecida pela cultura milenar, pelas paisagens exuberantes, pela imensa população e por um governo autoritário. Mas também é conhecida por copiar tudo que existe pelo mundo afora. Tênis, roupas, eletro-eletrônicos, produtos de informática, basta que algo seja lançado que algum tempo depois já existirá no mercado o similar chinês: igual na aparência, mais barata e de qualidade infinitamente pior do que o original. É cópia pura e simples, pirataria.

Está aí uma boa forma de diferenciar artistas que tomam referências de simples copistas, plagiadores. Aqueles que se inspiram geralmente vão adiante, aperfeiçoam, dão um toque pessoal que acaba por conferir originalidade à sua obra.

O plagiador não, o plagiador é apenas um produto pirata chinês, desses que se custar um centavo de real ainda estará bem acima do preço que vale.

4 Comentários:

Unknown postou 31 de maio de 2010 às 12:43

Tim Burton já ns mostra isso, né? Rsrrsrs A maneira com que ele torna alguns detalhes grandiosos mudam a história contada, vide Alice.

Adao Braga postou 31 de maio de 2010 às 12:57

Aplicando o seu texto a seu texto, eu pergunto:

- Se inspirou em quem?

Neste caso, como seu texto é uma abordagem sobre as histórias, penso que, ainda que outro tenha pensado e escrito algo parecido, eu creio mais, na teoria dos campos mórficos, esta teoria, apenas diz que o mundo das idéias é um campo único em que todos estamos envolvidos. As vezes um recebe a inspiração, outros, captam a indicação, outros desenvolvem a mesma tese, outros inventam o mesmo aparelho, ganha quem patenteou primeiro... mas, quanto a economia da China, a atitude japonesa... é isto que está no texto.

Vim pelo seu chamado no twitter!

Pequena postou 31 de maio de 2010 às 13:19

Tbém vim pelo seu chamado no twitter!
Gostei do texto, gostei do blog, gostei da inspiração!

Bjs
@keliopatra

Jeferson Cardoso postou 1 de junho de 2010 às 06:24

Realmente é o detalhe que faz toda a diferença.
Jefhcardoso do http://jefhcardoso.blogspot.com

 
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