Um bife vale tudo isso?

Postado em 3 de mai. de 2012 / Por Marcus Vinicius

Caro Vegan,

Você sabe que todo dia sou acordado por um barulho estridente que me faz levantar da cama pelo menos umas 4 horas antes do que eu realmente gostaria, que logo em seguida descubro que não estava em Paris, mas na minha casa mesmo e tudo não passou de um sonho e que depois disso ainda sou obrigado a lavar o rosto com água fria, tomar um café morno e comer pão duro porque a preguiça de ir na padaria só não é maior do que a de ir para o trabalho?

Depois disso ainda coloco uma roupa que não é um calção de banho com chinelos, mas algo que certamente me fará passar calor durante o dia e saio de casa rumo a um transporte coletivo onde sou tratado pior do que uma daquelas galinhas que andam em caixotes de aviário (o cheiro de um vagão de metrô se o ar-condicionado estiver no seu estado normal - quebrado - principalmente, é quase igual).

Para seu conhecimento, chegando no escritório dou bom dia para um monte de gente que preferiria nem ter que ver, sento na minha mesa num cubículo de fazer inveja àqueles currais de matadouro, coloco fones de ouvido para fingir que estou escutando música e assim ser incomodado o menos possível, ligo o computador e o pior é que depois de fazer tudo isso ainda esperam que eu trabalhe.

Respondo emails com cobranças que geralmente não se relacionam a nada que esteja ao meu alcance, já que não posso vender, entregar, cobrar e ainda fazer trocas ao mesmo tempo, mas ninguém está interessado nisso, afinal, é mais fácil darem esporros em mim do que na Renatinha, aquela loira gostosa do faturamento que está de caso com o chefe.

No auge do meu desespero rotineiro, recebo alguns Power Points de amigos que provavelmente foram expostos à algum tipo radiação que ativa a demência e estão tão sem o que fazer que pensam que ainda vou rir de montagens com o Seu Madruga e me emocionar com textos que o Jabor nunca escreveu, ainda que sejam creditados a ele.


Nesse meio tempo ouço bate-bocas sobre futebol, mulheres reclamando que Sonho de Valsa não emagrece e, claro, mais esporros por conta dos erros da Renatinha, aquela gostosa, que ainda por cima não aceitou meus fones de ouvido emprestados e por isso obriga todo mundo a ouvir Banda Calypso e Luan Santana o dia inteiro, já que ela adora porcarias e ninguém pode reclamar, afinal, ela e o chefe, você sabe...

Quando o relógio parece estar parado há mais ou menos 90 minutos em 11:30, começo a me preparar para enfrentar uma fila de banco, já que a conta de luz está vencida, o cartão de crédito precisa ser pago urgentemente e ainda tem o carnê do IPTU.

Sei que vou passar mais ou menos meia hora esperando e quando chegar a minha vez um dos caixas vai sair para o almoço e uma velhinha fará uso da sua preferência para pular na minha frente e pagar seu carnê do Baú com moedas de 5 centavos.

No fim terei que sair correndo pelo meio da rua, pedindo licença para camelôs e entregadores de papel de lugares que compram ouro ou alugam putas, para chegar nessa que é a meca da hora do almoço: um restaurante a quilo.

Leitões a pururuca, sushis e queijos suiços estarão enfileirados lado a lado com ovos de codorna, rabanetes e acarajés. Uma senhora de meia idade vai passar um bom tempo recolhendo, um a um, os camarões do bobó, enquanto aquele grupo animado que resolveu almoçar junto faz uma algazarra insuportável em alguma mesa, gritando coisas como "o Vasco é vice!" e "Iça!".


E enquanto admiro tão relaxante cenário, lembro que tenho apenas 15 minutos para comer, pagar e voltar ao trabalho, de onde só sairei às 17:00, o que vai demorar mais ou menos umas 700 horas para chegar. Tudo isso só para voltar para casa no final do dia, naquele mesmo metrô lotado que de manhã já cheirava a jaula.

Por isso não venha me falar de vaquinhas, de matadouros que tratam porcos pior do que pacientes do SUS e nem que animais são amigos e não comida, porque sim, eu acho que esse bife que eu vou pedir pro cara da grelha fazer ao ponto vale tudo isso.

E pra seu governo, o boi provavelmente também acharia se tivesse que passar por um dia assim.

2 Comentários:

Roberta Ricchezza postou 3 de maio de 2012 às 17:32

Deve haver alguma finalidade para que nossa espécie possua caninos, ou não? rsrsrs...

Ju postou 3 de maio de 2012 às 17:45

Muito bom! Concordo plenamente.

 
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