Todo mundo tem sua cara metade, nem que seja a outra metade da máscara de zumbi.
No final das contas, todos nós somos produtos numa prateleira. Nossa vida social é um Wal Mart de pessoas, promoções, objetos do desejo e até aquelas cestas com saldão de estoque.
Usando nosso instinto mais básico, a primeira coisa que pensamos é em rostos, cabelos, pernas, braços, peitos, bundas, olhos, enfim, a beleza física que é tão particular quanto qualquer outro conceito. Mas esse tipo de interesse é mais democrático, já que se você acha alguém bonito, não interessa se ele esteja vestido de Chapolin distribuindo santinhos de algum candidato a vereador.
E aí é que eu chego no meu ponto: o estilo.
Sabe aquela mulher linda, com um sorriso sensacional, pernas torneadas, etc, mas que está usando um abadá de micareta? Nada mal, tirando pelo fato de que você considera um trio elétrico a 11ª praga do Egito que os correios erraram o endereço e entregaram na Bahia.
Aí, apesar de bonita, gostosa, blá, blá, blá, você se depara com um grande limitador: como pensar em começar algo com alguém que adora algo que você detesta? Não dá. Não vou me alongar muito aqui, mas o fato é que complica.
Uma vez conheci um cara que usava uma barba que batia no peito. Dessas barbas gigantes que você só vê em filmes de náufragos ou da Guerra Civil Americana. No meio de uma conversa sobre os cuidados que ele tinha que ter com uma barba daquele tamanho (sempre passar creme rinse, não deixar a pelaria cair no prato de sopa, etc), ele me disse uma coisa curiosa:
- O bom também é que uma barba desse tamanho foca bem o meu target.
E eu:
- Como assim?
- Ah, cara, você acha que uma patricinha com bolsa da Louis Vuitton, puxando um poodle rosa pela coleira vai querer alguma coisa com um sujeito com essa barba de ZZ Top?
- Não, claro que não.
- Pois é, e eu acho ótimo, porque detesto mulher assim.
Foi aí que percebi que muitas das coisas que somos, fazemos ou viramos, têm exatamente esse objetivo: afastar e aproximar nossos alvos, os consumidores.
Porque se estamos sempre querendo consumir alguém (nem que seja uma consumação mínima), com sorte alguém também quer nos consumir. E para isso geralmente buscamos iguais.
De vez em quando falha, é claro, e você se depara com aquele casal formado por um metaleiro tatuado e cabeludo com uma loira patricinha de academia, mas se exceções fossem a regra seriam chamadas de regra e não de exceções.
E normalmente com o tempo um dos dois vai dando aquela corrigida na rota de navegação: o metaleiro começa a usar camisas polo e a loira faz uma tatuagem de caveira (com lacinho rosa, é claro, porque tudo tem limite).
Agora, se você curte andar de skate e usa aquelas bermudas caídas que deixam o cofre aparecendo, provavelmente vai curtir alguma garota que siga essa moda e, sei lá, use bermudas caídas com o cofre aparecendo. Se anda de coturno e todo vestido de preto com aquela maquiagem de filme de zumbi, certamente quer companhia para beber vinho no cemitério e não alguém que te chame para pegar onda.
Quem já viu um casal de bombados - ele parecendo um remador de porta-aviões, ela parecendo o Schwarzenegger de peruca - ou então aqueles casais que torcem para o mesmo time e tem um escudo do Fluminense pintado até no teto do quarto sabe do que eu estou falando: todo mundo procura seu target.
Como aquele casal nerd que senta na mesa do restaurante e conversa pelo chat do iPhone. Até o cretino que faz piada do "pavê ou pacomê" encontra uma cretina-metade que vire pra ele no primeiro encontro e diga "puxa o meu dedo".
Claro que muita gente não tem alvo algum, se veste de gótico na sexta, de surfista no sábado e vai de abadá pra micareta no domingo, esses curtem loiras, morenas, gordas, magras, altas, baixas, negras, japonesas e demais seres bípedes que não tenham asas (penas pode), ou seja, o que vier está bem vindo.
O problema é que gente assim termina muito parecendo com aquele sujeito que passa o sábado em casa comendo Cheetos e assistindo vídeo no RedTube: todo mundo é target, mas eles não são target de ninguém.
Esses geralmente encalham na prateleira.
3 Comentários:
Primeiro, vou elogiar a riqueza de comentários e metáforas do teu texto! É sempre muito debochado e dá pra garantir umas risadas: "... você considera um trio elétrico a 11ª praga do Egito que os correios erraram o endereço e entregaram na Bahia." Muito bom, cara!
E sobre o target, vou agradecer profundamente o seu esclarecimento com o exemplo do teu amigo barbudo! Há alguns meses, eu venho tentando achar uma tese que me esclareça o porquê de eu ter cortado meu lindo cabelón comprido e selvagem (é um adjetivo usado pelos cabelereiros!) por um cabelinho joãozinho, discreto e modernoso... Eis aqui a explicação: foi um artifício, ainda que subconsciente, de tirar de mim este target que eu carregava! Sim, porque cabelón selvagem é super bacana no Rio, mas em São Paulo... Por aqui nem Gal Costa versão anos 70 faria sucesso! Sim, porque no Rio é normal a mocinha ser gata, arrumadinha, sorridente e tudo mais que você citou, sem necessariamente gostar de micareta! Mas aqui em São Paulo, meu caro, as mocinhas são expressamente reconhecidas, na prateleira das ruas paulistanas, pelo seu "jeitão". E se a mocinha em questão é, além de carioca faladeira, usuária de cabelón... Vixe, vira target fácil de cada figura... Nem te conto! Rs.
Mas mulher bonita fica linda até de joãozinho!
Beijos!
Ah, paulista micareteiro ou funkeiro? Afasta de mim esse cálice!
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